O calendário virou. Agosto estreia uma fase de particular atenção do Brasil às relações externas em meio à estabilidade de taxas básicas aqui e nos EUA, desaceleração do crédito e da atividade doméstica prescrita pelo juro praticado pelo Banco Central e política em destaque, já no início do mês, por dois eventos: a retomada dos trabalhos no Congresso Nacional e a reunião plenária do Conselho de Desenvolvimento Social e Sustentável – o “Conselhão” de Lula.

Relações arranhadas entre Brasil e EUA – menos pelo tarifaço mais brando que o esperado e mais pelo viés político da decisão – poderão ter impacto sobre investimentos estrangeiros tanto financeiros quanto na economia real.

O Brasil continuará em negociação com o governo americano no campo das tarifas, mas é inegável que persistem incertezas quanto a restrições futuras a que o País estará exposto, ante um imprevisível Donald Trump e suas políticas protecionistas que parecem ter no choque tarifário apenas um primeiro capítulo.

Diversificar relações comerciais é óbvia necessidade para o Brasil, mas resultados levam tempo. Em contraponto, já estão presentes efeitos decorrentes do estremecimento das relações com os EUA – maior volatilidade do câmbio, do fluxo de capital externo para aplicações na B3 e menor oferta de investimento direto.

Após colar, no início de julho, em R$ 28 bilhões no acumulado do ano, o saldo de capital externo na bolsa caiu mais de R$ 7 bilhões entre os dias 8 de julho – véspera do anúncio da tarifa de 50% para produtos brasileiros – e 18 de julho. Investidores ensaiaram reação, mas a conta segue no vermelho. No mês, até o dia 29 de julho, o saldo ficou negativo em quase R$ 6 bilhões e, no ano, ameaça cair abaixo de R$ 20 bilhões.

O Investimento Direto no País (IDP) desacelerou antes, em junho, e provocou a queda de quase 11% no resultado do primeiro semestre – período de pior desempenho desde 2021. O movimento foi visto pelo BC como “pontual” e não tendência por considerar normal o adiamento de decisões ante a incerteza derivada da política tarifária de Trump. A ver.

O câmbio também sofreu com acordos sobre tarifas entre EUA e outras nações. O acerto com a União Europeia – o maior realizado – fortaleceu o dólar no mundo. O real desvalorizou e depois se acomodou até levar um breve tranco, na quarta-feira 30 de julho, com a aplicação pelos EUA da Lei Magnitsky de sanções contra o ministro Alexandre de Moraes do Supremo Tribunal Federal (STF). Ronda R$ 5,60, ante R$ 5,43 um mês atrás.

Plano de contingência não é licença para gastar

Nesse ambiente de “um olho no peixe e outro no gato” as atenções se voltam para Brasília. Na terça, 5 de agosto, com centenas de representantes que apoiam o governo em decisões estratégicas, o “Conselhão” se reúne para apresentação de novos membros e discussão, entre outros temas, das tarifas comerciais. A defesa da soberania nacional deverá reverberar no megaevento.

Na véspera, o Congresso retoma os trabalhos preparando-se para votar medidas provisórias que podem perder prazos de validade, projetos caros ao governo e, possivelmente, algumas das propostas do plano de contingência contra efeitos do tarifaço nos setores afetados que já pressionam o governo com inúmeras demandas. O desafio imposto a Fernando Haddad é indicar que “contingência” não é licença para gastar, ainda que os recursos empregados não sejam contabilizados na meta fiscal.

Para além das medidas emergenciais, na Câmara a prioridade coincide com a do Executivo: a votação do projeto que isenta de IR quem recebe até R$ 5 mil por mês. E tem, em contrapartida, a cobrança extra de até 10% para quem ganha acima de R$ 600 mil/ano ou R$ 50 mil/mês. A alíquota de 10% incidirá para quem recebe a partir de R$ 1,2 milhão/ano ou R$ 100 mil/mês.

Não menos importante é a aprovação da medida provisória que altera tributação de aplicações financeiras e virtuais. A proposta prevê aplicação de uma alíquota única do IR de 17,5%, em substituição às alíquotas atuais com tributação regressiva no tempo, de 22,5% a 15%, em operações de renda fixa, ou 15% em renda variável. Ativos hoje isentos estarão sujeitos a IR de 5%.

Entre as pendências a serem apreciadas no Congresso estão a PEC da Segurança Pública, a PEC dos Precatórios e a instalação da CPMI do INSS – tema sensível ao governo.

Parlamentares que, às vésperas do recesso aprovaram o uso de até R$ 30 bilhões do Fundo Social do Pré-Sal para renegociar dívidas de produtores rurais – um pesadelo a ser desarmado pelo governo Lula – estão devendo a aprovação da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) que define regras para o Orçamento de 2026 a ser encaminhado pelo Executivo ao Congresso até 31 de agosto.

Pelo texto da LDO, enviado em abril, o Orçamento do ano que vem deverá considerar expansão do PIB de 2,5%, inflação de 3,5% e salário mínimo de R$ 1.630,00.  As despesas primárias deverão somar R$ 2,593 trilhões e as receitas R$ 3,2 trilhões. As renúncias fiscais, que o governo promete limar e coibir, alcançam R$ 620 bilhões.

No conjunto, as contas públicas deverão apresentar, em 2026, superávit estimado em R$ 34,3 bilhões e meta fiscal de 0,25% do PIB – primeiro resultado positivo a ser perseguido pelo governo Lula 3.0. No Congresso, concorrerá com a agenda econômica a pressão do PT para que sejam pautados pedidos de cassação do mandato do deputado licenciado Eduardo Bolsonaro (PL-SP).

Na “conta” do presidente Lula estará a sanção ou veto parcial ou integral, até 8 de agosto, do marco geral do licenciamento ambiental. O texto, que procura uniformizar regras da legislação ambiental, coloca em confronto princípios e objetivos dos ministérios do Meio Ambiente e de Minas e Energia.

O primeiro trabalha por vetos e reforma do texto. O segundo, pela sanção presidencial cuja possibilidade atiça ambientalistas que já apelidaram o marco de PL da Devastação por flexibilização de regras às vésperas da COP 30.