Ao longo dos últimos anos, na esteira das transformações dos meios de pagamento, a Mastercard foi adicionando um extenso leque de serviços e produtos ao seu portfólio para ir além dos cartões. Hoje, segundo a companhia, são mais de 150. E, com a mudança do mercado de meios de pagamento, a empresa resolveu explorar outras áreas, principalmente no Brasil.

Marcelo Tangioni, CEO da Mastercard no Brasil, revelou ao NeoFeed que um dos focos da companhia passará a ser no segmento de segurança digital. “O nosso modelo tradicional está, de certa forma, limitado a quem quer e pode emitir cartões”, diz Tangioni. “Temos muita oportunidade para diversificar nossa base de clientes e fontes de receita. Mas ainda estamos arranhando a superfície e, literalmente, na ponta do iceberg.”

Segunda maior operação da Mastercard no mundo, atrás apenas dos Estados Unidos, o Brasil já abriga boa parte desse novo arsenal. Baseada em recursos como inteligência artificial e machine learning, a Mastercard vem estendendo seu leque para áreas como serviços de dados, geração de insights, verificação de identidade e autenticidade de usuários, e prevenção a fraudes.

Na prática, a Mastercard, com valor de mercado superior a US$ 350 bilhões, deixa de ser uma incumbente para enfrentar rivais que nasceram e cresceram nesses diferentes segmentos em que planeja avançar. É o caso desse mercado de identificação digital.

Nele, a disputa envolve, entre outros nomes, as chamadas idtechs. Entre elas, a unico, que atraiu um aporte de US$ 100 milhões, há um ano, liderado pelo Goldman Sachs. Outro player é a idwall, que captou R$ 210 milhões em 2021 com fundos como Endurance, Península e OneVC.

“Essa gama de serviços nos permite falar com locadoras de automóveis, empresas aéreas, de alimentos, varejo e operadoras de telecom”, conta Tangioni. Com a previsão de movimentar US$ 1,3 bilhão no Brasil em 2023, alta de 13% sobre o ano passado, segundo a consultoria IDC, as soluções de segurança são uma das prioridades. E, nesse espaço, um setor ganha relevância para a empresa. "Vemos muita oportunidade no segmento de saúde, pelo fato dele estar muito exposto no que diz respeito a dados”, afirma.

Tangioni não revela números nem nomes de clientes que compõem essa nova carteira. Mas ressalta que a participação desses serviços no resultado total da operação brasileira está à frente da média registrada globalmente.

No primeiro trimestre de 2023, esse portfólio, reunido na vertente de “value-added services”, apurou uma receita líquida global de US$ 2,09 bilhões. O montante representou um salto de 19% sobre igual período, um ano antes, e uma fatia de 36,6% da receita total de US$ 5,7 bilhões.

No País, a lista de companhias que usam esses serviços envolve operações como Raízen, Habib's, Localiza e Latam. Como prova da sua relevância no mapa da empresa, a operação brasileira é a ponta de lança da principal estratégia para turbinar esses números: os acordos com parceiros especializados em cada setor – fornecedores de software, por exemplo – são como um atalho para ampliar seu alcance.

“Como esse universo é mais amplo, temos uma certa limitação na distribuição. Nesse sentido, nós assinamos sete parcerias nos últimos doze meses", diz Tangioni. Um desses acordos foi firmado com a Sempre Safe, consultoria de cibersegurança.

Sócio da RD Inteligência, consultoria especializada em serviços financeiros, Fabrício Winter destaca que, nesse movimento, a competição da Mastercard não está restrita aos novos rivais em diferentes segmentos. Ela também inclui velhas conhecidas.

“A Visa, por exemplo, também tem apostado muito em credenciais, em identificação e em transferir seu conhecimento e tecnologia para outras trilhas de pagamento”, afirma. E prossegue. “Está cada vez mais claro que apostar apenas nos cartões tradicionais é uma grande ameaça”, observa.

Mas ainda é um grande filão para as bandeiras. Dados do Banco Central mostram que a Mastercard fechou 2022 com 122,7 milhões de cartões de crédito em sua bandeira e um volume de 2,5 bilhões de transações nessa modalidade. Para efeito de comparação, a Visa, segunda colocada, registrou 67,4 milhões de cartões e 1,5 bilhão de transações.

“Apesar de ainda relevante e rentável, por conta do volume transacionado, esse mercado certamente vai entrar em declínio e isso exige que as bandeiras busquem, desde já, ocupar novos espaços”, afirma Winter.

Tangioni recorre à sua própria trajetória na empresa para mostrar como esse direcionamento, sob o lema “Beyond Cards”, ganhou corpo. Quando ele chegou à Mastercard, a companhia era basicamente “monoproduto”. Vinte e um anos depois, esse portfólio tem mais de 150 ofertas.

“Muitas dessas ferramentas foram desenvolvidas dentro de casa”, pontua. Em contrapartida, a empresa não economizou quando identificou que o caminho mais viável era ir ao mercado. “Nos últimos anos, investimos US$ 5 bilhões em aquisições.”

A mais recente envolveu a americana Dynamic Yeld, dona de uma plataforma para personalizar a experiência do cliente em segmentos como varejo, turismo e food services. A companhia pertencia ao McDonald’s e sua aquisição foi concluída no primeiro trimestre deste ano, por US$ 325 milhões.