Em pouco mais de dois anos, a Arezzo&Co apertou o passo para avançar em sua estratégia de construir uma “casa de marcas” e ir além dos calçados femininos, sua origem. Nessa direção, além de projetos internos, o grupo investiu em aquisições de grifes como a Reserva, a Baw Clothing e a Carol Bassi.
Até aqui, o saldo dessa movimentação era um portfólio de 16 marcas. Agora, essa coleção está ganhando uma nova peça com uma aquisição que, curiosamente, traduz o primeiro movimento inorgânico da companhia no segmento por meio do qual ganhou fama.
A Arezzo acaba de anunciar a compra da marca de calçados femininos Vicenza por R$ 173 milhões. Parte do acordo será pago em dinheiro. A transação envolve ainda ações do grupo que serão emitidas na conclusão do negócio.
“Esse primeiro movimento em calçados tinha que ser hors concours”, diz Alexandre Birman, CEO da Arezzo&Co, ao NeoFeed. “Foi um garimpo feito com muita diligência para encaixar esse diamante na nossa coroa. E a Vicenza é a maior joia guardada no mercado brasileiro de calçados.”
Por trás de tantos elogios está um processo que começou a ser costurado há cerca de dois anos. Birman já tinha a Vicenza no radar há mais tempo, mas foi nessa época que ele decidiu convidar Rafaela, filha e braço direito de Ariovaldo Furlanetto, fundador da marca, para uma primeira conversa.
“Recebi um não da primeira vez e depois um talvez, até conseguir agora o sim”, conta ele. “Ela foi maturando a ideia com o pai, porque a Vicenza é uma empresa muito rentável, que cresce e tem caixa. O motivo não seria financeiro. Era preciso ter uma razão maior.”
Rafaela, por sua vez, elenca alguns aspectos que pesaram na decisão, além do fato das famílias por trás das duas empresas compartilharem a mesma história de “sapateiros”. “Eu me criei nesse meio e sempre tive a Arezzo como referência. E consegui enxergar a Vicenza dentro do grupo”, diz ela.
A Vicenza chamou a atenção da Arezzo&Co a partir de Igrejinha, cidade de pouco mais de 37 mil habitantes na região metropolitana de Porto Alegre. É no município, onde foi fundada há exatos 30 anos, que a marca tem uma fábrica e cerca de 200 funcionários, incorporados no acordo.
Com essa operação e sob a gestão de Rafaela e de seu pai, a Vicenza chegou longe. Hoje, por exemplo, cerca de 50% da receita bruta da empresa, que faturou R$ 80 milhões em 2022, vêm de exportações. No ano, a companhia apurou um Ebitda de aproximadamente R$ 13 milhões.
Um dos racionais do acordo é justamente a complementaridade geográfica com outra marca que já compõe o portfólio do grupo. A Vicenza tem mais presença na Europa e a Schutz vem registrando um bom crescimento nos Estados Unidos.
As duas marcas são destinadas a perfis diferentes de consumidoras. A Vicenza tem mais apelo junto a mulheres mais jovens e tem uma linguagem mais despojada. Enquanto a Schutz é mais sóbria e voltada a mulheres mais maduras. Há, porém, outras sinergias.
“No Brasil, o crescimento no espaço de multimarcas é um dos principais vetores do acordo”, observa Birman. A Schutz está em 1,4 mil lojas multimarcas e a Vicenza, em 700. A sobreposição entre as marcas é de apenas 115 lojas. “Temos uma oportunidade grande de vendas cruzadas”, afirma o empresário.
Salto na operação
Além dessa questão, a Arezzo&Co já tem desenhado os próximos passos para um salto da operação da Vicenza a partir do momento em que a grife for plugada em seu ecossistema.
Em uma abordagem já adotada com outras marcas da holding, áreas como criação, marketing e vendas seguirão separadas. Mas serão turbinadas com recursos do grupo. Nas palavras de Birman, tudo o que Vicenza conquistou até aqui, baseada mais no feeling, ganhará “mais ciência”.
Ao mesmo tempo, a Vicenza irá compartilhar parte da estrutura da Arezzo&Co. Isso acontecerá, por exemplo, na área de produção, onde uma das medidas será dar acesso aos fornecedores do grupo.
Outro atalho será o uso da malha logística da holding, o que envolverá, entre outros ativos, o novo centro de distribuição a ser inaugurado, em março, no Espírito Santo. Hoje, os produtos da Vicenza são expedidos diretamente da fábrica e a marca não conta com processos estruturados nessa ponta.
“Também vamos plugar o e-commerce da empresa, que ainda é pequeno, na nossa plataforma”, diz Birman. As vendas digitais respondem por cerca de 10% da receita da Vicenza. “E isso também passa por uma questão tributária fiscal. Hoje, a Vicenza não opera na melhor eficiência nesse quesito.”
Cerca de 50% do faturamento da vicenza está relacionado à exportação
O investimento em lojas físicas será mais uma vertente. O plano, porém, é mais modesto, dado que a prioridade na distribuição seguirá sendo as multimarcas. A projeção é abrir, no máximo, dez unidades próprias. Neste ano, um dos locais já definidos para receber a marca é a Rua Oscar Freire, em São Paulo.
Por último, mas não menos importante, as duas empresas vão trabalhar a quatro mãos para promover, ainda em 2023, a entrada da Vicenza na categoria de bolsas. Hoje, a grife está restrita a calçados, sandálias, botas, scarpins e afins.
A partir dessa diversificação, que tem sido um dos seus motes, a Arezzo&Co reportou uma receita de R$ 2,92 bilhões no acumulado de janeiro a setembro de 2022, o que representou um crescimento de 59,6% sobre igual período, um ano antes.
No mercado de capitais, as ações da companhia acumulam uma desvalorização de 1,04% em 2023. Já nos últimos doze meses, os papéis registram alta de 16,2%. A empresa está avaliada em R$ 8,53 bilhões.
Com essa mesma pegada de holding, de investimentos na ampliação para outras categorias e da reunião de diversas marcas sob o mesmo guarda-chuva, um dos principais paralelos da Arezzo&Co no mercado brasileiro de moda é o Grupo Soma.
Dono de marcas como Farm e Animale, o grupo deixou de ser mais ativo, no entanto, na frente de aquisições desde que anunciou a aquisição da Hering, em abril de 2021. No acordo, fechado por R$ 5,1 bilhões, a companhia venceu a concorrência justamente da Arezzo&Co.