Comprada pelo grupo AR&CO em 2020, a empreendedora Luanna Toniolo Domakoski nem acreditava que encontraria pessoalmente Anderson Birman, o fundador da marca Arezzo. Tinha na ponta da língua todo o discurso do futuro da economia circular e do quanto sua empresa de second hand, a Troc, poderia ser sinérgica com as outras marcas, agora que fazia parte do grupo de moda.
“Eu tinha tanta expectativa por encontrar com o papa do varejo, e ele me perguntou assim: o que você vai fazer se uma cliente pegar micose comprando seus sapatos usados? Agora você também carrega a marca Arezzo, tem de cuidar disso”, lembra ela rindo ao NeoFeed.
Quase três anos depois desta conversa, Luanna inaugura na próxima semana primeira cápsula de desinfecção de peças, um sistema que "levou 18 meses para ser desenvolvido".
Na prática, o HigiTroc é uma sala de higienização e de esterilização, “sem sanitizante ou produto químico que elimina 99,9% dos microorganismos.” Além disso, o "processo não utiliza água ou gera resíduos", condição estabelecida por Luanna e que, por isso, levou mais tempo para ficar pronto.
“Assim, banimos qualquer preconceito do consumidor com relação as peças usadas, ainda mais depois da pandemia, e atraímos mais gente para a economia circular. Queria que o Anderson viesse visitar”, diz.
Mas mais que cumprir a exigência de Birman, Luanna está em busca de eficiência e de menor impacto. Até hoje, calcula ter economizado 1 bilhão de litros de água com a Troc, ao prolongar a vida útil de 400 mil peças.
Criado há seis anos, a Troc é um brechó premium com uma grande capacidade de atração e giro das peças, uma vez que vendia 60% do acervo por mês. Antes de ser comprada pelo grupo AR&CO, a empresa já havia chamado a atenção um ano antes de Rony Meisler, fundador do grupo Reserva.
Meisler tinha adquirido 8% do negócio, que ajudava como suporte de logística reversa para suas marcas. Ao comprar a Reserva no mesmo ano, o grupo AR&CO também absorveu o percentual da Troc, detendo 75% do brechó.
Atualmente, a Troc gira por ano “90% das 90 mil peças no portfólio”. Mas este volume deve chegar a 300 mil até o fim do ano, desde que mudaram em março para o novo centro de distribuição, com quatro vezes mais capacidade de armazenamento e processamento, uma estrutura de 3,5 mil m², em Quatro Barras (PR).
A expectativa é dobrar o resultado este ano, com investimentos em processos tecnológicos, uma consequente redução de custos e uma maior integração com as marcas do grupo.
Além das quatro mil de marcas de moda cadastradas, é a loja oficial de resale de coleções antigas da Arezzo, Schultz e Alexandre Birman. Também mantem parceira exclusiva com outras grifes como PatBo e Iorane, por exemplo.
“Todas as empresas de second hand são alavancadas, como a The Real Real, por exemplo. Nós não. Nossa missão, mais que ser o braço de economia circular do grupo, é dar resultado positivo.”
Para tanto, ela quer incrementar o tíquete médio hoje em R$ 450 com peças premium para R$ 3 mil, estruturando sua operação de luxo, onde as margens são bem mais atrativas. “Desde o início a gente recebia itens de grifes. Mas este ano estamos focados nesse segmento propondo uma gestão profissionalizada do processo para atrair mais buyers e sellers.”
Criou uma área especial de armazenagem das peças de luxo no seu centro de distribuição até com climatizador, sistema de autenticação (usam um app internacional de rastreamento) e um atendimento especial com serviço de concierge para lidar com este público.
Mas para concorrer com outros players do mercado que atuam neste segmento como Etiqueta Única, do grupo Iguatemi, Peguei Bode ou Gringa, ela está trabalhando com uma comissão bem mais atraente. “Ofereço 70% de comissão para peças a partir de R$ 1,5 mil. Na concorrência essa proposta começa em produtos a partir de R$ 10 mil.”
Sua meta este ano é chegar a cinco mil peças de luxo e que assim a divisão represente 20% do resultado. “Para os produtos de luxo, diminuímos um pouco nossa margem para crescer em volume.”
Como surgiu a Troc
Luanna tinha um escritório de direito tributário em Curitiba, quando decidiu fazer uma especialização em Harvard, mas desta vez em marketing. Quando voltou com o marido Henrique Domakoski da temporada tanto nos Estados Unidos, como de um curso de verão na Europa, chocaram a família ao dizer que iam abandonar suas carreiras para abrir uma “startup de economia circular” logo entendido como “brechó.”
“Eu sempre gostei de moda, mas me incomodava esse consumismo desenfreado. Moramos também um tempo na Finlândia e vimos o quanto a economia circular estava integrada a rotina das pessoas. Queria fazer minha parte nesse sentido.”
Para fazer a roda girar e com produtos premium de vestuário, desde o início, ela e o marido se dispuseram a eliminar todas as barreiras de adesão dos consumidores ao modelo. “Por isso, criamos uma parceria com transportadoras que coletam as peças nas casas das clientes. Assim, ninguém precisa ir ao Correio.”
Logo a sala de sua casa se tornou um depósito de sacolas, a tal ponto que precisou alugar o apartamento do lado, num prazo de poucos meses abriu um escritório e atraiu um investidor anjo. Em dez meses, chegou ao faturamento de R$ 1 milhão e mudou-se para um galpão de 500 m².
Desde o início também, digitalizaram todo o processo que já havia sido desenhado como linhas de produção, uma vez que a área do marido era inovação. “As peças chegam e passam pela pré-seleção, são cadastradas, etiquetadas com códigos de barras, fotografadas e higienizadas. Tudo de forma muito racional e ágil.”
Outra estratégia que estimulou o crescimento rápido da Troc foi a criação de lojinhas de influenciadoras, atraindo uma grande audiência. Hoje, tem 300 ativas. E a todo momento alguma celebridade os procura para uma sessão de desapego. No dia dessa entrevista, foi a atriz Paolla Oliveira que fechou negócio e fará uma live para suas 35,2 milhões de seguidoras para que até o fim do mês escolham ícones do seu guarda-roupa na Troc.