Apertem os cintos, porque o piloto sumiu – e a viagem finalmente já pode começar. Desde 2017, a Waymo, empresa de tecnologia do grupo Alphabet, detentor do Google, vem testando seu transporte autônomo na cidade de Phoenix, no Arizona, mas um motorista sempre esteve a bordo para acompanhar o trajeto por questões de segurança.

Em agosto deste ano, porém, o sistema da empresa começou a operar seus primeiros quilômetros sem supervisão presencial, num serviço que há poucos dias se estendeu a uma centena de usuários selecionados, que concordaram em não compartilhar com terceiros informações sobre a experiência. 

A expectativa da Waymo é que esse serviço esteja ao alcance de todos o mais rápido possível, mas o CEO da companhia, o americano John Krafcik, não se comprometeu com datas ou prazos. "Não posso dizer com precisão quando isso vai acontecer, mas estou realmente confiante que chegaremos lá", disse o executivo com exclusividade ao NeoFeed.

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Enquanto outras empresas se apropriam do rótulo de "piloto-automático", a Waymo é a companhia mais avançada no nível 4 de autonomia. "Na nossa percepção, esse nível de automação permite que qualquer pessoa sem habilitação embarque no carro, que vai do ponto A ao ponto B. Se você precisa de uma carteira de motorista, então não é certo chamar self-driving", afirma Krafcik. 

Sem citar o nome de nenhuma fabricante, a fala de Krafcik parece acertar em cheio os últimos discursos de Elon Musk, da Tesla, cujos veículos ditos autônomos pedem que um motorista habilitado esteja constantemente de prontidão ao volante, para assumir o comando a qualquer momento. A mesma regra vale para a tecnologia hoje aplicada pela Lexus, BMW, Audi e Mercedes.

Embora esteja liderando com alguma folga o nível 4 de automação, a Waymo não está sozinha – e o ambiente deve ficar mais concorrido nos próximos anos. A GM com sua Cruise é talvez a maior "ameaça" até o momento. A divisão self-driving da gigante da indústria automobilística pretende começar testar seus carros autônomos no final deste ano.

Na segunda-feira, 28 de outubro, a Volkswagen anunciou sua entrada nesta “corrida” com a subsidiária Autonomy. Trabalhando em parceria com a startup Argo AI, o grupo alemão quer comercializar veículos self-driving em alguns anos.

Além dessas, outras startups estão pedindo passagem. A unicórnio Zoox, por exemplo, quer fazer tudo dentro de casa: o carro em si e a tecnologia que o impulsiona, contrariando a estratégia da própria Waymo e da Apple, que optaram apenas por trabalhar no sistema.

Enquanto isso, a Drive.ai aposta no deep learning para diferenciar seu serviço e acelerar sua entrega de tecnologia de direção autônoma. A Nuro.ai, por sua vez, pretende ganhar as ruas com seu projeto em até quatro anos. Já a nuTonomy, que tem, na Inglaterra, parceria com a Land Rover e com a Jaguar, está avaliando a performance de sua tecnologia em Cingapura, Massachusetts, Michigan e Reino Unido.

Outras startups que oxigenam o setor são Pearl Auto, Nauto, Diversiti, Quanergy e Zendrive. Mas, ainda assim, os veículos equipados pela Waymo são os únicos que, pelo menos por enquanto, trafegam sem nenhum tipo de  supervisão.

John Krafcik, CEO da Waymo, defende que o principal compromisso da empresa é com a segurança

Dada a área de atuação da empresa e as terminologias usadas na comunicação dessa tecnologia, é comum que muita gente interprete mal as intenções da companhia liderada por Krafcik. "Em primeiro lugar, nós não somos o Google e tampouco somos uma empresa de automóveis. Somos uma companhia de tecnologia e estamos desenvolvendo o motorista mais experiente", explica. 

E esse "motorista autônomo" tem muitas aplicações. A mais conhecida delas é o serviço de carona em ambientes primariamente urbanos, fazendo frente a Uber e Lyft. Nele, o usuário pede seu carro pelo aplicativo, colocando ponto de partida e chegada dentro do perímetro mapeado, e um automóvel equipado com a tecnologia Waymo faz a viagem. Esse mercado deve chegar a valer US$ 218 bilhões até 2025, segundo a Markets and Markets. 

Outra aplicação seria no setor de delivery. O transporte de bens perecíveis ou não pode ser completado de forma autônoma pelo "motorista" Waymo, que trabalharia, novamente, em uma área previamente mapeada.

A AutoNation, empresa que atua com a venda e revenda de automóveis, dentro de algumas semanas começa a testar essa possibilidade para fazer a entrega de peças com carros automatizados pela Waymo.

Previamente, a empresa já contava com o serviço da Waymo para o transporte de clientes. De acordo com um levantamento da Allie Market Research, a projeção é de que, em 2023, o mercado de delivery esteja avaliado em US$ 16,61 bilhões.

Mas quando os assuntos são cifras, talvez a maior delas, sobretudo nos Estados Unidos, esteja no ramo de transporte de carga. Dados da American Trucking Associations avaliam em US$ 700 bilhões esse setor, que já faz parte dos planos da Waymo. "Esse mercado de cargas é realmente interessante para a empresa", confirma Krafcik, que revela ainda que o projeto dedicado a esse segmento é chamado internamente de "Husky".

O sistema de caminhão autônomo da Waymo já está em teste no Michigan, no Arizona e na Georgia, todos com um motorista de segurança a bordo. "As regras atuais não permitem que veículos pesados sejam operados sem um motorista ao volante", explica Krafcik. 

Paralelo a essas formas de monetização, a Waymo pode ainda lucrar com a venda do sensor a laser, o LIDAR, desenvolvido e patenteado pela empresa, conforme antecipamos nesta reportagem.

Essa ferramenta está ao alcance de todas as fabricantes que não tenham a intenção de competir com o serviço de "táxi-robô" oferecido pela gigante mais discreta do Vale do Silício. Os setores de segurança e agronegócios poderiam ser alguns dos beneficiados neste quesito.

Caminhões autônomos para frete de carga: a próxima grande jogada da Waymo

Por fim, Krafcik admite que licenciar sua tecnologia para outros players do setor automotivo também é outra alternativa possível de monetização, mas que o modelo de negócios variaria de acordo com cada negociação, podendo ou não levar o nome da Waymo. 

Com possibilidades quase infinitas de rentabilizar sua tecnologia bilionária, a companhia ainda bate na tecla de que sua principal missão é fazer do deslocamento urbano uma tarefa segura e democrática.

"No mundo todo, 1,35 milhão de pessoas morrem todos os anos em decorrência de acidentes automotivos. É o mesmo que dizer que um Airbus A320, com 150 passageiros, caísse todas as horas, todos os dias, o ano inteiro", continua. 

Ainda de acordo com o executivo, 50 milhões de machucados acontecem no trânsito anualmente, e duas a cada três pessoas, em algum momento de suas vidas, se envolvem em um acidente de carro causado por um motorista embriagado. "Uma questão central nesses incidentes todos é que, em 94% das vezes, erros humanos são a causa das tragédias", afirma. 

Já na questão da democracia do transporte urbano, Krafcik nos lembra que em países desenvolvidos, mais de 20% dos adultos sequer podem dirigir por problemas de visão ou dificuldades motoras.

Por essas e outras, a avaliação da Waymo é tão generosa: segundo aponta Brian Nowak, analista da Morgan Stanley, a empresa de tecnologia vale US$ 105 bilhões. A Tesla, por exemplo, é avaliada em US$ 56 bilhões.

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