Imagine 33 milhões de caminhões de 40 toneladas carregados de comida, enfileirados um atrás do outro, em dez voltas em torno da Terra. Difícil, né? Pois essa é a quantidade de alimentos desperdiçada todos os anos: 1,3 bilhão de toneladas, o equivalente a um terço da produção global.

Se essa montanha de comida jogada no lixo fosse um país, estaria entre os 7% mais ricos, com um PIB em torno de US$ 1,5 trilhão. E, o terceiro no ranking dos grandes poluidores, com 11% das emissões de gases do efeito estufa, ficando atrás apenas da China e dos Estados Unidos.

Enquanto isso, 830 milhões de mulheres, homens e crianças passam fome. Uma em cada dez pessoas no mundo não tem o que comer.

Nem tudo, porém, é somente má notícia. Os inovadores dos ecossistemas agtech e foodtech estão trabalhando para resolver o problema. E, melhor ainda, as soluções apresentadas por eles vêm despertando mais e mais o interesse dos capitalistas de risco.

No ano passado, essas startups levantaram US$ 1,9 bilhão em financiamentos – o dobro dos cheques de 2020. Com essa injeção de capital, os aportes bateram em US$ 7 bilhões, desde 2011. De lá para cá, o valor médio dos negócios foi de US$ 2 milhões para US$ 17 milhões, informa a consultoria americana ReFED.

As perdas acontecem ao longo de toda a cadeia agroalimentar – da colheita às nossas mesas. Mas, o desperdício está concentrado no varejo, lares e restaurantes. São 931 milhões de toneladas postas fora todos os anos. E, desse grupo, os grandes esbanjadores somos nós, os consumidores. Do total de alimentos adquiridos, 61% têm os aterros sanitários como destino.

A comida que apodrece na geladeira e perde a validade na despensa é um entrave ao desenvolvimento sustentável. O desperdício está associado a quatro das maiores crises planetárias: da mudança climática, da degradação da natureza e da biodiversidade, da poluição e resíduos e da segurança alimentar.

Até recentemente, era dado como certo que o desperdício de alimentos acontecia sobretudo nos países ricos. O estudo “Índice de Desperdício de Alimentos 2021”, do Programa das Nações Unidas pelo Meio Ambiente (PNUMA), no entanto, derrubou essa convicção.

O problema é global e sua solução cabe às empresas, governos, ONGs e cidadãos, alertam os analistas da consultoria americana Boston Consulting Group (BCG), no relatório “Closing the Food Waste Gap”.

Fundada em São Paulo, por Luciano Kleiman, a B4waste ilustra à perfeição como soluções simples podem ter impactos gigantescos. Graças à tecnologia desenvolvida pela startup, o desperdício tem potencial não só ao planeta e às pessoas, mas também para os varejistas.

Aplicativo da B4wates

Pela plataforma da B4waste, os varejistas oferecem alimentos e produtos próximos do vencimento por, no mínimo, 50% do preço. “Oferecemos às pessoas a oportunidade de fazer economia ajudando o planeta”, diz Kleiman. “Ajudar o planeta é um esforço, mas aqui é um prazer.”

A base de clientes está em torno dos 44 mil, com um índice de recorrência de 3,5 compras por mês. E estão conectadas às B4waste cerca de 130 lojas, da Grande São Paulo, Grande Rio e Belo Horizonte. Em meados de dezembro, a rede Pão de Açúcar iniciou um projeto-piloto com a startup.

Em julho passado, a empresa levantou R$ 2 milhões, em uma rodada liderada pelo fundo argentino Glocal A previsão era fechar 2022 com R$ 5 milhões de faturamento. Em 18 meses de operação, a B4waste já evitou o desperdício de cerca de 600 toneladas de alimentos – o equivalente a 30 toneladas de metano, gás de efeito estufa mais danoso do que o CO2.

Conheça a seguir o trabalho de outras startups que movimentaram o setor em 2022.

-  Em setembro, a varejista online Misfits Market (US$ 2 bilhões de valuation) comprou sua principal concorrente, a Imperfect Foods (US$ 700 milhões). Americanas, as startups vendem hortifrutigranjeiros que são tradicionalmente considerados “feios” para exposição nas gôndolas dos supermercados. O valor da transação não foi revelado, mas a Misfits espera fechar 2022 com US$ 1 bilhão de receita.

- Há dois meses, a Apeel apresentou duas novas tecnologias que, por meio de inteligência artificial e visão computacional, indicam para produtores, varejistas e consumidores o tempo preciso de amadurecimento das frutas. Criada em 2012, na Califórnia, a empresa chegou ao mercado com um “revestimento” que mantém as frutas frescas por mais tempo. Em 2020, a Apeel levantou US$ 385 milhões e evitou o desperdício de quase 3 mil toneladas de alimentos.

- A californiana Afresh captou, em agosto, US$ 115 milhões em uma rodada B de investimentos, liderada pela Spark Capital. Fundada em 2017, a empresa desenvolveu um sistema de inteligência artificial para ajudar os varejistas a fazer o controle de compras e estoque de produtos frescos.  O último aporte elevou o financiamento total para US$ 148 milhões.

- Lançada em 2015, a LyteGro, da Inglaterra, desenvolveu um extrato orgânico a partir de resíduos da banana que acelera o crescimento de bactérias e leveduras. Os microorganismos têm ganhado cada vez mais importância na indústria alimentícia, graças aos avanços do mercado plant-based.