Enquanto Nova York elege um novo prefeito que promete aliviar o preço da moradia na cidade, uma parcela bem menor da população enfrenta outro problema. Mas este pode ser colocado na categoria "perrengue chic": a maior torre residencial do ocidente, um empreendimento que sugou US$ 1,3 bilhão em sua construção.

Erguido há dez anos, o edifício de luxo 432 Park Avenue, de 96 andares, tem ocupado as manchetes por apresentar uma série de defeitos estruturais incompatíveis com os dólares despejados por seus moradores. Seus 125 apartamentos variam de estúdios a seis quartos e sete banheiros. Na época de sua inauguração, um duplex saia pela bagatela de US$ 90 milhões.

Plantado entre as ruas 56 e 57, o espigão de 425 metros destoa dos prédios vizinhos na lendária avenida. A obra foi projetada pelo uruguaio Rafael Viñoly (falecido em 2023) e chama a atenção por ser inteiramente reta, algo incomum para tamanhos colossais. A razão? O design é inspirado em uma lata de lixo de metal projetada pelo arquiteto e designer austríaco Josef Hoffmann (1870-1956).

O prédio faz companhia a outros arranha-céus solitários do chamado Billionaires Row, como o One57 e o Steinway Tower, que brotaram ao longo da rua 57. Quem frequente a região os vê como uma afronta à silhueta ao sul do Central Park, além de fazer sombra no parque. Mesmo antes de ser inaugurado, o 432 Park Avenue foi apelidado pela New York Magazine de “genuíno ferro velho prestes a dar um tapa no céu”.

Para explicar o recente problema técnico do edifício, uma reportagem do New York Times fez um paralelo entre o 432 Park Avenue e o Empire State Building, uma obra art déco de 1930 e com 102 andares. Ambos têm altura semelhante. A diferença entre eles, no entanto, é a proporção que os engenheiros chamam de “esbeltez”: o Empire State Building é três vezes mais alto do que largo. O 432 Park, é quinze vezes mais alto do que largo.

Esta matemática influencia a capacidade do prédio de resistir à flambagem, termo técnico que indica desvio das vigas. Para minimizar o risco de oscilações, o 432 Park Avenue foi desenhado com andares abertos ao longo do edifício, permitindo a passagem de ar. É curioso imaginar como um projeto desta natureza foi erguido três anos depois da passagem do furacão Sandy, que devastou diversas áreas da cidade.

Stefanos Chen, um dos repórteres do The New York Times que acompanha o caso, disse em vídeo que, desde 2021, o conselho do condomínio entrou com duas ações judiciais contra os incorporadores e outros responsáveis, alegando que o prédio não corresponde ao prometido e que os compradores não foram avisados sobre os possíveis riscos.

Advogados dos proprietários calculam que os reparos podem ultrapassar US$ 100 milhões, e que não dispõem de soluções simples para muitos dos problemas. Inspetores dizem que se estes engasgos não forem consertados, ao longo do tempo eles podem tornar o prédio inabitável e ainda expor pedestres a acidentes.

Segundo o jornal, mesmo quando não bate vento, o prédio chacoalha, lustres balançam e as banheiras transbordam. Os repórteres analisaram documentos judiciais e e-mails privados, onde constam episódios de “paredes rangendo, elevadores quebrados, inundações cujo reparo necessita de cifras milionárias e, para muitos, a constante sensação de estar em um barco”.

Há ainda rachaduras e cavidades na fachada de concreto. Neste caso, o uso da mistura tradicional de cimento, areia, brita e água feita para as fachadas de um prédio comum, foi algo inédito para um prédio tão alto e esguio. Para tornar o material mais resistente, era preciso uma outra combinação que, consequentemente, traria um aspecto mais escuro à fachada. Como a ideia era manter uma cor clara, os incorporadores tiveram de optar entre a cor e a resistência. A estética venceu.

Antes desta baderna, em 2018, a atriz Jennifer Lopez comprou um apartamento de três quartos e 372 metros quadrados no 36º andar por US$ 15,3 milhões, e vendeu no ano seguinte por US$ 17,5 milhões. Ao juntar suas famílias, Jennifer e seu então noivo (e ex-jogador de beisebol) Alex Rodriguez, precisavam de um cafofo maior. O apartamento ficou apenas cinco meses no mercado.

Apartamentos têm vista 360º de toda a cidade

Os andares de lazer são espalhados em todo o edifício

Por lá, é possível encontrar até uma sala de cinema compartilhada

A ideia é que você aproveite o lugar como fosse rei

Mas grande parte dos moradores sequer vive lá. “Metade das luzes do edifício 432 Park vivem apagadas”, disse uma corretora de imóveis ao NeoFeed. “Em geral, não há famílias locais, com filhos na escola ou empregos na cidade. Os proprietários dos apartamentos são, em grande maioria estrangeiros, que compram as unidades em cash, visando investimento imobiliário”.

“Este perfil de comprador ressurgiu na cidade após a baixa causada pela pandemia”, disseram eles, acrescentando que a região do prédio é cercada por bancos e escritórios. “Os donos destas unidades evitam falar com a imprensa para o valor de seus imóveis não despencar ainda mais. Outros, dizem que as alegações são exageros e difamações - esta é a fala também dos incorporadores."

No site StreetEasy, de anúncios de apartamento, há nove unidades à venda, cinco deles com valor depreciado. Eles variam de US$ 10 milhões por um dois quartos e dois banheiros (US$ 505 mil a menos que a listagem inicial) a US$ 55 milhões por cinco quartos e seis banheiros.

O site divulga que o prédio oferece restaurante privativo de 743 m², com um terraço de 465 m² para eventos, lounge para moradores, piscina e hidromassagem, academia de última geração e um spa. Mais: salas de bilhar e de cinema, brinquedoteca, biblioteca com lareira, adegas climatizadas, e uma sala de reuniões cuja mesa de mármore acomoda 14 pessoas. Há room service, concierge, manobrista, porteiro 24 horas e, para garantir discrição, entrada coberta e garagem.

Para os nova-iorquinos da gema, quase nada disso importa. Eles sabem que luxo nesta cidade significa aproveitar a vida na rua.