Deslizar pelas águas do Douro, no norte de Portugal, cercado pelas montanhas onde as vinhas são plantadas em terraços, é uma viagem cada vez mais procurada por brasileiros. Ali, fica a mais antiga região vinícola demarcada do mundo.
Reconhecido como Patrimônio da Humanidade, pela Unesco, na categoria paisagem cultural, o chamado Douro Vinhateiro produz vinho há mais de 2 mil anos. Mas, foram os ingleses, no século 17, que implementaram e deram a conhecer ao mundo o famoso vinho do Porto, uma bebida licorosa e fortificada (que tem adição de aguardente), envelhecida em toneis de carvalho.
Em 2003, porém, quatro jovens de famílias tradicionais da região decidiram mostrar que o terroir poderia também fornecer excelentes vinhos de mesa. Eles criaram o coletivo Douro Boys e começaram uma pequena revolução na vinicultura do Douro, com vinhos que conquistaram prêmios em todo o mundo.
Vinte e dois anos depois, alguns “boys” poderiam ser chamados "sêniores", mas o nome perdura porque o grupo vem se renovando com a entrada de novos integrantes, na faixa de 30 anos. Quatro deles estarão em São Paulo, no próximo dia 24 de março, onde comandam, no restaurante Altruísta, um jantar harmonizado com seus vinhos.
São eles: Tomás Roquette, 55 anos, da Quinta do Crasto; Francisco Olazabal, 56, da Quinta Vale Meão; José Teles, 65, da Niepoort; e João Álvares Ribeiro, 39, da Quinta do Vallado.
O Brasil é hoje o maior importador de vinhos portugueses de mesa de várias regiões do país, movimentando € 80 milhões de euros, em 2023, segundo dados da ViniPortugal.
Os Douro Boys, apesar de atuarem juntos, mantêm suas empresas de forma independente, preservando a história e a personalidade de cada marca. No entanto, somados, eles vendem para mais de 100 países num total anual de 4 milhões de garrafas de DOC Douro e 1 milhão de garrafas de vinho do Porto.
Nesses anos, eles registraram um crescimento de 445% no faturamento, que chega a € 36 milhões anuais. Para isso, trabalham com mais de 215 produtores de uva e contam com quase 300 colaboradores.
Apesar do sucesso, uma das próximas missões do grupo será reposicionar a estratégia de comunicação. “O Douro é uma região vinícola muito única em Portugal e deveria ser tratado como a Borgonha, na França, pelos vinhos premium que produz", diz Tomás Roquette, em conversa com o NeoFeed. "Esse, sim, seria o posicionamento correto.”
José Telles, da Niepoort, lembra os custos de produção no Douro. A geografia montanhosa e a vinicultura em terraços exigem, em grande parte, a colheita manual — o que não ocorre em outras regiões, onde praticamente tudo é mecanizado.
"Não podemos competir com preços de outras regiões DOC [Denominação de Origem Controlada], onde se produz volume a custos muito mais baixos. Querer fazer um vinho no Douro a € 2,50 é um absurdo", diz ele.
Vale ressaltar que, para o consumidor brasileiro, os vinhos portugueses chegam por um preço muito mais elevado, dada a carga tributária. Para se ter ideia, há vinhos vendidos por € 6 (menos de R$ 40) em Portugal que custam R$ 200 aqui.
Entre os diversos rótulos das quatro empresas dos Douro Boys à venda no País, eles escolheram trazer vinhos de entrada e de alta gama para dar uma noção dos preços ao consumidor.
Niepoort: Dão Branco, R$ 189,90; Batuta,R$ 1.539,90. Quinta do Vallado: Quadrifólio Douro DOC, R$ 129,90; Quinta da Coroa DOC, R$ 1.259,90. Quinta do Vale Meão: Meandro White, R$ 313; Quinta do Vale Meão, R$ 2.251,96. Quinta do Crasto: Flor do Crasto, R$99; Maria Teresa R$ 3.899.
Tradicionalmente conhecido por vinhos mais encorpados, o Douro vive um momento de transformação sem perder sua identidade. É que existe uma tendência de consumo de vinhos menos alcoólicos, especialmente entre o público mais jovem.
“As empresas familiares têm necessidade de evoluírem e é completamente natural que as novas gerações queiram vinhos mais modernos”, diz João Alvares Ribeiro, o mais jovem do coletivo.
“Isso é uma discussão amigável que temos entre nós, porque, de fato, houve uma mudança para a procura de vinhos mais elegantes. Mas é preciso dizer que o Douro é sempre o Douro e acho que não conseguiríamos fazer vinhos muito diferentes, porque nossos vinhos tem características muito próprias”, pontua José Teles.
“É verdade, há pessoas que procuram essa alternativa dos vinhos mais leves”, acrescenta Tomás, "mas há muito aquele consumidor que ainda gosta de sentir um vinho mais intenso”, complementa.
Outra questão incontornável para eles é o crescimento do consumo dos brancos. Mas apenas 15% das vinhas no Douro são de uvas brancas, o que limita um pouco o crescimento da produção. Mesmo assim, nos últimos anos surgiram brancos na região de categoria superior, que estão entre os grandes vinhos do mundo.