Desde que o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, aplicou o tarifaço de 50% sobre as exportações brasileiras, em agosto, a expectativa era de que o impacto recairia diretamente sobre as empresas que precisam enviar seus produtos para o mercado americano.
Mas o que pouca gente se deu conta é que o reflexo negativo dessa guerra comercial global também está afetando companhias que dependem do volume de importações para o Brasil. Uma delas é a Ageo Terminais, líder do mercado de granéis líquidos no Porto de Santos, com 54% de participação no maior terminal da América Latina.
Mas o impacto para a empresa não está necessariamente na receita, que este ano deve fechar em R$ 700 milhões, e sim nos prazos dos contratos de clientes, que caíram de forma significativa.
Do total do faturamento da Ageo, 90% vêm dos produtos importados pela Ageo, como combustíveis (diesel e gasolina) e produtos químicos. E, nesse recorte, mais de metade vem dos Estados Unidos.
A questão é que, com a nova configuração dada no cenário global a partir das tarifas aplicadas por Trump, as negociações comerciais mudaram de patamar e de preço. Os acordos fechados pela Casa Branca, após a primeira leva de tarifas, beneficiaram, de certa forma, os produtores americanos. E aí, o Brasil, como comprador, precisa pagar mais.
Com isso, clientes da Ageo passaram a ter mais prudência na celebração de contratos para a movimentação das cargas que embarcam e desembarcam de Santos. Acordos antes assinados com duração de cinco anos têm passado para três. E os de um ano, caído para quatro a seis meses, em média.
“Se os Estados Unidos têm um acordo com a União Europeia, por exemplo, o fluxo passa a ser interessante atender determinado país do que nós. E, para comprar, as empresas brasileiras precisam pagar o mesmo valor ou até mais. E isso pode não fechar a conta”, diz Aquiles Dias, diretor comercial e de novos negócios da Ageo Terminais, ao NeoFeed.
“Por isso, os nossos clientes, e, indiretamente a própria Ageo, têm esse desafio de projetar como se darão esses fluxos, uma vez que, anteriormente a isso, havia um ambiente mais consolidado. Hoje, essa cesta de ofertas está em função dos acordos tarifários”, explica o executivo.
No caso dos 10% restantes que correspondem à exportação, o maior volume que sai do País é de etanol. E os principais destinos são China e Oriente Médio. Neste caso, Estados Unidos correspondem a menos de 20% do total, semelhante ao volume total de cargas que saem do Porto de Santos rumo aos portos americanos.
Isso significa que, apesar do crescimento da companhia em 2025, sem as medidas impostas por Trump o cenário poderia ser melhor para a empresa, justamente por um mercado mais claro e previsível para os clientes da empresa.
“Se o País não tivesse sido dragado por essa situação, o comportamento poderia ter sido outro. Quando o empresário não sabe o que pode acontecer, toma medidas mais seguras. E faz contratos mais curtos”, afirma.
Diversificação do negócio
E foi justamente com esse olhar de diversificação de negócios e para minimizar impactos na receita com o tarifaço americano que o Grupo EBT (Empresa Brasileira de Terminais e Armazéns Gerais), controlador da Ageo, realizou um acordo vinculante com o Grupo Simões para aquisição do Terminal Portuário de Novo Remanso (TPNR), que fica em Itacoatiara (AM) e que opera o Terminal de Granéis Sólidos Agrícolas (TGSA), no Rio Amazonas.
“A gente realizou estudos para entender em quais segmentos seria possível diversificar. Nós queríamos seguir como uma empresa de infraestrutura no setor portuário. E entendemos que o melhor caminho seria o de grãos, pela necessidade perene no mercado global”, afirma.
Nesse sentido, a empresa enxergou que a região no Brasil que mais necessita deste tipo de infraestrutura é justamente a do Arco Norte (que compreende os estados do Amapá, Amazonas, Pará, Rondônia e Maranhão), e onde está o TGSA.
Com a transação, o Grupo Simões passa a ter 20% de participação no Grupo EBT. A empresa não revela os valores. A conclusão do negócio, que deve ocorrer em 2026, depende da aprovação do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade). De qualquer forma, a Ageo já assumiu o controle da empresa.
A chegada do terminal da Amazônia deve garantir uma receita extra de pelo menos R$ 100 milhões para a companhia, elevando o faturamento para R$ 800 milhões. A capacidade atual do terminal amazonense é entre 5 milhões e 6 milhões de toneladas. E, em cinco anos, o objetivo é duplicar essa participação.
E já há a previsão de ampliar a atuação no terminal na Amazônia. A ideia é construir, em 2030, um novo terminal de líquidos e outro de carga geral. Segundo o diretor da Ageo, o novo empreendimento não irá competir diretamente com a operação em Santos.
“São regiões completamente distintas. No caso do TGSA, vai atender basicamente o mercado daquela região, que não estava no radar da Ageo. O volume que vai para Santos não vai para Manaus”, afirma Dias.