O surpreendente acordo entre Estados Unidos e China para reduzir as tarifas de importação recíprocas, anunciado na segunda-feira, 12 de maio, foi recebido com euforia pelo mercado financeiro americano.
Pelo acordo, os Estados Unidos aceitaram reduzir a tarifa sobre as importações chinesas de 145% para 30%, enquanto a China reduziria o imposto de importação sobre produtos americanos de 125% para 10%.
O acerto, porém, deixou no ar dúvidas sobre os motivos que levaram o governo do presidente Donald Trump a recuar de forma tão rápida e abrupta à escalada de tarifas impostas contra a China, iniciada em 1º de fevereiro, logo após a posse.
A julgar por declarações de analistas e agentes do mercado, Trump foi obrigado a recuar – o que seria sua maior derrota política desde o anúncio da política tarifária americana, no “Dia da Libertação”, em 2 de abril, quando prometeu “subjugar” os países com os quais os EUA tinham déficit comercial.
Em um comunicado conjunto, os dois países afirmaram que suspenderiam suas respectivas tarifas por 90 dias e dariam continuidade às negociações iniciadas no final de semana em Genebra, na Suíça, por comitivas lideradas pelo secretário de Tesouro dos EUA, Scott Bessent, e o vice-primeiro-ministro chinês, He Lifeng.
Após o anúncio, as ações dispararam nas bolsas americanas, com os futuros do S&P 500 subindo mais de 3%. O dólar, cuja posição como moeda de reserva global vinha cambaleando desde o tarifaço, também se recuperou.
“Concluímos que temos um interesse comum”, disse Bessent, em Genebra. “O consenso de ambas as delegações é que nenhum dos lados queria uma dissociação.”
As declarações do secretário americano, porém, não convenceram analistas e gestores, para quem a redução das tarifas cobradas da China mostra claramente uma capitulação de Trump – que vinha sendo pressionado a recuar diante da crescente incerteza que a política comercial do presidente americano estava causando na economia dos EUA.
A reação inicial ao tarifaço minou a confiança das empresas e dos consumidores, percepção reforçada com uma forte saída de ativos americanos, incluindo o dólar e os títulos do Tesouro, pilares do sistema financeiro global.
Seguidas quedas nas bolsas e temores de as tarifas ressuscitarem o pesadelo da estagflação - uma recessão com inflação, fenômeno visto no país pela última vez há 50 anos - contribuíram para o cenário de mal-estar das últimas semanas.
Outro indicativo é o tom amistoso de Bessent em Genebra, em contrate com a linguagem agressiva de Trump, que há 40 dias justificou o tarifaço como uma resposta aos EUA serem "saqueados, pilhados e estuprados por nações próximas e distantes".
A linha do tempo da recente escalada de tensão entre EUA e China indicava que Trump não iria ceder tão cedo. Desde a posse, no final de janeiro, Trump elevou cinco vezes as tarifas sobre os produtos chineses.
Em 1º de fevereiro, o presidente americano impôs 10% de tarifas sobre todos os produtos, índice que dobrou em 3 de março. No “Dia da Libertação”, no início de abril , Trump elevou as tarifas contra os chineses para 54%.
Depois disso, no intervalo de uma semana, foram mais dois aumentos: para 104% em 8 de abril e 145% no dia seguinte. A China retaliou as tarifas com taxas equivalentes, mas também concordou em fazer uma pausa durante as negociações em andamento.
Tática de negociação
Desde a imposição de tarifas, muitos analistas atribuíram a ameaça de tarifas do presidente americano a uma tática de negociação de Trump para garantir melhores termos comerciais.
O acordo comercial fechado na semana passada por Trump com o primeiro-ministro do Reino Unido, Keir Starmer, foi usado como exemplo bem-sucedido dessa estratégia.
Na prática, o presidente americano conseguiu tudo o que queria com Starmer. O Reino Unido continuará a pagar tarifa de 10% de suas exportações - a média anterior ao governo Trump era de 1,3% -, enquanto as tarifas britânicas médias sobre importações dos EUA cairão de 5,1% para 1,8%.
Para Mark Williams, economista-chefe para a Ásia da Capital Economics, porém, o fato de o governo americano não incluir no acordo fechado no fim de semana em Genebra nenhum compromisso da China sobre seus desequilíbrios cambiais ou comerciais é um indicador de que Trump perdeu, pelo menos por enquanto, a aposta contra o governo chinês.
“Não há garantia de que uma trégua de 90 dias dará lugar a um acordo duradouro, especialmente se os Estados Unidos continuarem tentando mobilizar outros países para limitar o comércio com a China”, disse Williams.
O fato de a delegação chinesa ter chegado à reunião de cúpula com um trunfo – ter conseguido um aumento de 8% das exportações em abril, trocando os envios de mercadorias para os EUA para outros destinos – também pode ter influenciado no recuo americano.
Zhiwei Zhang, presidente e economista-chefe da Pinpoint Asset Management, uma empresa de investimentos em Hong Kong , também vê apenas um perdedor nessa disputa comercial entre os dois países: os EUA.
“Da perspectiva da China, o resultado desta reunião é um sucesso, pois a China assumiu uma posição firme diante da ameaça dos EUA de tarifas altas e, por fim, conseguiu reduzir as tarifas significativamente sem fazer concessões”, disse ele.
Na sexta-feira, o presidente americano chegou a sugerir que um acordo para estabelecer as tarifas para produtos chineses em 80% seria “uma boa ideia” – uma diferença e tanto para os 30% acertados dois dias depois.
Nas últimas duas semanas, os alertas dos varejistas americanos sobre prateleiras vazias – apoiados por dados que mostram o colapso das remessas para os portos dos EUA das exportações chinesas, em especial brinquedos e presentes de Natal – também podem ter levado o governo americano a dar um passo atrás em sua guerra comercial com a China.