O Dia da Independência, na quinta-feira, 7 de setembro, encurta a semana, mas não diminui sua relevância. A análise da proposta orçamentária de 2024 e de medidas com foco na arrecadação – encaminhadas ao Congresso na quinta-feira, 31 de agosto – deve rivalizar a atenção do mercado com dados de atividade e inflação que serão disparados nos EUA, Europa e China.
Índices de Gerentes de Compra vão apontar eventual recuperação ou maior desaquecimento das grandes economias em agosto e recalibrar expectativas quanto à perspectiva de encerramento da alta de juros – já concluída no Brasil.
Característica de sessões truncadas por feriados, a baixa liquidez reduzirá o ritmo dos negócios no mercado local, dará espaço à avaliação mais acurada da intenção do governo de zerar o déficit público em 2024 e poderá frear a venda de ações por estrangeiros que deixaram maciçamente a bolsa em agosto.
Os dados são parciais, mas impressionam. No mês, até o dia 28, a saída de capital externo do mercado secundário da B3, de ações listadas, rondou R$ 13 bilhões, montante que reduziu a R$ 11,2 bilhões o saldo positivo dessa categoria de investidores em 2023.
Essa revoada histórica contribuiu para a queda do Ibovespa no mês, mas não em velocidade superior à observada em outros mercados. No ano, o índice segue positivo e, principalmente, ao sabor de eventos externos.
Em conversa com a Coluna, o economista Marcos Mollica, gestor macro do Opportunity, afirma que a saída de estrangeiros da bolsa brasileira nas últimas semanas não é reação a questões domésticas.
“A migração de investidores está fundamentalmente ligada ao cenário externo. E reflete, em particular, o aumento das preocupações com a economia chinesa e abertura das taxas dos títulos do Tesouro norte-americano de longo prazo. Todas as bolsas emergentes registraram movimento similar”, observa.
A ver como será o comportamento desses investidores em setembro, pondera o economista para quem o posicionamento dos estrangeiros estará condicionado, sobretudo, ao resultado de indicadores a serem divulgados nas próximas semanas.
Mollica frisa que a inflação ao consumidor americano, que sai em meados de setembro, é relevante. Combinado ao desempenho do mercado de trabalho, alvo de atenção permanente do Federal Reserve (Fed), o indicador deve definir o rumo da política monetária americana com impacto global.
Selic abaixo de 13% não faz milagre
O Fed voltará a discutir taxa de juro em 19 e 20 de setembro, data coincidente com a próxima reunião do Comitê de Política Monetária (Copom) que deverá cortar a Selic 0,50 ponto percentual. Confirmada a sinalização do colegiado, a taxa básica cairá a 12,75% - nível observado em maio/junho de 2022.
É exagero supor que a ruptura do suporte de 13% levará à redução significativa no custo do crédito. Entretanto, terá efeito positivo sobre as expectativas quanto ao cenário econômico. Afinal, juro menor reduz despesas do governo.
Expectativas positivas também decorrem do avanço de medidas encaminhadas pelo governo ao Congresso com vistas a ampliar receitas. Ainda que a tributação de fundos exclusivos e offshores não esteja garantida sem alterações de texto e a intenção de zerar o déficit público em 2024 pareça improvável ao mercado e discutível para parte do governo e do PT.
A trégua concedida pelo feriado e pela viagem do presidente Lula à Índia, onde ocorrerá a Cúpula do G 20 entre 9 e 10 de setembro, também deve abrir espaço para que a equipe econômica se prepare para “virar a chave” da política fiscal para o crédito – instrumento crucial para frear a queda do PIB contratada para 2024 e, por consequência, da arrecadação.
Sinal de relevância, o crédito permeou declarações e decisões de governo nos últimos dias. O presidente Lula expôs o assunto em sua live semanal, na terça-feira, 29 de agosto, quando anunciou a criação do Ministério da Pequena e Média Empresa “para cuidar de quem precisa de crédito e oportunidade”.
É fato que a nova pasta poderá acelerar a reforma ministerial para acomodar partidos do Centrão e fortalecer a base aliada ao governo no Congresso, mas a nova pasta poderá impulsionar o segmento – potente gerador de empregos.
Na linha de facilitar o crédito, na segunda-feira, 28 de agosto, a Caixa informou a extensão do prazo de pagamento de operações do Pronampe (Programa Nacional de Apoio às Microempresas e Empresas de Pequeno Porte) para 72 meses. Inicialmente, o prazo era de 48 meses podendo chegar a 60.
Peculiaridades do crédito pressionam juros
Ainda na segunda-feira, durante evento promovido pela Warren Rena, Roberto Campos Neto, presidente do BC, também alertou para o crédito – necessário para o crescimento econômico – como uma das condicionantes do juro alto praticado no país em função de peculiaridades do mercado local.
Ele citou como características negativas para a potência da política monetária – que exige mais juro para entregar um mesmo resultado – o baixo índice de recuperação do crédito que depende, sobretudo, de morosas decisões judiciais e a expressiva participação do crédito direcionado no crédito total. Relação, segundo Campos Neto, sem paralelo no mundo.
Até pela relevância do crédito como alavanca de crescimento, tese abraçada pelo PT desde sempre, dados do BC preocupam pela firme desaceleração. Dado mais recente divulgado pela instituição, em 12 meses até julho, o estoque de operações avançou 8,2%, vindo de expansão de 9,2% até junho.
Para o ano, a projeção do BC é de crescimento de 7,7%. A Federação Brasileira de Bancos (Febraban) prevê 7,6%. Em 2022, o crédito cresceu o dobro: 14%.