O rotas perdeu o brasileiras, mas continua SP-Arte. A ser realizada entre 27 e 31 de agosto, no espaço ARCA, em São Paulo, a quarta edição da feira dedicada às especificidades e particularidades da produção de cada região do país mudou para estabelecer conexões para além de nossas fronteiras e “conversar” com nossos vizinhos.

“Nós todos aqui da América Latina nos relacionamos menos uns com os outros. Nossos laços são com a Europa, os Estados Unidos… Como em todo o Hemisfério Sul, as pessoas se projetam para o Norte”, diz a advogada Fernanda Feitosa, idealizadora e diretora da SP-Arte. “Fazer entre os iguais aqui embaixo parece que não é tão sexy.”

Neste primeiro ano de SP-Rotas, evento do qual o NeoFeed é parceiro de mídia, o “diálogo” entre nós e eles acontece sobretudo por meio da galeria Isla Flotante, de Buenos Aires, e o coletivo Xapiri Ground, de Cusco.

Os portenhos trazem para o galpão da Vila Leopoldina a intersecção entre o trabalho de Rosario Zorraquín, de 41 anos, e a obra da suíça naturalizada brasileira Mira Schendel (1919-1988). Já os peruanos apresentam aos brasileiros algumas das produções de Gerardo Petsaín Sharup. Descendente dos Wampís, ele cria a partir dos mitos de seu povo, originário da Amazônia peruana.

Outros nomes internacionais chegam à feira por meio do projeto Transe, com curadoria do pesquisador Lucas Albuquerque. Dos cinco participantes, dois vêm de fora. De família palestina, Emilia Estrada, de 36 anos, vive atualmente no Rio de Janeiro. Sua obra transita por temas relacionados a deslocamento, ancestralidade e construção histórica.

Em São Paulo, ela apresenta uma série de desenhos de observação da superfície lunar, realizados com carvão sobre linho, seda e veludo.

Aos 30 anos, o português Fernão Cruz assina um conjunto de esculturas, no qual explora o conceito de “caixa” como símbolo de deslocamento e contenção. Utilizando materiais como papelão, tecidos, objetos de brechós e elementos de construção civil, recolhidos durante residência artística na capital paulista, ele mescla suas experiências pessoais com as dos antigos donos de cada objeto recuperado.

Como costuma dizer Fernanda, o Rotas é um convite para a exploração de “novos caminhos”, para artistas ainda não consolidados nos circuitos tradicionais de arte. O paulistano Tito Terapia, de 48 anos, por exemplo.

Recentemente, ele começou a ser representado pela Galeria Galatea e leva para a feira um conjunto de pinturas de pequeno e médio portes, produzidas com pigmentos naturais recolhidos na zona leste da capital, onde vive e tem seu ateliê.

“As obras transitam entre gêneros caros à tradição pictórica figurativa, como a pintura de paisagem e a natureza morta, ao mesmo tempo em que evocam aspectos da chamada arte popular do século 20 no Brasil”, lê-se na apresentação da galeria. “O processo manual e o uso de materiais locais reforçam a conexão entre sua produção e o território, atribuindo às telas um sentido de pertencimento e resistência.”

“Nós todos aqui da América Latina nos relacionamos menos uns com os outros. Nossos laços são com a Europa, os Estados Unidos…", diz Fernanda Feitosa (Foto: Divulgação)

Entre os "novos" artistas brasileiros, está o paulistano Tito Terapia (Foto: Divulgação)

Integrante do projeto "Transe", a argentina Emilia Estrada traz uma série de desenhos de observação da superfície lunar (Foto: Divulgação)

Trazida pela galeria portenha Isla Flotante, Rosario Zorraquín propõe um diálogo com a obra da suíça naturalizada brasileira Mira Schendel (Foto: Divulgação)

O Rotas é muito diferente da SP-Arte, realizada desde 2005, em abril, no Parque Ibirapuera — internacional, agitada e competitiva, para onde as galerias levam seus artistas de renome. Mesmo assim, há espaço para os já consagrados como Cildo Meireles, Adriana Varejão, Tomie Ohtake, Tunga e Jaider Esbell, entre muitos outros.

Mas eles estão sempre em diálogo com o novo — seja pela idade, seja pelo reconhecimento do público geral e até de colecionadores e marchands.

No espaço Mirante, Amilcar de Castro, Leda Catunda e Beatriz Milhazes “dialogam” com representantes de gerações mais novas, como Paloma Bosquê. De 43 anos, nascida em Garça, no interior de São Paulo, ela trabalha sobretudo com esculturas, na investigação da materialidade e da transformação da matéria.

É esse tipo de “conversa”, tão rica, diversa e instigante, que Fernanda quer apresentar ao Brasil, à América Latina e ao mundo. Por isso, ela está sempre em busca de fortalecer a programação VIP da feira. Nesta edição, o número de convidados estrangeiros mais do que duplicou em relação a 2024 — 50 contra 15.

Assim, o Rotas vai se reafirmando como porta de entrada para quem está começando a se aventurar no fascinante universo dos colecionadores de arte. “Tem uma quantidade expressiva de trabalhos até R$ 50 mil”, conta ela.

A feira também se alinha à mudança de perfil do consumidor brasileiro de arte—diametralmente oposto ao colecionador acumulativo do passado.

“As pessoas hoje estão interessadas em narrativas, o que está por trás da obra”, avalia a diretora. “O material que o artista usa tem algum significado? Ele está inserido em alguma comunidade? Qual é a sua pauta?”

No Rotas, o que não faltam são histórias. Brasileiras e, agora, latino-americanas.