Ao revisitar a jornada do menino que não queria crescer, “Peter Pan & Wendy” abre uma nova safra de clássicos de animação reciclados em live-action pela Disney. “A Pequena Sereia”, “Branca de Neve”, “Lilo & Stitch” e “Hércules” são as próximas (já confirmadas) adaptações em carne e osso de antigos desenhos do estúdio.
Desde sexta-feira, 29 de abril, no catálogo da plataforma Disney+, “Peter Pan & Wendy” segue uma estratégia tradicional da empresa: a de sempre resgatar marcas já conhecidas do público com nova roupagem. Muitas vezes, encabeçadas por astros e estrelas que, por si mesmos, já servem de chamariz de bilheteria, emprestando o seu prestígio aos personagens.
A prática foi iniciada nos anos 90, com “O Livro da Selva” (1994), apresentando o Mogli na pele do Jason Scott Lee, a partir do desenho homônimo lançado em 1967. Com mais de 50 animais treinados para o elenco, incluindo tigres, ursos, lobos, elefantes e macacos, a produção orçada em US$ 30 milhões obteve uma renda de mais de US$ 70 milhões, sinalizando que a reciclagem valia a pena.
O primeiro grande sucesso de transposição de desenho para live-action foi “101 Dálmatas” (1996), trazendo Glenn Close como Cruella de Vil. Inspirada na animação “A Guerra dos Dálmatas”, de 1961, em que filhotes são raptados por ricaça obcecada por casaco feito de pele de cachorro, a adaptação consumiu US$ 75 milhões e arrecadou mais de US$ 320 milhões de bilheteria ao redor do mundo.
Esse tipo de versão ganhou ainda mais força a partir de 2010. Foi o ano de lançamento de “Alice no País das Maravilhas”, com Johnny Depp no papel do Chapeleiro Maluco. O estúdio revisitou aqui a aventura psicodélica da garota curiosa que caiu na toca do Coelho Branco, apresentada pela primeira vez pela Disney no clássico animado de 1951.
Foram os números que sempre encorajam o estúdio a revirar o próprio baú em busca de novos hits. A versão de “Alice”, por exemplo, garantiu à Disney o segundo lugar no ranking dos filmes mais lucrativos de 2010, ao totalizar mais de US$ 1 bilhão de renda mundial.
Em seguida, vieram as adaptações de “Malévola” (2014), um remake do desenho “A Bela Adormecida” (1959) estrelado por Angelina Jolie, e “Cinderela” (2015), drama com Cate Blanchett inspirado na animação de 1950. Algumas das versões também ganharam sequências, como “Alice Através do Espelho” (2016) e “Malévola: Dona do Mal” (2019).
Houve ainda casos de segunda adaptação em live-action de antigos desenhos. Como “Mogli - O Menino Lobo” (2016), também inspirado na animação “O Livro da Selva”, e “Cruella” (2021), em que Emma Stone assumiu o papel que foi de Glenn Close, na nova versão de “A Guerra dos Dálmatas”.
A modernização dos clássicos Disney
Em alguns casos, a reciclagem representa uma chance de modernização, refletindo a proposta de reforçar a diversidade na galeria de personagens da Disney. Um dos primeiros exemplos nesse sentido foi o de “A Bela e a Fera” (2017), adaptação em live-action do clássico de animação de 1991.
Enquanto a filha de um mercador em ruínas (Emma Watson) vive um romance improvável com príncipe amaldiçoado no corpo de um monstro (Dan Stevens), há uma insinuação gay no pano de fundo. O personagem Le Fou, o servo de Gaston, dá a impressão de estar apaixonado por seu patrão.
No recém-lançado “Peter Pan & Wendy”, a fada Tinker Bell é negra (vivida por Yara Shahidi), distanciando-se da figura loira de olhos azuis do desenho. Embora a escalação tenha gerado críticas e até ataques racistas nas redes sociais, a iniciativa procura quebrar a hegemonia branca entre os personagens ícones. É algo que o estúdio tenta fazer desde 2009, com “A Princesa e o Sapo” (2009), em que lançou Tiana, a primeira negra da franquia Disney Princesas.
“A Pequena Sereia”, adaptação em live-action do clássico de animação de 1989, também busca a diversidade. O filme que desembarca nos cinemas em 25 de maio traz outra atriz negra, Halle Bailey, na pele de Ariel, concebida como ruiva de olhos azuis no desenho.
Há novidade também na versão em carne e osso de “Branca de Neve”, o primeiro longa-metragem animado da Disney, realizado em 1937. Prevista para estrear no ano que vem, a adaptação vai trazer uma atriz latina, Rachel Zegler, no papel-título, o que também rendeu ataques, principalmente no Twitter.
Até o ator Peter Dinklage contribuiu para a polêmica em torno da reciclagem de “Branca de Neve”. No seu caso, ele criticou a ideia de revisitar uma história que chamou de “retrógrada”, por apresentar “sete anões morando juntos em uma caverna”.
A Disney foi obrigada a se pronunciar oficialmente diante do comentário do ator, que ganhou uma legião de fãs com a série “Game of Thrones”. O comunicado dizia que “para evitar reforçar os estereótipos do filme de animação original, vamos abordar de forma diferente esses sete personagens”. Até o título, inicialmente anunciado como “Branca de Neve e os Sete Anões”, teve que passar para “Branca de Neve” apenas.