Se durante a campanha eleitoral o então candidato à Casa Branca, Donald Trump, colocou a China como principal alvo comercial, como presidente, ele tem adotado um tom mais “amigável”. O próprio Trump afirmou que sua última conversa com o líder chinês, Xi Jinping, foi positiva e declarou que “preferiria” evitar imposições de tarifas ao país asiático, manifestando esperança em chegar a um acordo.
Esse novo tom de Trump com a China é um indicativo, segundo Luis Stuhlberger, sócio-fundador da Verde Asset, com R$ 19 bilhões sob gestão, de que Trump “afinou” diante da China.
“Os quatro principais mandatos de Trump são desregulação, anti-woke, imigração e tarifas. Acho que, nas três primeiras, ele segue a linha prometida na campanha. Mas, claramente, ele está repensando sua agenda tarifária. Isso foi uma grande surpresa, pelo menos para o que o mercado estava precificando”, disse Stuhlberger, durante um evento promovido pelo UBS. “Claramente, ele afinou para a China. Pode demorar, mas deve sair um acordo.”
Stuhlberger acredita que Trump tem usado as ameaças tarifárias como instrumento de negociação e alerta que o mercado não deveria reagir impulsivamente às publicações do presidente nas redes sociais. “Não queira operar olhando para os posts dele. Curiosamente, o Trump está postando essas coisas mais para o fim do dia. Não sei se ele foi aconselhado sobre o impacto que isso tem no mercado.”
O gestor também considera possível que Trump opte por igualar as tarifas aplicadas a outros países antes de ampliar as cobranças sobre produtos chineses. Apesar de avaliar que a economia chinesa está “ferida” devido ao alto endividamento dos setores público e privado, ele acredita que a China tem capacidade para impor retaliações significativas à economia americana.
“A China não é uma potência capaz de ameaçar a hegemonia americana, mas pode criar muitos problemas na cadeia de suprimentos dos Estados Unidos.”
Entre os itens em negociação, segundo Stuhlberger, estaria a venda das operações americanas do TikTok e, principalmente, de seus algoritmos.
“É o que Donald Trump mais quer. Tirar o TikTok seria impopular, mas a China teria que abrir mão do algoritmo. Isso é muito relevante, considerando que o Partido Republicano é muito mais eficiente em redes sociais do que os democratas. Para Trump, isso é crucial.”
A segunda prioridade de Trump, na visão do gestor, seria encerrar a guerra entre Ucrânia e Rússia, que tem custado bilhões aos cofres americanos. “O fim da guerra resultaria em uma queda significativa no preço do petróleo, jogando a inflação para baixo”, afirmou. “Sem isso, dificilmente haverá tarifas amplas envolvendo questões de segurança nacional.”
Stuhlberger projeta que Trump pode iniciar os esforços tarifários por países como Canadá e México, que têm menor poder de negociação em comparação com a China. “Trump é como o cara que entra em um bar à noite e procura o mais fraco para brigar. Ele não vai enfrentar o lutador de jiu-jitsu. Esse fica para depois.”
Apesar disso, o gestor não acredita em uma elevação expressiva das tarifas, devido aos potenciais efeitos inflacionários e ao fato de que muitas empresas americanas dependem da fabricação em países como o México. “Duvido que cheguem a 25%, porque a tarifa, de certa forma, é um tiro no pé. No final, você teria mais inflação e juros mais altos.”
Pessimista com o Brasil
Embora o embate entre Estados Unidos e China seja estratégico e impacte a economia global, Stuhlberger também expressa preocupação com os desafios internos do Brasil.
Pessimista com os rumos da economia brasileira, ele não acredita em uma mudança significativa na política fiscal, que avalia como o maior erro dos primeiros anos do atual governo. ”O governo turbinou a economia com essa expansão de gastos. Quando crescemos acima do potencial, a inflação aparece. Essa história é como um piquenique à beira do vulcão.”
Para Stuhlberger, as variáveis macroeconômicas são preocupantes devido à deterioração da dívida pública. “Nunca estivemos tão próximos de uma situação como a atual. Na crise da Dilma [Rousseff], a dívida era 60% do PIB. Vamos encerrar este governo com 85%.”
Apesar do cenário desafiador, o gestor destacou a transição de comando no Banco Central como uma surpresa positiva. “Foi muito bem feita. Jamais imaginei isso em setembro do ano passado.”
No entanto, Stuhlberger não considera o assunto encerrado, avaliando que a independência do Banco Central será testada quando a atividade econômica desacelerar e o tema se tornar político. “Pelo menos nos próximos meses, teremos alguma tranquilidade com o Banco Central.”