O desafio está lançado. Como aumentar a produção agropecuária em, no mínimo, 56% para suprir as necessidades de uma população que, em 2050, deve chegar a 50 bilhões de pessoas? E como fazer isso sem degradar ainda mais o planeta?

É impensável seguir com as práticas atuais, defendem os especialistas, em uníssono. Faz-se urgente, portanto, buscar novas fontes de alimentos. E, os inovadores do ecossistema foodtech vêm trabalhando duro para descobri-las e, nos últimos anos, fizeram conquistas importantes.

Vejam os avanços da indústria plant-based com suas proteínas vegetais à imagem e semelhança de suas contrapartes animais. E o que dizer das carnes cultivadas em laboratório? Há, entretanto, mais uma alternativa surgindo: as microalgas.

Microscópicos, altamente proteicos, esses seres unicelulares são considerados pelas Organizações das Nações Unidas (ONU) o alimento mais completo do planeta. De crescimento rápido, são extremamente versáteis.

Podem ser cultivados em água doce e salgada; vão bem tanto em tanques quanto na beira do mar ou às margens de um rio. Proliferam na claridade, mas também crescem no escuro. Com as microalgas é possível produzir alimentos nas regiões mais inóspitas; inadequadas para a agricultura ou para a criação de animais.

Ou seja, esses microrganismos, cujo tamanho se mede em micrômetros, podem aliviar a pressão sobre os já exauridos solos agrícolas. As microalgas contam com a vantagem de ter valor nutricional alto e necessitarem de pouco espaço para o cultivo.

Uma das mais utilizadas pela indústria alimentícia, a spirulina, produz 40 vezes mais proteína por hectare quando comparada à soja, o principal ingrediente das empresas de alimentos vegetais. Com a vantagem de usar uma quantidade inferior de recursos naturais.

“Temos a oportunidade de cultivar alimentos nutritivos e podemos fazê-lo em ambientes onde não há competição por outros usos”, lê-se no artigo “Transforming the Future of Marine Aquaculture: A Circular Economy Approach”, assinado por Charles Greene, da Universidade Cornell, no periódico Oceanography.

Tem mais. Nas fazendas ao ar livre, as microalgas são inclusive mais resilientes às mudanças climáticas do que se imaginava, relatam pesquisadores dos Estados Unidos, Japão e Coréia do Sul em artigo publicado em dezembro, na revista científica Science Advances.

Em ambientes de escassez de nutrientes, há pouco fósforo, elemento químico sem o qual as plantas não conseguem produzir energia. Os cientistas descobriram que, na falta do mineral, as microalgas usam o enxofre para crescer. Ou seja, até os biofertilizantes estão dispensados.

Não à toa o mercado de microalgas para a indústria alimentícia dá sinais de aceleração. A empresa de biotecnologia Algenuity, da Inglaterra, está estudando o uso da Chlorella vulgaris. Essa espécie de microalga tem uma concentração elevada não apenas de proteínas, mas também de fibras, antioxidantes, vitaminas, minerais e ácidos graxos.

Para ser usada como ingrediente na formulação de alimentos e bebidas, é preciso descobrir uma forma de evitar que se seu alto teor de clorofila não deixe um gosto amargo na boca dos consumidores. Outro sinal inequívoco da efervescência do setor é o programa BlueInvest Readinesse Assistance, lançado em 2016 pela União Europeia.

O objetivo é impulsionar as empresas inovadoras que trabalham com microalgas. Mais recentemente, em dezembro do ano passado, os organismos aquáticos foram um dos temas mais concorridos da Food Ingredient Europe, uma feira realizada anualmente em Paris, que reúne empresas e cientistas para discutir o futuro da alimentação.

Há um longo caminho, porém, para que as microalgas sejam utilizadas em larga escala. É preciso aperfeiçoar as tecnologias de modo a fazer com que os alimentos e bebidas à base dos microorganismos não tenham o cheiro e o gosto de peixe.

Esse obstáculo explica o motivo pelo qual as foodtechs mais festejadas do setor são as empresas que trabalham com peixes e frutos do mar. Uma das líderes de mercado, a startup americana New Wave Foods usa microalgas para fabricar camarão vegetal e fechou o 2022 com um aporte de US$ 22 milhões em investimentos.

Na Triton Algae Innovations, também dos Estados Unidos, o organismo aquático serve de base para a fabricação de cortes de atum, que dispensam o atum de verdade. O mercado de microalgas ainda é pequeno, mas até 2027, deve avançar a um taxa de crescimento anual composta de 5,3%. Indo dos US$ 940 milhões, de 2020, para US$ 1,5 bilhão, nas estimativas da consultoria Research and Markets.

Para se ter ideia do impacto positivo das microalgas para a humanidade e o planeta, basta conhecer o trabalho da startup inglesa Brilliant Planet. A empresa dedica-se a criar fazendas de microalgas para a captura de carbono.

Ao fim do processo, seca-se o lodo. Em seguida, o material é enterrado ou pode ser encaminhado para indústrias dos mais diversos setores. No final de 2022, a startup recebeu um aporte de 11 milhões de euros.

O dinheiro será usado para ampliar a fazenda de microalgas construída há três anos, em pleno deserto do Saara. Tanques gigantescos com água do mar, ficam expostos ao sol, armazenando CO2 e acenando com a possibilidade de uma alimentação mais sustentável, nutritiva e inclusiva.