Ao contrário do que diz sua “bio” no Instagram, a bióloga, DJ e atriz Mari Krüger não está “perdida no personagem. Aos 34 anos, ela encontrou o tom para falar de ciência e, de forma descomplicada e bem-humorada, tem conquistado uma legião cada vez maior de seguidores.
Hoje esse número está em torno do 1,1 milhão. And counting.... Se comparado ao universo dos influenciadores mais famosos, pode parecer pouco — só que não.
É muito porque Mari se propõe a derrubar mitos propalados à profusão na internet, justamente, por muitos daquela turma com dezenas de milhões de seguidores.
Fazendo as vezes de anjo da guarda, policial, bicho, banana, mosquito da dengue, vírus (da gripe e da covid), cúrcuma, alumínio, tênis de corrida... e dela mesma, a bióloga desmistifica conceitos apresentados como verdade absoluta e crenças, que todos nós adoraríamos que fossem verdade.
Sabe o shake que promete músculos sem ginástica? A balinha que potencializa a síntese de colágeno? As cápsulas que dispensam a ingestão de vegetais? Pois então, bobagem.
E a tese de que misturar bebida piora a ressaca; que usar panela de alumínio contamina o organismo ou que é preciso lavar a carne antes de cozinhar? Esqueça.
“Sei que sou chata e desejo continuar 🤝🏻😂” escreve Mari, na descrição do vídeo Mas então nada funciona?
Como mulher das ciências, na maioria das publicações, ela faz questão de divulgar os links dos estudos nos quais baseia seu discurso e dos pesquisadores, médicos e nutricionistas que, por vezes, a ajudam no conteúdo.
Gaúcha de Porto Alegre, mas morando em São Paulo, é à ciência que ela recorreu para alertar sobre a urgência da crise ambiental e mobilizar esforços no socorro às vítimas da enchentes no Rio Grande do Sul. Seu primeiro vídeo sobre o desastre alcançou mais de 16 milhões de visualizações.
“Essa tragédia está mexendo muito comigo. Não apenas por estar conectada a quem eu sou, como bióloga, mas por ter ocorrido na minha cidade.”, diz ela, em entrevista ao NeoFeed.
Bem antes da catástrofe, a influencer é frequentemente interpelada por seus seguidores sobre quanto tempo ainda resta à humanidade, antes de extinção.
“Eu sempre respondo que, infelizmente, não vai ser de uma hora para outra. E digo infelizmente por que esse será um processo que ainda vai nos machucar muito”, diz. “Temos a força da natureza agindo, mas, é importante lembrar: essas situações se devem, principalmente, aos governos que não deram ouvidos para as previsões científicas e, como no caso do Rio Grande do Sul, não prepararam as cidades para impedir a tragédia”.
Viva a ciência
O colapso, em sua opinião, só será evitado se dermos, de fato, atenção à ciência. “Eu detesto a expressão ‘o lado bom da pandemia’, mas, entre muitas aspas, o lado positivo da pandemia é que as pessoas acabaram entendendo a importância da ciência, o que gerou um enorme interesse por esse tipo de conteúdo”, explica a bióloga.
E foi por causa do novo coronavírus que Mari virou criadora de conteúdo. Vidrada em música, a bióloga vivia exclusivamente de ser DJ. O isolamento social, porém, a tirou das picapes. Sem ter o que fazer, começou a gravar vídeos para as redes sociais. “Eu não via aquilo como uma profissão, era só para passar o tempo mesmo”, lembra.
A pandemia durou mais do que o imaginado e ela percebeu que influencer poderia ser uma profissão. “Precisava pagar as contas e encarei aquilo com mais seriedade”, conta. “Fiz cursos para me especializar e investi em equipamentos.”
Seu foco (e seu sucesso), desde o princípio, está no conteúdo científico tratado com humor.
Em uma publicação, fazendo o vírus da gripe desempregado, reforça a importância da vacina. Como mosquito da dengue, abriu a caixinha de perguntas e um seguidor quis saber: “É verdade que ele [o inseto] só pica até às 18 horas? Ao que ela respondeu, com galhofa: “É verdade, sim... ele é CLT.”
Aos poucos, Mari foi percebendo que seria interessante também promover uma cruzada contra produtos ditos milagrosos.
Em um vídeo, ela tira sarro das gominhas para fazer cabelo crescer. Em outro, debocha dos cremes e suplementos que prometem, como num passe de mágica, o tal “corpo de verão”. Para quem a acompanha é uma diversão.
O sucesso levou Mari para o universo da palestras e das publis pagas. A bióloga já fez e/ou mantém parceria com a Amazon, Uber, Droga Raia, Quinto Andar, Skelt Cosméticos, Heineken, Natura, Faculdade Sírio Libanês... e por aí vai, até que nenhum produto ou serviço vá contra seus princípios.
E eles são muitos, já que ela é vegana e, adepta da circularidade, só compra roupas e móveis usados, por exemplo.
“Eu sei que os conteúdos que prometem coisas impossíveis têm mais seguidores e esses influenciadores ganham muito mais dinheiro do que eu”, diz. “Mas eu procuro olhar sob outra perspectiva: não vou conseguir mudar o mundo como eu queria, quando era criança, mas consigo mudar o mundo de algumas pessoas.”
Os cientistas e as grandes transformações
Mari não lembra exatamente quando começou a se interessar por ciência. “Fui, desde cedo, muito curiosa e queria fazer coisas grandiosas, que transformassem a história da humanidade”, lembra. “E sempre via cientistas atrelados a essas mudanças.”
Mas, no ensino médio, pensou em fazer Direito ou Relações Internacionais. Talvez, a virada de chave tenha acontecido na época em que mudou de colégio e o novo tinha um laboratório mais bem estruturado do que o da escola anterior. Prestou vestibular para Ciências Biológicas e se formou em 2013.
Desde 2012, ela já pagava suas contas trabalhando como DJ. E como a bióloga foi parar atrás das picapes é, no mínimo, curioso.
Aos 14 anos, foi convidada para ser modelo. Os pais adotivos sempre a apoiaram em tudo e lá foi a adolescente modelar. Mas ela jamais alcançaria a altura necessária e então foi cursar artes cênicas. Aos 18 anos, trabalhava para uma agência de atores.
Tudo foi bem, mas não exatamente como planejado. Aos 22 anos, imitando uma dondoca bem, bem fresca, protagonizou um anúncio, que era veiculado no YouTube. No filme, ela fazia pose e gritava: “Outlet!?Adoro!”.
A bióloga virou meme e “conquistou” seus primeiros haters. Subcelebridade em Porto Alegre, ela foi convidada para tocar em uma "festa trash". Foi um sucesso. Mari virara DJ.
Em 2015, até tentou fazer um mestrado em Ecologia, mas desistiu depois do primeiro ano, porque era impossível estudar e tocar na noite – “e eu ganhava mais como DJ”, diz.
Agora, com o trabalho de criadora de conteúdo ela combina a biologia com as artes cênicas e a música. “Rotina que enlouquece meu anjo da guarda, mas que me faz muito feliz”, diz, em um vídeo.
Como costuma comentar: “A internet está cheia de influenciadores que se acham experts, mas nós precisamos de mais experts que queiram influenciar”. A parte dela, a bióloga Mari Krüger está fazendo com muito humor e graça.