A sucessão de más notícias do baixo desempenho econômico da China em 2023 está sendo acompanhada com atenção - e um certo grau de apreensão - no resto do mundo. O crescimento do PIB, estimado para “cerca de 5%” pelo governo chinês, corre o risco de não ser atendido, de acordo com previsões de analistas dentro e fora do país.

Vários indicadores vêm reforçando a desaceleração da economia do país asiático. As exportações em agosto caíram 8,8% na base anual, registrando o quarto mês consecutivo de declínio. As importações também caíram em agosto, em 7,3%.

Analistas financeiros e gestores ouvidos pelo NeoFeed, no entanto, acreditam que a maré de pessimismo em relação à China deve ser vista com cautela, em especial diante do desempenho do agronegócio e de outros setores que exportam commodities para o país asiático – que não sentem um impacto grande, pelo menos no curto prazo.

A grande dúvida é quando e como o país asiático vai conseguir reverter os números tímidos de 2023, que refletem a queda da procura de exportações e a uma persistente crise imobiliária, responsável por um quarto do PIB chinês.

O fato é que, apesar de um ano ruim, a China continua dominando com folga o comércio global, com uma participação de 14,4%, bem acima dos 8,3% dos Estados Unidos e 6,6% da Alemanha, de acordo com dados da Organização Mundial do Comércio.

“Embora os indicadores da atividade econômica da China sejam decepcionantes, o mercado não reflete esse pessimismo, talvez pelo fato de o governo chinês ter tomado medidas para estimular a recuperação”, diz Nicolas Borsoi, economista-chefe da Nova Futura Investimentos, citando corte de juros e a promessa de novas ações para reverter a crise.

Borsoi cita como exemplo a cotação do minério de ferro, commodity-símbolo das importações chinesas, que apesar da redução da atividade produtiva na China, viu o preço da tonelada sair de US$ 113 para US$ 121. Segundo ele, esse é um sinal de que o mercado prevê uma melhora no país asiático.

Para o economista, a preocupação com a economia chinesa depende do horizonte de análise. “No curto prazo, pensando até o final do ano, o mercado acredita que dá para dar uma respirada, justamente por causa dessas medidas que o governo está tomando”, diz ele. “O longo prazo, porém, segue sendo um ponto de interrogação.”

Agro em alta

A visão do copo meio cheio é compartilhada pelo economista Fernando Ferrer, analista da Empiricus Research. Ele cita, além da elevada cotação do minério de ferro, a subida do preço do barril do petróleo, que chegou a US$ 90, e também o excelente desempenho do agro brasileiro, cujas exportações seguem em alta.

“Se os problemas econômicos da China fossem tão graves, as commodities não estariam performando tão bem”, diz Ferrer, citando as cerca de 40 medidas adotadas pelo governo nos últimos meses para estimular a economia.

Ele atribui grande parte do pessimismo com a China com a frustração da expectativa de crescimento da economia em 2023, no começo do ano, que não se concretizou.

Apesar de problemas graves, como o possível default da Country Garden – importante empresa do setor imobiliário – e o elevado índice de desemprego entre os jovens, Ferrer também acha que os estímulos do governo estão ao menos postergando um agravamento da crise.

“Mas se a população chinesa perder poder de renda, a médio prazo pode afetar nossa balança comercial com o país asiático, com impacto no câmbio e no desempenho das empresas de agronegócio”, adverte Ferrer.

Para Ruy Alves, gestor macro global da Kinea Investimentos, a China está passando gradualmente por uma migração intensiva em commodities para uma economia de consumo e com valores maiores da cadeia de produção.

“A China não vai quebrar, a tendência é de vermos uma economia menos intensiva, com desvalorização da moeda e estímulo ao consumo”, diz Alves.