Uma contradição marcou o desempenho do mercado global de energia eólica no ano passado. De acordo com a consultoria Wood Mackenzie, o mundo acrescentou, até o fim de 2023, capacidade de geração de energia eólica em volume suficiente para abastecer quase 80 milhões de lares, um recorde.
Esse aumento foi puxado pela China, com alta de 66% na produção de energia eólica em um ano. Em outros países, porém, o crescimento foi modesto ou até mesmo negativo - na Europa, a instalação dessa capacidade teve queda anual de 6%.
Os três maiores grupos de energia eólica do mundo - Siemens, Orsted e Vestas - deram, ao anunciar seus resultados do quarto trimestre, uma ideia da crise que atinge o setor, em especial o segmento de eólica offshore, que exige investimentos elevados para instalar as turbinas com pás gigantescas em alto-mar.
Impactadas pelo ciclo de aumento de juros no Primeiro Mundo entre 2022 e 2023, que elevaram os custos de investimentos em mais de 20% nos projetos em andamento, as três gigantes do setor reportaram prejuízos e cancelamento de novas unidades.
A dinamarquesa Orsted, uma das mais atuantes do mercado nos últimos anos, anunciou a suspensão de pagamento de dividendos e a demissão de 800 funcionários, além da revisão de portfólio.
A Siemens, maior fabricante mundial de turbinas eólicas offshore, revelou que projeta um prejuízo de US$ 2 bilhões em 2024 para sua subsidiária de energia eólica. A Vestas obteve lucro no quarto trimestre, mas disse que não vai pagar dividendos referentes a 2023.
Das três, a Orsted foi a mais impactada com o aumento dos custos. Ao divulgar os resultados do quarto trimestre, que fizeram suas ações caírem 2%, a empresa surpreendeu o setor ao anunciar sua retirada dos mercados eólicos offshore na Noruega, Espanha e Portugal, marcando um recuo após vários anos de expansão agressiva.
Considerada um exemplo na transição para energias renováveis, a Orsted viu o preço de suas ações cair mais de 70% desde 2021, quando a onda ESG atingiu o pico no setor de energia. Atualmente, está avaliada em US$ 16 bilhões.
Desafios de curto prazo como inflação alta, aumentos nos juros e nos custos das matérias-primas levaram a empresa a cancelar no ano passado dois grandes projetos de parques eólicos offshore no litoral de New Jersey, nos EUA, a um custo de mais de US$ 3,75 bilhões.
A Orsted também anunciou um plano de corte de custos de US$ 144 milhões e redução de sua meta de capacidade instalada de eletricidade renovável para 2030, de 50 gigawatts (GW) para 35-38 (GW).
Relatório da Agência Internacional de Energia (AIE) confirma que a crise no setor eólico se concentra no segmento offshore. De acordo com a agência, as adições anuais globais de capacidade renovável aumentaram quase 50% em 2023, para quase 510 gigawatts (GW), a taxa de crescimento mais rápida das últimas duas décadas.