Em termos de qualidade, os vinhos paulistas têm demonstrado um grande amadurecimento por parte das vinícolas instaladas nas divisas de São Paulo tanto com Minas Gerais quanto com o Paraná.
Prêmios, como a medalha de ouro conquistada pela Vinícola Ferreira, da Serra da Mantiqueira, no Decanter World Wine Awards, de Londres em 2023, o “Oscar” dos vinhos, atestam a excelência dos vinicultores do interior do estado.
Mas vinho bom é para ser consumido e os rótulos paulistas são ainda pouco conhecidos. Para torná-los "objeto de desejo" dos bebedores mais sofisticados, o empresário Luiz Biagi e outros nove vinicultores acabam de fundar a Wines of São Paulo (WSP).
Vindo da indústria sucroenergética, ele foi um dos idealizadores do programa Proálcool, na década de 1970. Em 2020, decidiu fazer vinho. Reservou uma área de 20 hectares da Fazenda Cravinhos, antes dominada pela cana, e começou a cultivar uvas.
Em agosto, a Vinícola Biagi colhe sua segunda safra. Apesar de pequena, permite a produção de Moscato Giallo, Nebbiolo e Sangiovese, vendida na própria fazenda, localizada a 20 quilômetros de Ribeirão Preto, no nordeste de São Paulo.
“A WSP coroa a qualidade dos vinhos paulistas e cria uma plataforma de ideias para impulsionar a produção local”, conta o empresário Luiz Biagi, responsável pela fundação do grupo, em conversa com o NeoFeed. “A união fortalece os produtores já que estão todos na mesma plataforma.”
Competitividade e versatilidade
Para entrar na WSP, a vinícola deve ter sua qualidade reconhecida no mercado e possuir rótulos premiados.
Além da Ferreira e da Biagi, fazem parte do grupo Casa Verrone (em Itobi), Villa Santa Maria (São Bento do Sapucaí), Marchese di Ivrea (Ituverava), Arcano (Franca), Terras Altas (Bonfim), Guaspari (Espírito Santo do Pinhal), Davo (Ribeirão Branco) e Vinícola Refúgio (Bofete).
Juntos, esses produtores já amealharam uma centena de prêmios em concursos internacionais, como o Decanter, o Paris Wine Cup e o Sommeliers Choice Awards.
Durante muito tempo, a maior parte dos vinhos produzidos no interior paulista eram rótulos de mesa, feitos com uvas americanas.
Nas últimas duas décadas, porém, as tecnologias e os conhecimentos em torno de toda a cadeia produtiva avançaram muito. Com os progressos, a qualidade da terra melhorou e os vinhos ganharam qualidade.
Uma das inovações mais celebradas pelos produtores é a dupla poda. O método consiste na realização de dois cortes anuais, em vez de apenas um. Dessa forma, a colheita passa a acontecer durante o inverno, quando o tempo é mais seco e ameno.
A mudança no calendário tem facilitado o cultivo de variedades europeias. Uma das mais bem adaptadas às condições paulistas é a Syrah, de origem francesa.
De acordo com a Associação Nacional dos Produtores de Vinho de Inverno (Anprovin), o estado responde por quase 25% da produção nacional de dupla poda. Entre as afiliadas da WSP, esse índice é de 90%.
A Vinícola Ferreira é a única do grupo a manter o ciclo natural da uva. Para driblar as chuvas de verão, a plantação é coberta com lonas de plástico. Dá certo. A medalha de ouro conquistada em 2023 veio com o Piquant Soléil safra 2022, um tinto 100% de Syrah.
A mesma honraria já havia sido concedida à Guaspari, com o Guaspari Syrah Vista do Chá 2014, outro tinto feito inteiramente com a uva francesa. A vinícola do Espírito Santo do Pinhal, na divisa com Minas Gerais, é adepta da poda dupla.
Foco número 1: conquistar a capital
Para fazer com que os vinhos finos paulistas cheguem mais longe, a WSP pretende reforçar o relacionamento com os principais fornecedores da bebida. Em um primeiro momento, o foco é a capital paulista. Mais tarde, o Brasil.
A ideia é fazer com que os rótulos entrem nas cartas de vinhos de restaurantes e hotéis de luxo da cidade.
Desafio grande, visto que os importados costumam ser os preferidos dos consumidores mais sofisticados. Mas, Biagi não se intimida: “Trabalharemos para quebrar essas barreiras,”
Com a WSP, produtores também trabalham para reforçar a presença de suas vinícolas em feiras e eventos tanto nacionais quanto internacionais.
O grupo pretende reforçar também o enoturismo, fonte de caixa importantíssima para muitas vinícolas do interior paulista.
Na Guaspari, por exemplo, 65% do faturamento vem da venda direta ao consumidor, contando a loja física de sua sede.
Como cada região já tem a sua própria "rota do vinho", a meta é fortalecer ainda mais os roteiros e ampliar o número de visitantes.
Conversas com o poder público estão em andamento para promover o turismo em torno das vinícolas paulistas.
O trabalho da WSP passa, necessariamente, pela educação do consumidor. “Queremos mostrar aos bebedores a qualidade e o trabalho por trás dos vinhos de São Paulo”, explica Biagi.
Somadas, as dez vinícolas do grupo têm potencial de produzir até 1 milhão de garrafas por ano. Falta esse vinho todo chegar às taças dos paulistas. Feito isso, é ganhar o Brasil.