O C6 Bank nasceu no fim de 2019 com um discurso de que seria 100% digital e com uma campanha que tinha mais cara de lifestyle do que de banco, mirando, sobretudo, o público de alta renda. A realidade, entretanto, se impôs e, nos últimos anos, o neobank criado por Marcelo Kalim se tornou mais pop entre os clientes com bolsos mais curtos. Agora, ao que parece, chegou a hora de tentar uma guinada para buscar os bolsos mais fundos.

Na primeira quinzena de junho, o banco vai abrir as suas primeiras “agências”. Mas não são agências bancárias. Chamados de carbon offices, os espaços serão mais parecidos com salas de espera de aeroportos. A ideia é passar conforto e segurança para o que o C6 busca nessa estratégia: estreitar o relacionamento com clientes de alta renda.

“Nós nos reorganizamos internamente para servir esses clientes que querem um atendimento humano-digital, ou seja, ele também quer um gerente de relacionamento e um especialista de investimento”, diz Felipe Wey, head de alta renda do C6 Bank, com exclusividade ao NeoFeed. “Identificamos uma porcentagem de clientes que gostam de conversar pessoalmente com o advisory.”

As primeiras “placas na rua” do C6 estarão em Porto Alegre, Rio de Janeiro, Brasília e Belo Horizonte. A ideia é testar esse modelo regional, com as particularidades de cada praça, para expandir nas demais capitais. E deixar a capital paulista de fora, onde fica a sede do banco, foi proposital. Afinal, o local é onde o cliente já conhece a marca.

Todos os espaços terão um gestor especializado e certificado em investimentos e 10 pessoas para o atendimento. Embora não confirme, o banco digital planeja ter, pelo menos, 10 carbon offices em 12 meses.

“Esse projeto para a alta renda era para começar em 2024 e foi antecipado. Foi a resposta da nossa estratégia com esse público, de atração de novos clientes. A velocidade de criar os escritórios, nesse caso, foi um desejo deles”, afirma Wey.

Há 10 meses, o C6 acelerou o seu projeto para a alta renda. O banco saiu a mercado contratando profissionais que já tinham algum tipo de relacionamento com esse público que recebe mais de R$ 15 mil por mês ou detém mais de R$ 100 mil em investimentos. O requisito era especialidade e experiência.

De acordo com relato de Wey, o C6 recebeu 6.000 candidaturas, o que deu tranquilidade para escolher as 400 pessoas que estão nesse projeto de alta renda.

Na estrutura do banco, esses 400 gerentes de conta, que são chamados de carbon partners, fazem par com um assessor de investimentos. Nesse ponto, o C6 já mira a nova resolução da Comissão de Valores Mobiliários (CVM), que mexe na atividade do agente autônomo de investimento e retira as barreiras nos contratos de casas e profissionais.

A estratégia para a alta renda do C6 tem muito do Itaú Personnalité - Wey, inclusive, é um ex-Itaú. Foram mais de duas décadas no banco da família Setubal até se juntar ao C6 em junho do ano passado após cumprir o gardening leave.

A começar pela origem do neobanco, que remete à tradicional instituição financeira. Kalim, quando foi montar o seu banco digital, fez um profundo estudo do atendimento e dos serviços prestados pelo Itaú, que é referência em alta renda.

O C6, que informa ter 25 milhões de clientes, afirma apenas que possui “milhares de pessoas” de alta renda na sua base. Com 5 milhões de contas com esse perfil no Brasil, segundo dados da Febraban, o banco digital também não informa qual é a porcentagem que pretende abocanhar desse mercado.

Um balanço ainda no vermelho

Neste momento, o C6 tem outro desafio, além de atrair os clientes: tornar o banco lucrativo. No balanço de 2022, o banco digital reportou um prejuízo de R$ 2,2 bilhões, um aumento substancial frente ao prejuízo de R$ 600 milhões do ano anterior.

Em um momento em que outros concorrentes já chegaram no breakeven, como Nubank e Inter, há um questionamento sobre quando o C6 alcançará esse mesmo nível - provavelmente até no headquarter do JP Morgan, que adquiriu 40% do banco digital brasileiro em 2021.

O C6 divulga o mínimo necessário dos seus dados, mas o que chamou a atenção no último ano foi o crescimento de quatro vezes nas provisões, para R$ 1,6 bilhão. Essa alta coincide com a agressividade na carteira de crédito, que atingiu R$ 29 bilhões no ano passado, pouco mais que o dobro do ano anterior.

O que o mercado mais questiona é a estratégia do C6 no crédito consignado, um negócio que teve início em agosto de 2020 com a aquisição do Banco Ficsa, que foi rebatizada de C6 Consig.

Esse segmento trouxe a primeira grande crise de imagem ao C6, que recebeu uma multa de pouco mais de R$ 7 milhões do Procon-SP por repassar empréstimos consignados sem autorização. O banco recorreu e o valor foi reduzido, mas o processo administrativo ainda não terminou.

No Reclame Aqui, o C6 Consig acumulava 16.174 reclamações de 30 de maio de 2020 a 29 de maio de 2022, sendo que mais de 98% foram respondidas. Nos últimos 12 meses, a nota da empresa é boa, alcançando 7,8 de 10.

Após a publicação da reportagem, o C6 encaminhou duas notas de esclarecimento:

.Do prejuízo de R$ 2,2 bilhões no ano passado, R$ 856 milhões referem-se a uma baixa de ativo fiscal diferido e não configuram prejuízo operacional. Esse movimento contábil não altera o índice de capital do banco. O resultado do primeiro e do segundo semestres são operacionalmente equivalentes. O banco vai atingir o breakeven no segundo semestre.

.A multa do Procon-SP foi reduzida para R$ 313 mil pelo próprio órgão de defesa do consumidor, conforme publicação de 24/01/2023, e está sendo contestada pelo C6 Consig em segunda instância do processo administrativo na entidade. A penalidade se referia a 12 reclamações de consumidores em um universo de 814 mil clientes. Nenhum cliente teve prejuízo. Apuramos todos os casos com reclamações, punimos condutas indevidas de correspondentes bancários e promovemos melhorias constantes na nossa operação.

*reportagem atualizada as 14h20 deixando ainda mais claro de que não se tratam de agências bancárias.