(PARIS) - Após milhares de franceses saírem às ruas na segunda-feira, 9 de outubro, em todo o país em solidariedade a Israel, uma manifestação pró-palestina prevista em Marselha na terça, 10, foi proibida pelas autoridades em razão dos riscos de “distúrbios contra a ordem pública”.
A vigilância na França é máxima e inclui policiais militares da operação Sentinelle, criada após o atentado de 2015 em Paris contra o jornal satírico Charlie Hebdo. A segurança de locais judaicos, como sinagogas e escolas, foi reforçada no país após o ataque no sábado, 7 de outubro, do grupo extremista palestino Hamas contra Israel.
Os riscos em relação à segurança não são os únicos que pairam sobre a França e a União Europeia, que já vive com uma guerra às suas portas desde que a Rússia invadiu a Ucrânia, em fevereiro do ano passado.
“No momento é um conflito local, mas ele pode eventualmente se estender pela região. Para a Europa, o impacto seria em relação aos preços do petróleo e do gás”, afirma ao NeoFeed o economista Pierre Jaillet, ex-diretor-geral de assuntos internacionais do Banco Central francês e pesquisador do Instituto de Relações Internacionais e Estratégicas (Iris, na sigla em francês).
Ele complementa: “O ataque tem um efeito de amplificação sobre os mercados, ligado ao fato que é uma tensão suplementar que se acrescenta a um contexto já difícil desde a guerra na Ucrânia”.
Às vésperas do inverno no Hemisfério Norte, um possível aumento nos preços do petróleo e do gás pode trazer consequências para a inflação. Neste caso, a política monetária voltará a ficar mais restritiva, avalia o economista.
A alta dos preços da energia repercute nos custos de produção e nos preços ao consumidor. Isso, evidentemente, pode diferir o fenômeno de desinflação que ocorre nas principais economias, como nos Estados Unidos e na zona do euro, onde vem ocorrendo de forma um pouco mais rápida.
“Mas estamos bem longe dos níveis atingidos no início da guerra da Ucrânia”, quando o preço do barril ultrapassou US$ 120, ressalta Jaillet, acrescentando que há uma retomada dos preços da energia desde julho ligada a uma estratégia dos membros da Opep (Organização dos Países Exportadores de Petróleo) de reduzir a produção para aumentar os preços.
Na terça, o Fundo Monetário Internacional (FMI) reduziu suas previsões de crescimento da zona do euro para 0,7% em 2023 e 1,2% em 2024. No relatório anterior, de julho, as estimativas eram de 0,9% e 1,5%, respectivamente.
“O FMI prevê um crescimento baixo nos Estados Unidos, de 1,5%, e na zona do euro no próximo ano. Evidentemente, a alta dos preços da energia e, ao mesmo tempo, a queda dos indicadores de confiança que podem impactar tanto os investimentos quanto a criação de empregos configuram incertezas que deterioram as perspectivas”, afirma o ex-diretor-geral de assuntos internacionais do Banco Central francês.
Jaillet acrescenta que é preciso ver se o conflito irá se estender até o Irã, acusado por Israel de envolvimento nos ataques realizados pelo Hamas. Se o país for objeto de novas sanções, poderá bloquear o estreito de Ormuz, via vital de transporte, o que causará abalo no comércio do petróleo. “É difícil medir o que pode ocorrer.”
O cientista político Frédéric Encel, professor do Instituto de Estudos Políticos de Paris e do Instituto Francês de Geopolítica, autor de inúmeros livros sobre Israel e o Oriente Médio, disse ao NeoFeed que a possibilidade de extensão regional do conflito entre Israel e o Hamas “é muita pequena”.
Encel afirma que Egito tem boas relações com Israel e se opõe ao Hamas. “O Egito colocou os membros do grupo Irmãos Muçulmanos, do qual surgiu o Hamas, na prisão. A Jordânia tem proteção israelense e a Síria tem hoje um exército sem forças enquadrado pela Rússia”, diz ele, acrescentando que não vê a possibilidade de outros países árabes se aliarem ao Hamas.
Segundo o professor do Instituto de Estudos Políticos de Paris, o conflito vai se tornar mais intenso. “Houve uma mudança de paradigma. Israel tem planos de pôr fim ao Hamas”, afirma.
Israel prepara uma intervenção terrestre enquanto mantém bombardeios sobre Gaza. A questão dos reféns israelenses, o que dificulta as operações, poderá fazer com que a guerra dure alguns meses, avalia Encel.
De acordo com o ministério do Interior da França, país que possui uma importante comunidade muçulmana e também judaica, cerca de 50 atos antissemitas – de pichações a insultos e ameaças de morte - ocorreram desde o início do conflito e 16 pessoas foram detidas.