Em 2002, Carlos Gerdau Johannpeter, membro da quinta geração da família Gerdau, deixou a gigante de siderurgia, onde esteve por 24 anos, para seguir uma carreira solo. Desde então, além dos negócios em áreas como o real estate, ele encontra tempo para se dedicar a outra faceta: a de investidor.
Ao longo desse tempo, construiu um portfólio com cinco startups. Agora, o investimento mais recente do empresário de 63 anos atende pelo nome de Biosens. Em fase pré-operacional, a deep tech gaúcha investe em biossensores para fazer a leitura eletrônica de diagnósticos a partir de uma gota de sangue.
Com uma fatia minoritária e um aporte não revelados, Caco, como é conhecido, é o mais novo sócio da startup, que, a partir desse reforço em seu captable, já tem outra captação em curso, como parte do plano de chegar oficialmente ao mercado neste ano.
“Não gosto de negócios medianos, de pequeno impacto. Estamos falando de uma tecnologia proprietária, na fronteira da ciência, e pronta para entrar na rua”, diz Caco, ao NeoFeed. “E com um potencial de escala para alcançar centenas de milhões de pessoas.”
O próximo passo dessa jornada inclui uma nova rodada de R$ 600 mil. Com dez cotas, parte delas já comprometida, e conclusão prevista entre fevereiro e março, a captação envolve uma fatia de 2% e avalia a Biosens em R$ 30 milhões.
Com origem em pesquisas iniciadas em 2016, na Unisinos, a Biosens se tornou empresa em 2020. Nesse intervalo, a startup desenvolveu todo o processo para a leitura dos diagnósticos, desde as tiras para a coleta do material até o dispositivo e o sistema para processar e armazenar os resultados.
O modelo é semelhante aos testes de glicemia, mas com outras aplicações. O primeiro exame a ser lançado mede o tempo de coagulação sanguínea e tem diferentes finalidades – da definição da dosagem de anticoagulantes até situações de traumas graves e emergências.
Entre os clientes potenciais estão hospitais, farmácias, clínicas, laboratórios e o próprio paciente. Outra vantagem é o tempo: esse primeiro teste traz o resultado em, no máximo, três minutos, contra o prazo mínimo de 2,5 horas no formato tradicional.
“É um modelo descentralizado, mais rápido e com o viés de alcançar grandes populações e um capex infinitamente menor”, diz Caco. “Nesse primeiro produto, a demanda anual estimada é de 90 milhões de testes.”
Após construir esse modelo com R$ 6,5 milhões via subvenções para pesquisas, a Biosen busca a nova rodada para financiar a estruturação do negócio. A startup já tem um acordo com a Bhyo Supply, que será a parceira na produção e na distribuição dos testes em todo o País.
Com outros quatro testes em desenvolvimento, a previsão é de que o primeiro deles, o de coagulação, chegue ao mercado no fim de 2024. Como parte desse cronograma, a empresa vai dar entrada ao processo de homologação na Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa).
No médio prazo, as ambições vão além desse portfólio. A ideia é investir na oferta do histórico de cada paciente e, em outra via, de uma plataforma de gestão da saúde pública, a partir da base total de amostragens coletadas.
“Nosso dispositivo entrega o resultado na hora, mas o resultado fica armazenado na nuvem”, explica Willyan Hasenkamp, cofundador da Biosens. “O plano é oferecer uma ferramenta de apoio à decisão médica, com o uso de inteligência artificial para analisar esses dados.”
Outro plano envolve a expansão além do Brasil. Antes disso, porém, a startup foi buscar na figura de Caco Gerdau e de outros sócios que o empresário está trazendo para o seu captable um atalho para abrir portas no mercado local.
“O Caco vem da indústria, da área comercial, áreas em que estamos prestes a entrar”, diz Susana Kakuta, cofundadora da Biosens. “Agora, precisamos de sócios que não busquem o retorno imediato. Nosso negócio tem uma cauda longa de desenvolvimento, mas um mercado enorme à frente.”
Segundo o trio, hoje, esse mercado movimenta globalmente US$ 47,8 bilhões, sendo que o Brasil representa cerca de 2% desse total. No País, as concorrentes são a suíça Roche e a americana Abbott. Mas o modelo da startup remete a outros exemplos.
O primeiro é a também brasileira Hilab, com uma proposta semelhante, mas para outras tipologias de exames. A outra – e nada positiva – referência no setor, no entanto, é a agora extinta startup americana Theranos.
Criada em 2004, a Theranos prometeu entregar dezenas de exames a partir de uma gota de sangue e viu sua fundadora, Elizabeth Holmes, ser alçada ao status de estrela do Vale do Silício. Em 2022, porém, ela foi condenada a mais de 11 anos de prisão acusada de fraudar investidores.
“Entre outras questões, nossa diferença é o pé no chão, a honestidade intelectual. É avançar passo a passo e sem promessas fantasiosas”, afirma Caco, que prefere citar outros pares.
Um deles é a Vital Biosciences, healthtech canadense que, em julho de 2023, captou US$ 48 milhões junto a investidores como Sam Altman, CEO da OpenAI, e Marc Benioff, fundador e CEO da Salesforce. “A tese é muito semelhante à Biosens. Estou em boa companhia”, brinca Caco.
Economia real
A Biosens não está sozinha no portfólio do empresário. Esse leque inclui outras cinco startups. Assim como a deep tech, boa parte delas ainda está em fase pré-operacional ou em estágio inicial e Caco prefere não dar tanta visibilidade a elas neste momento.
Entre elas, Caco Gerdau investiu na Domus Nanotech, de nanotecnologia, e na AI Mining, cuja proposta é fazer a análise de potencial mineral a partir de dados processados com inteligência artificial.
“Valorizo negócios que não sejam óbvios, com saltos tecnológicos ligados à ciência, processos industriais, energia, saúde e meio ambiente. E que mirem uma escala relevante”, diz Caco. “E tenho um viés natural para a economia real, na contramão desse hype, que já foi maior, da economia virtual.”
O tamanho dos cheques pode variar de R$ 100 mil a R$ 5 milhões, em troca de fatias entre 5% e 10% na largada, com a opção de chegar a 30% a 50% em rodadas subsequentes, atrelada a metas e entregas definidas desde o início dessas relações.
Ele diz estar “namorando” oito empresas, em diferentes estágios de conversas, sendo duas delas já bem avançadas. Os projetos incluem negócios ligados a área de minérios estratégicos, terras raras e reciclagem.
Um dos aquários para pescar essas oportunidades está ligado aos seus negócios tradicionais. Trata-se do Pradotech, parque tecnológico que abriga a Casa das Startups e integra o bairro-cidade que o empresário está erguendo em Gravataí (RS).
Na conexão entre o empresário e o investidor, Johannpeter costuma reservar entre seis e oito horas por dia aos seus negócios tradicionais. E de quatro a seis horas para esse portfólio de startups. O que não significa que essa vertente tem um peso menor em suas prioridades.
“Não tenho a pretensão de comandar nenhuma dessas empresas, mas gosto de participar ativamente no desenvolvimento de cada uma delas”, explica. “Por isso, prefiro ter poucos e bons negócios. Não dá para ter esse nível de envolvimento com 50 investidas.”