Mais enxuta, rentável e capaz de brigar de igual para igual contra as gigantes de telecomunicações dos Estados Unidos e China, à frente da consolidação na Europa. É assim que a Telefónica projeta o próprio futuro daqui a alguns anos.

Para isso, a companhia quer vender ativos que não considera estratégicos e reduzir significativamente os gastos de manutenção. O plano prevê uma economia total de € 2,3 bilhões até 2028, dos quais cerca de € 1,5 bilhão virão de cortes em custos operacionais recorrentes (Opex). Até 2030, a redução de gastos projetada é da ordem de € 3 bilhões.

A projeção é de que parte dessa redução de custos virá tanto de eventuais cortes de despesas com pessoal, conduzidos em acordo com os sindicatos, quanto da venda de ativos considerados “não-core”. Parte dessa estratégia já está em curso na América Latina, onde a Telefónica confirmou a intenção de vender todas as suas operações nos países de língua espanhola.

A empresa, que historicamente exerceu um papel relevante na região, já deixou o Equador e o Uruguai e está em fase avançada para sair da Colômbia, onde vendeu sua participação na subsidiária Coltel à Millicom. Agora, a Telefónica busca compradores para suas operações no México, Chile e Venezuela.

Sua diretoria, no entanto, descartou estipular prazos para a venda das atividades. “Definir uma data atrapalharia as negociações”, afirmou Marc Murtra, CEO da Telefónica, em coletiva de imprensa.

A Telefónica informou que parte do plano de economia de € 3 bilhões até 2030 também envolve suas operações no Brasil, com a venda da infraestrutura de fios de cobre. A empresa projeta arrecadar cerca de R$ 3 bilhões até 2028 com essa operação, que faz parte do processo de desligamento total da antiga rede de cobre no país e migração completa para fibra óptica.

As iniciativas, segundo a diretoria da Telefónica, devem contribuir para a redução do nível de endividamento de 2,9 vezes para 2,5 vezes o Ebitda.

“[Essa venda] gera tanto economias pontuais, de uma só vez, quanto economias recorrentes”, disse Emilio Gayo, COO da Telefónica. Segundo ele, a redução de custos será impulsionada por novas arquiteturas de rede, mais abertas e virtualizadas, que permitem economias por menor uso de equipamentos e melhor gestão de fornecedores.

Apesar da menor presença prevista na América Latina e desinvestimentos no Brasil, a Telefónica ainda vê o mercado brasileiro como altamente estratégico, no qual pretende manter o foco ao lado de suas operações na Espanha, Reino Unido e Alemanha.

“Uma das nossas grandes fortalezas é que operamos em quatro grandes mercados”, disse Murtra. “O conjunto desses países soma 400 milhões de habitantes e um mercado de telecomunicações de 170 bilhões de euros por ano.”

Ainda que mantenha o Brasil como um dos mercados estratégicos da companhia, Murtra não esconde que o foco maior será o mercado europeu, onde enxerga as principais oportunidades de consolidação. “Tem que ser uma operadora europeia de referência mundial, com escala rentável”, disse o CEO, mais de uma vez durante a apresentação do plano plurianual.

Foco na Europa

O continente conta com 38 operadoras de telefonia, número que faz a companhia acreditar que o setor passará por um movimento de consolidação na região, assim como ocorreu em outros mercados. No Brasil, por exemplo, são apenas três operadoras dominantes — TIM, Claro e Vivo.

Tamanha fragmentação do mercado europeu, diz Murtra, leva a investimentos duplicados ou repetidos dezenas de vezes, desperdiçando capital e atrasando a adoção tecnológica.

“Nos Estados Unidos há três operadoras, que investem 11,3 bilhões de euros por ano cada uma, o que lhes dá capacidade de investimento profunda e visão de longo prazo. Já cada operadora europeia investe cerca de 700 milhões de euros, o que faz com que muitos investimentos se repitam 38 vezes.”

Como resultado dessa fragmentação, a Europa ficou uma geração atrás em inovação tecnológica. Segundo o executivo, enquanto nos Estados Unidos a cobertura do 5G puro (standalone) já alcança cerca de 24%, e na China o investimento em redes avança em ritmo acelerado, no continente europeu o índice é de apenas 2%.

Por isso, a Telefónica entende que será necessário estar na dianteira desse movimento de consolidação, acompanhando de perto as mudanças regulatórias na Europa e avaliando possíveis operações de fusões e aquisições (M&A) na região ao longo dos próximos anos.

A companhia não descarta, mas afirma que uma eventual captação de recursos — por meio de emissão de ações ou ampliação de capital — só ocorreria em casos de operações transformacionais, capazes de alterar de forma significativa a estrutura e os resultados do grupo. A meta principal, no entanto, é reduzir o nível de endividamento e manter o selo de investment grade, afastando-se dos limites que poderiam colocar o rating em risco.

“Não vamos perder o investment grade sob hipótese alguma. O plano, como está estruturado, está totalmente financiado”, disse Murtra.

No terceiro trimestre de 2023, a Telefónica reportou lucro líquido de € 271 milhões, uma queda de cerca de 46% em relação ao mesmo período do ano passado. O resultado foi impactado por efeitos cambiais, custos de reestruturação e ajustes contábeis ligados à venda de ativos na América Latina.

No desempenho operacional, a receita cresceu 0,4% e o Ebitda avançou 1,2% em termos orgânicos, sustentados principalmente pelas operações no Brasil e na Espanha. A dívida líquida ficou em € 28,2 bilhões, equivalente a 2,87 vezes o Ebitda.