A falta de resultados satisfatórios na COP 30, realizada em Belém, que terminou sem consenso sobre um cronograma para abandonar os combustíveis fósseis, reforçou a percepção de que o processo de transição energética global passa por um momento de reavaliação.

O impasse na capital do Pará refletiu a divisão entre países que defendem metas concretas e os que temem impactos econômicos.

No setor corporativo, porém, os custos elevados para avançar na substituição de fontes fósseis estão causando a suspensão, em várias partes do mundo, de projetos de hidrogênio verde e o recuo na produção de combustíveis sustentáveis para a aviação (SAF, em inglês) – duas fontes onde havia expectativa de investimentos volumosos.

A Associação Internacional de Transportes Aéreos (Iata), por exemplo, anunciou esta semana uma revisão para baixo da produção global de SAF para 2026.

De acordo com a entidade, que reúne cerca de 360 empresas aéreas (mais de 80% do tráfego aéreo global), a produção de SAF este ano deve atingir 1,9 milhão de toneladas, o dobro em relação a 2024. Mas esse crescimento deve desacelerar em 2026, com previsão de chegar, no máximo, a 2,4 milhões de toneladas.

“O crescimento da produção de SAF ficou abaixo das expectativas, pois mandatos mal concebidos travaram o impulso na ainda incipiente indústria de SAF”, afirmou Willie Walsh, diretor-geral da Iata, atribuindo a desaceleração à falta de políticas públicas para aproveitar plenamente as capacidades instaladas de SAF.

As empresas do setor de aviação vinham avançando lentamente para adotar o SAF – a produção deste ano representou apenas 0,6% do consumo total de combustível de aviação e terá um aumento previsto para 2026 de apenas 0,8%.

Os custos de substituição do querosene fóssil ainda são proibitivos. De acordo com a Iata, agregaram US$ 3,6 bilhões em gastos para o setor este ano. Na ponta do lápis, o SAF custa duas vezes mais que o derivado de petróleo. Em mercados com mandatos obrigatórios, o valor é até cinco vezes maior.

“Se o objetivo é aumentar a produção de SAF para avançar na descarbonização da aviação, então precisamos aprender com o fracasso e trabalhar com a indústria aérea para desenhar incentivos que realmente funcionem”, advertiu Walsh.

No segmento do hidrogênio verde, o desânimo é ainda maior. Cerca de 60 grandes projetos de hidrogênio de baixo carbono, incluindo empreendimentos dos grupos petrolíferos BP e ExxonMobil, foram cancelados ou suspensos este ano, em meio ao aumento dos custos, à incerteza política e até à falta de compradores.

O hidrogênio de baixo carbono — produzido com energia renovável e água ou com gás e captura e armazenamento de carbono — tem enfrentado dificuldades para garantir contratos iniciais com compradores, sendo o chamado hidrogênio verde e azul mais caro do que a versão "cinza", derivada de combustíveis fósseis sem a captura de suas emissões.

“Os últimos dois anos têm sido desafiadores para qualquer empresa que tente desenvolver projetos de hidrogênio limpo”, disse Murray Douglas, chefe de pesquisa de hidrogênio da Wood Mackenzie. “A disposição para pagar qualquer tipo de adicional verde em todas as tecnologias de baixo carbono simplesmente desapareceu.”

A consultoria rastreou mais de 300 projetos de hidrogênio de baixo carbono cancelados, paralisados ou inativos desde 2020, embora Douglas tenha afirmado que muitos eram especulativos ou de baixa qualidade.

Recuo, abandono e suspensão

A BP anunciou na semana passada a suspensão dos investimentos planejados em usinas de hidrogênio em Omã e em Teesside, no nordeste da Inglaterra, após ter abandonado este ano um projeto de usina de hidrogênio verde que seria construída na Austrália.

A Exxon suspendeu em novembro a construção de uma usina de hidrogênio no Texas, que seria uma das maiores do mundo. Equinor, ArcelorMittal e Vattenfall estão entre as empresas que cancelaram ou adiaram usinas de hidrogênio nos últimos 18 meses, enquanto a Shell abandonou um projeto em fase inicial na Noruega.

Os atrasos evidenciam os problemas na ampliação de uma tecnologia que há muito se mostra promissora como uma forma fundamental de reduzir as emissões de carbono.

Segundo a Agência Internacional de Energia, mais de 2.600 projetos foram anunciados globalmente até o final de 2024 – número considerado insuficiente, uma vez que a agência estima que a produção de hidrogênio limpo precise aumentar dez vezes até 2035 para atingir as metas de emissão zero líquida e limitar o aquecimento global.

“O que estamos vendo é uma fase natural e esperada de maturação do mercado — semelhante ao que as indústrias de energia eólica, solar e de baterias vivenciaram em sua fase inicial de expansão, onde aproximadamente um em cada dez projetos acabou entrando em operação”, afirmou Ivana Jemelkova, diretora executiva do Conselho de Hidrogênio, organização apoiada por grandes grupos industriais, bem como por importantes empresas de petróleo e gás como ExxonMobil, Aramco, Adani e Adnoc.

De acordo com o Conselho do Hidrogênio, mais de US$ 110 bilhões foram comprometidos com cerca de 500 projetos em todo o mundo.

Mas o custo continua sendo um problema, e o hidrogênio verde produzido usando até mesmo energia renovável barata pode custar cerca do dobro do produzido com combustíveis fósseis sem que as emissões sejam capturadas, principalmente devido ao custo de desenvolvimento da nova infraestrutura, bem como da distribuição.