Dados não curam, mas são parte do tratamento. Sob esse diagnóstico, alguns países já estão reforçando suas estratégias contra a Covid-19 com insights gerados a partir de informações estruturadas pela Palantir, a misteriosa empresa empresa de big data de Peter Thiel, um dos cofundadores do Paypal.
Avaliada em US$ 20 bilhões, a startup tem feito de sua atuação no Reino Unido um case internacional. Na terra da rainha, a Palantir disponibilizou uma versão aberta de sua plataforma Foundry para consolidar, em tempo real, dados distintos, publicados em diferentes formatos e sistemas.
Ao concentrar todas as informações em um único ambiente, o algoritmo criado pela Palantir permite que os responsáveis aprimorem a gestão da ocupação de hospitais, que são categorizados de acordo com variáveis como números de leitos, especialistas e vacância nas unidades intensivas de tratamento.
Os dados coletados também ajudam a entender a duração da permanência de cada paciente diagnosticado com a Covid-19, além de identificar populações mais vulneráveis.
Com a análise em tempo real dessa base de informações, o governo britânico tem mais dados para definir as estratégias de distribuição de materiais hospitalares, alocação das equipes de trabalho de primeiro atendimento e estoque de itens essenciais.
Outra atuação da Palantir no Reino Unido, na batalha contra a pandemia, tem sido ao lado da Faculty, uma startup britânica de inteligência artificial. Juntas, as empresas têm desenvolvido modelos de previsões computadorizadas acerca do surto do novo coronavírus que usam dados confidenciais dos pacientes.
Ferramentas da Microsoft, Google e Amazon também são usadas na construção dessa base de dados, mas essas gigantes têm menos envolvimento no projeto e pouco, ou nenhum, acesso a dados sensíveis. E privacidade parece ser o "calcanhar de Aquiles" da Palantir.
Nova York, a cidade americana mais afetada pelo novo coronavírus, também utiliza o algoritmo da Palantir. Na Big Apple, a startup de Thiel permite que os responsáveis encontrem com rapidez os leitos disponíveis, economizando o tempo de uma ligação ou do envio de e-mail.
Pelo menos uma dúzia de países segue caminho parecido - nome dos países não é revelado pela Palantir. E o Brasil pode entrar para essa lista. A companhia mantém uma operação no País, com base em São Paulo, onde atende seis clientes.
Questionada sobre a possibilidade de a empresa estender a atuação no País com a oferta de combate ao coronavírus, uma porta-voz da Palantir disse ao NeoFeed que a empresa "ficaria feliz em auxiliar o governo brasileiro, assim como faz com outros governos ao redor do mundo".
A mesma fonte confirmou que esse software é, em alguns casos, ofertado gratuitamente. Ela não especificou, no entanto, quais países foram isentos de cobrança. Tampouco se o Brasil seria um deles.
Torres gêmeas
Embora atue com empresas e organizações dos mais variados setores, do automotivo ao agrônomo, a Palantir tem dedicado seus esforços exclusivamente para solucionar a crise do novo coronavírus.
Até porque, de crise, a companhia entende bem, já que emergiu de uma. Sua fundação aconteceu na sequência do ataque às Torres Gêmeas, em Nova York, em 11 de setembro de 2001.
Diante das tensões governamentais provocadas pelo ato terrorista, Peter Thiel idealizou uma companhia capaz de consolidar e processar dados de forma a permitir que organizações públicas e privadas pudessem tomar decisões embasadas em fatos.
Desde então, as ferramentas da empresa têm abastecido diferentes áreas governamentais nos Estados Unidos, bem como em outros países. Um dos clientes mais polêmicos da companhia é o departamento americano de Imigração e Alfândega (ICE, na sigla em inglês). Diversos ativistas acusam a Palantir de auxiliar as autoridades americanas a encontrar e deportar imigrantes ilegais.
Outras hipóteses de abusos de privacidade por parte da companhia do Vale do Silício também foram levantadas pela mídia americana.
Um dos contratos ainda em vigor e à prova de escândalos é o acordo que a Palantir mantém com o Centro de Prevenção e Controle de Doenças (CDC). A agência de saúde americana conta com a inteligência da startup para concentrar dados públicos para estudar e mitigar crises no setor.
As conversas relativas à segurança ou não dos cigarros vaporizadores têm sido balizadas pelas informações agregadas pelo software da empresa de Thiel.
Há quem diga, porém, que a empresa possa fazer uso dos dados coletados – fato que é negado pela Palantir e seus clientes.
No caso da luta inglesa contra o coronavírus, por exemplo, o Reino Unido dedicou uma página na internet a explicar o trabalho, deixando claro o controle e segurança dos dados compartilhados com a companhia.
No site, o governo britânico afirma: "uma vez que a situação emergencial acabar, os dados serão ou destruídos ou devolvidos de acordo com a lei e com contratos estritos que estão em vigor entre o Serviço Nacional de Saúde (NHS) e seus parceiros".
Ainda assim, uma reportagem do jornal The Wall Street Journal sugere que a startup teve o "privilégio" de saber da pandemia com certa antecedência. E, com essas informações, pôde recolher todos os seus executivos e funcionários que estavam em viagem. A empresa insiste que apenas trabalha com dados públicos, e não confirmou a versão do jornal.
São suspeitas como essa que fizeram a Palantir se manter resistente em relação às ferramentas que mapeiam as localizações dos usuários para entender e prever as regiões mais afetadas pelo novo coronavírus. É um consenso geral que a empresa tente ao máximo ficar longe desse tema.
Porém, a gravidade da situação abriu margem para diálogos. A agência Bloomberg afirma que a Palantir tem conversado com alguns clientes e pode considerar entrar nessa seara.
É de se presumir, portanto, que todo esse assédio por produtos que podem ser decisivos para vencer essa crise da Covid-19 tenha aumentado a demanda da companhia, que conta com mais de US$ 2 bilhões em investimentos levantados em 25 rodadas.
Ao NeoFeed, porém, a porta-voz evitou comentar o tema e negou que os planos de IPO da empresa tenham sido alterados devido às circunstâncias, ressaltando que a Palantir nunca discutiu publicamente a possibilidade de abrir capital.
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