Em 2022, o PicPay deu início a uma “virada de chave” em suas operações. Em linha com o praticado por outras fintechs, a companhia controlada pelo grupo J&F Investimentos se viu obrigada a trocar a queima de caixa (que gerava forte crescimento, mas que resultava em prejuízo) por uma estratégia que priorizava a rentabilidade.

Apesar de ter desacelerado a expansão, a companhia começou a registrar resultados mais sustentáveis. O breakeven alcançado no quarto trimestre de 2022 deu início a uma sequência de resultados positivos trimestrais ao longo de 2023, culminando no primeiro resultado positivo anual em 11 anos de história.

Em 2023, a companhia atingiu lucro líquido de R$ 37 milhões, revertendo prejuízo de R$ 693 milhões em 2022, segundo o balanço divulgado na quarta-feira, 27 de março. “Foi um ano de consolidação de resultados para o PicPay”, diz Eduardo Chedid, CEO da companhia, ao NeoFeed.

Os ajustes focados em rentabilidade, que envolveram redução de despesas, otimização de preços e diminuição dos custos de funding – que caiu de 105% ao final de 2022 para 87% no fim de 2023 –, também fizeram com que o Ebitda alcançasse R$ 115 milhões ao final do ano passado, revertendo a perda de R$ 603 milhões apurada em 2022.

Agora, o PicPay entende que chegou o momento de voltar a olhar para o crescimento com os ganhos de rentabilidade consolidados. Para isso, a empresa vê oportunidades de crescimento em diversas linhas de receita que ganharam força no ano passado. Em especial, duas frentes: em crédito e serviços financeiros para pessoa física e na oferta de produtos e serviços para a pessoa jurídica.

Mesmo com os ajustes em busca de rentabilidade, Chedid diz que o PicPay continuou trabalhando para expandir a plataforma de produtos da companhia para pessoas físicas. Segundo ele, a fintech dedicou esforços ao longo do primeiro semestre a construir uma série de produtos, em meio à migração da base de clientes do Banco Original, com foco em produtos financeiros, especialmente crédito, com cartões, consignado e empréstimos pessoais.

O PicPay também trabalhou para agregar outras frentes de produtos. A companhia expandiu o portfólio de investimentos, com novos fundos, produtos de renda fixa, CDB a prazo e de seguros. No total, a empresa acelerou o desenvolvimento de mais de 20 produtos e funcionalidades em 2023, numa estratégia que também envolveu M&As, como foi no caso do crédito consignado, com a compra da BX Blue, em fevereiro do ano passado.

“Passamos de uma plataforma que era, basicamente, de distribuição de produtos de terceiros para uma plataforma com estratégia híbrida, com alguns produtos em que seletivamente vamos fazer os nossos próprios, como cartão, empréstimos pessoais e consignado”, diz Chedid.

O executivo diz que boa parte deles começou a rodar ao longo do ano passado e já começaram a produzir efeito. Os resultados do PicPay mostram que o volume total de pagamento (TPV, na sigla em inglês) do PicPay Card cresceu 13% em 2023, para R$ 24 bilhões, enquanto a originação de empréstimos expandiu 57%, para R$ 2,2 bilhões.

No caso de cartões, a companhia diz que tem emitido cerca de 1 milhão de plásticos por mês, e que em antecipação de FGTS tem registrado um volume médio de R$ 250 milhões por mês em originação.

“Nossa estratégia para 2024 em diante é alavancar cada vez mais os produtos de crédito, ter uma combinação saudável entre produtos colateralizados e clean”, diz André Cazotto, diretor de relações com investidores, M&A e estratégia do PicPay, destacando que os 69% dos empréstimos concedidos em 2023 foram com garantia. A expectativa é de que continue representando uma parcela maior do total de empréstimos em 2024.

Em direção às empresas

No caso da parte de produtos para pessoas jurídicas, Cazotto diz que a ideia é que ela fique cada vez mais relevante dentro do PicPay. No ano passado, a empresa registrou um TPV de R$ 29 bilhões com adquirência, um aumento de 283% em relação a 2022.

A expectativa é seguir crescendo, com o lançamento de novos produtos, caso das maquininhas e de Transferência Eletrônica de Fundos (TEF), que começam a ser comercializadas em larga escala neste ano, além da ampliação dos serviços bancários, com conta digital e antecipação de recebíveis.

“Da mesma forma que crescemos produtos para pessoas físicas, imaginamos que vamos conseguir ser um player bastante significativo para pessoas jurídicas, nascendo com um negócio de adquirência que representa quase 1% do mercado, de acordo com a Abecs [Associação Brasileira das Empresas de Cartões de Crédito e Serviços]”, diz Cazotto.

Fora essas duas frentes, o PicPay vê no PicPay Ads, vertical de publicidade voltada para a plataforma, como mais uma fonte de receita. Depois de mais de seis meses de testes, o serviço está começando a veicular propaganda no aplicativo, já contando com mais de 20 empresas, como Samsung e Swift.

O PicPay atribui ao esforço de diversificação do portfólio, junto com esforço de cross-sell, à obtenção de uma receita recorde no ano passado, de R$ 3,5 bilhões, alta de 22%, ainda que boa parte do desempenho ainda dependa do uso da carteira digital. O TPV total aumentou 38%, para R$ 271 bilhões, sendo que o TPV da carteira digital somou R$ 236 bilhões, alta de 42%.

Com a casa em ordem e novas avenidas de crescimento começando a funcionar, surge o questionamento se o PicPay não pensa em retomar os planos para abrir o capital, movimento que tentou em 2021, mas abandonou em função das duras condições do mercado.

Sobre o tema, Chedid diz que o IPO nunca saiu do plano, mas que depende de uma série de fatores além dos ajustes nas operações e nas finanças. “Nunca tiramos da nossa lousa como uma das coisas que gostaríamos de fazer, e fizemos tudo o que precisávamos fazer internamente. Mas também precisamos ver o mercado, o melhor momento, e com um valuation adequado”, diz o CEO.