Na década de 1980, aos 6 anos de idade, o argentino Facundo Guerra desembarcava com a família em São Paulo. Ao lado do pai, brasileiro, médico do trabalho, e da mãe, argentina, Facundo cresceu sabendo que tinha de estudar muito para ser um profissional bem-sucedido. E assim foi.
Frequentou o colégio Bandeirantes, se formou em Engenharia de Alimentos no Instituto Mauá de Tecnologia, fez pós-graduação em Jornalismo Internacional e Político na PUC e mestrado e doutorado em Ciências Sociais também pela PUC. Então, trabalhou em grandes corporações, incluindo Tetrapac, American Express e AOL.
Aí veio o susto: em 2004, foi demitido. Foi a deixa para arriscar carreira solo e empreender. No caso, na noite paulistana. “Foi tudo meio que por acidente. Eu não tinha familiaridade com a noite e não gosto de beber”, conta. Mas o empresário viu uma oportunidade ao conhecer um dos sócios, José Tibiriçá, na época dono de um antiquário.
“Ele costumava dar festas no antiquário e queria levar o ponto para a Augusta. Foi aí que me mostrou o local do Vegas,” lembra. “Me deu um medo terrível, o lugar era muito grande e nem tínhamos tanto dinheiro. Mas descobri que eu sabia montar produto.”
Um ano depois, surgiu o Vegas Club, sua primeira casa noturna, endereço que durou sete anos e ajudou a formar a região boêmia conhecida como o Baixo Augusta. “Percebi que gostava de montar palcos, mas não ficar em cima deles. Gostava de proporcionar experiências de sociabilidade.”
O Grupo Vegas, do qual Facundo é CEO, trouxe à cena noturna paulistana nomes como Volt, Z Carniceria, Lions Nightclub, Yacht e Cine Joia, Riviera, Mirante 9 de Julho, Bar dos Arcos e Blue Note – este último, o mais recente, filial do icônico bar nova-iorquino. Em 2016 Facundo foi eleito um dos 100 empreendedores mais influentes do mundo pela revista norte-americana Good Magazine. Em 2019, recebeu da câmara de vereadores de São Paulo o Título de Cidadão Paulistano.
Mas, aí, veio outro susto: a pandemia do coronavírus. “Foi uma espécie de apocalipse pessoal e me levou três dos nove projetos que cuidava.” Visionário que é e preocupado com o futuro e questões como crise climática, qualidade de vida e conexão em excesso, Facundo já vinha traçando, há cinco anos, um outro projeto: o Altar.
“Queria ter uma casinha no campo para se recolher. Mas que fosse pequena e autossuficiente, inspirada no movimento das ‘tiny houses’ (que promove a redução do espaço em que vivemos) e nas cabanas na floresta.” Baseado nessa necessidade, pensou que outras pessoas, como ele, pudessem desejar o mesmo.
E, ao invés de comprar um sítio e ter a obrigação e os custos altos de manter um lugar fixo para os fins de semana, por que não montar várias casinhas em diferentes lugares e colocar para locação?
Dito e feito. Em parceria com o publicitário Rodrigo Martins, Facundo desenvolveu o conceito e encontrou a SysHaus, empresa de design que tem projetos inteligentes de casas pré-fabricadas. Pouco depois, descobriu que o empresário Marcelo Hannud, proprietário da Fazenda Pedra Alta, em Joanópolis, a 150 km de São Paulo, sonhava em montar algo assim.
Com um investimento de R$ 500 mil, a primeira casinha foi lançada no início de 2020. E não se trata de uma casinha comum. Flutuante, sobre as águas da Represa de Piracaia, possui placas solares para energia e uma tecnologia que funciona escondida.
Ela tem 62 metros quadrados e acomoda até quatro pessoas – duas no quarto e duas no sofá cama. Wifi? “Tem, por causa da pandemia. Se tiramos totalmente a conexão as pessoas se sentem muito frágeis.”
Impulsionada pelo momento de isolamento social, a repercussão foi gigantesca. “A casa muda de paisagem por causa do vento. Você vai dormir com uma paisagem e acorda com outra. Dá um mergulho na represa mais limpa do Brasil.” Com diárias a partir de R$ 1.261, está disponível para locação pelo Airbnb e tem fila de espera até 2022.
O segredo do sucesso? “Estar isolada”, revela. “A gente não está no campo da hospitalidade, estamos no campo da saúde mental. Oferecemos uma cura para o excesso de tela, para as pessoas se conectarem com a natureza, com seus cônjuges, com Deus. Daí o nome Altar”, completa.
Não demorou para que Facundo percebesse o potencial do negócio, o mais lucrativo de sua vida. Com um investimento de R$ 350 mil, a segunda casinha, Altar Prainha, foi inaugurada em janeiro deste ano na mesma fazenda e com os mesmos princípios sustentáveis. Só que fica em terra firme e tem acesso a uma pequena praia privativa.
“São 55m² internos e 45 m² externos, tem um pouco mais de mais estrutura e um luxo contido”, conta. Diga-se, som de última geração e projetor 4k, móveis de estilo modernista da Westwing, enxoval Trousseau e cozinha equipada com utensílios da francesa Le Creuset.
E este é só o começo. Em julho fica pronto o terceiro projeto: outra casa flutuante, gêmea da primeira, na Represa de Piracaia. “Daqui a pouco vamos para um outro núcleo e faremos mais três casinhas”, revela Facundo. O local ainda é mantido em segredo, mas o empresário assegura de que o Altar estará presente na praia.
Até o final de 2023, prevê 50 destas pequenas construções modulares (algumas delas flutuantes) espalhadas pelo Brasil. “Sempre tive essa paranoia com o apocalipse. Vimos um prenúncio do que poderia ser esse colapso. Vivemos o medo, a insegurança, a incerteza, o fim de uma maneira de viver, o fim de um excesso.”