O valor nutricional e a sustentabilidade são importantes, mas, na busca por novos consumidores, a indústria plant-based tem de ir além das proteínas, vitaminas, sais minerais e pegada de carbono. Os alimentos vegetais devem oferecer as mesmas características sensoriais de suas contrapartes de origem animal. Um steak à base de soja e ervilha precisa ter sabor, aroma, textura e cor de um legítimo steak bovino. Do contrário, nada feito.

E esse é um dos principais desafios impostos ao ecossistema foodtech desde os primeiros estudos para o desenvolvimento de produtos vegetais análogos aos animais, em meados dos anos 2000. Com o amadurecimento do setor, é crescente o número de startups dedicadas a resolver esses importantes detalhes.

Uma delas é a argentina Michroma. Fundada em 2019, na cidade de Rosario, a foodtech produz corantes naturais, em especial os de tons avermelhados, em substituição aos sintéticos, obtidos, em geral, por via petroquímica ou a partir do alcatrão do carvão mineral. Recentemente, a startup levantou US$ 6,4 milhões, em uma rodada seed, liderada pela Supply Change Capital, fundo apoiado pela gigante alimentícia General Mills.

Entre outros investidores estão a americana Be8 Ventures e a coreana CJ CheilJedang. Com o novo cheque, o total captado pela startup argentina chega a cerca de US$ 7,5 milhões, segundo o Crunchbase.

Batizado de Red+, o corante em pó da Michroma é obtido a partir de edição gênica e fermentação de precisão, duas tecnologias que vêm expandindo as fronteira do futuro da alimentação. Os pesquisadores transformam fungos, que, na natureza, já produziam uma coloração avermelhada, em minifábricas de tinta - mais ou menos intensa, conforme o trecho de DNA editado.

O produto, segundo a empresa, é resistente às altas temperaturas e estável em todo o espectro de pH dos alimentos. Graças a essas características, o Red+ mantem a viabilidade, mesmo quando submetido à pasteurização, cozimento e extrusão – uma prova de resistência à qual os corantes naturais, disponíveis atualmente no mercado, normalmente não aguentam.

O valor maior da Michroma, no entanto, não é o corante em si, mas a plataforma criada para desenvolvê-lo. Os fundadores da foodtech, Ricky Cassini e Mauricio Braia, pretendem, a partir de agora, se lançar no universo de outras tonalidades.

Vão investir primeiro nas tonalidades mais quentes, o amarelo e o laranja, e depois para o azul e o branco. Com a mesma plataforma, Cassini e Braia querem evoluir para a produção de aromatizantes.

Pelos cálculos da consultoria Fact.MR, o mercado de corantes naturais, ao longo da próxima década, deve chegar a US$ 4,1 bilhões. Este ano, segundo os analistas, o movimento está previsto em US$ 2 bilhões.

O crescimento do setor vem atender à demanda dos novos consumidores. Ultraconectados, mais conscientes e exigentes, eles estão à procura de saúde e sustentabilidade. Querem passar longe de produtos altamente sintéticos, como os corantes RED 40 e Yellow 5, comuns na indústria alimentícia atual.

O cerco regulatório a produtos desse gênero está cada vez mais apertado. Na Europa, por exemplo, os fabricantes são obrigados a estampar em seus rótulos a presença do RED 40. Outras tintas alimentares sintéticas são vetadas pela União Europeia.

Por isso, soluções como a da Michroma são recebidas com entusiasmo pela indústria plant-based. Os grandes impulsionadores do setor são os flexitarianos, aquela turma que quer aumentar o consumo de verduras, legumes e frutas, sem abrir mão, de vez em quando, das proteínas de origem animal.

Mais atentos às características sensoriais dos novos alimentos do que os veganos e vegetarianos, eles tomar um copo de leite vegetal, por exemplo, e sentir gosto, cheiro, textura e cor de leite de verdade. Querem colocar um bife na churrasqueira e ouvir aquele barulhinho da carne fritando.

Um estudo conduzido em 2022, pela Kerry, multinacional irlandesa do ramo alimentício, com 1,5 mil pessoas no Brasil, Estados Unidos, Reino Unido e Austrália é revelador da exigência dos novos consumidores.

“Como eles [os flexitarianos] ainda comem carne e laticínios, suas expectativas de sabor, aroma, cor e textura em relação aos alimentos à base de plantas são impulsionadas por essas experiências”, diz Fiona Sweeney, diretora de marketing estratégico da Kerry. “Oferecer essas características, juntamente com nutrição aprimorada e credenciais de sustentabilidade, é a chave para o sucesso nesta categoria.”