A economia brasileira vai desacelerar no segundo semestre, aposta o mercado financeiro que prevê expansão anual entre 2% e 2,5%. Variação menor que 3,4% alcançada em 2024, mas que não chega a ser um tombo e ainda deverá ser amparada por iniciativas do governo para sustentar a demanda e, por consequência, elevar a popularidade do presidente Lula.
Em curso ou em vias de confirmação e implementação, o inventário de medidas é extenso e impõe viés de alta às projeções de crescimento: crédito consignado privado, linha especial de crédito para entregadores e para reforma de casas, expansão do Minha Casa, Minha Vida e dos programas Pé-de-Meia e Gás para Todos, liberação de saldo do FGTS, antecipação do 13º salário de aposentados e pensionistas do INSS, isenção ampliada de tarifa da conta de luz para 60 milhões de brasileiros de baixa renda e isenção de IR para quem ganha até R$ 5 mil.
Quantificar o efeito conjunto dessas medidas é tarefa em construção entre economistas. Mas é generalizada a percepção de que – a depender do esforço empreendido pelo governo e que não é pequeno – a atividade não deverá ceder o bastante para aliviar a inflação, dando um refresco ao Banco Central na gestão da taxa de juro.
E numa semana atulhada de indicadores internacionais e locais de relevância, o resultado do PIB do primeiro trimestre, a ser divulgado pelo IBGE na sexta-feira, 30 de maio, poderá dar corda a um debate presente entre credenciados economistas sobre a potência da política monetária para frear a atividade e levar a inflação à meta.
Para o PIB trimestral, as projeções oscilam entre 1,5% e 1,8% ante o período anterior, variações próximas às apontadas pelo Índice de Atividade Econômica do Banco Central (IBC-Br) de 1,3% e pelo Monitor do PIB do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (Ibre FGV) de 1,6%. Ambos publicados na segunda-feira, 19 de maio. Os dados surpreenderam e colocaram em banho-maria avaliações mais conservadoras sobre os próximos meses.
É inegável, porém, que há um elevado grau de incerteza adiante por ao menos três questões que só o tempo vai responder: qual será o impacto das tarifas de Trump sobre o crescimento mundial e a inflação; qual será o efeito consolidado de estímulos à demanda em gestação no governo; e qual será o “saldo” efetivo da restrição monetária imposta pelo BC. Em oito meses, a Selic subiu 4,25 pontos percentuais, de 10,50% a 14,75%, e, ainda assim, a inflação exibe resistência olímpica.
Sem refresco à vista graças à atividade firme, Gabriel Galípolo reitera – dia sim e no outro também – o compromisso do BC com a meta. E repetiu a dose em evento do Goldman Sachs no início da semana. Alertou que, dada a dinâmica da economia, “faz sentido manter o juro em patamar restritivo por período prolongado”. Corte de juro, nem pensar, indicou.
A declaração reduziu apostas em novos aumentos da Selic. Entretanto, apesar do sinal de que o aperto continua, investidores procuram antecipar o momento de queda do juro que tende a favorecer algumas aplicações e a maximizar ganhos. Disposição que enfraquece o trabalho do BC.
Renda abranda condições financeiras
Sinal de que o aperto monetário está mais frouxo, o Índice de Condições Financeiras da G5 Partners acumula um alívio expressivo no ano, relata ao NeoFeed, o economista-chefe Luis Otávio Leal.
Ele explica que após registrar, no fim de 2024, as condições mais restritivas desde 2008, o indicador recuou. Em quatro meses, exemplifica, o juro estimado para o final de 2025 passou de 17% para 14,75%.
“Outras variáveis, como dólar no Brasil, no exterior e juros americanos entram na conta, mas correção de 2,25 pontos percentuais é substancial e o BC tenta conter esse movimento para que a política monetária produza o efeito desejado que é trazer a inflação à meta”, observa.
Para o economista, a forte expansão da atividade no primeiro trimestre, mesmo descontando agricultura, não significa perda de potência da política monetária – associada no passado à prática de juros subsidiados sobretudo pelo BNDES. Mas é fato que a política monetária tem hoje, em contraponto, a política fiscal que expande a renda e, portanto, a demanda.
“A política monetária potente se traduz, para as famílias, no encarecimento do crédito. Mas se os programas do governo elevam a renda, o ‘bolso’ do tomador fica maior e as parcelas a pagar cabem nesse ‘bolso’, ainda que os juros tenham subido”, explica.
No campo das empresas, diz Leal, os efeitos da política monetária são atenuados por uma mudança estrutural – o avanço do mercado de capitais que virou opção ao sistema bancário tradicional. Mas isso não quer dizer que as empresas que escapam do juro estão isentas de custos.
“Os custos estão sendo cobertos pela demanda de bens e serviços, uma compensação que pode não se prolongar se a economia esfriar”, diz Leal para quem há um risco real de quebradeira de empresas. “As recuperações judiciais crescem, mesmo após o recorde de 2024.”
O economista da G5 Partners reconhece que parte da surpresa com o fôlego da atividade também se deve ao contraste com a elevada taxa de juro que, em outro cenário, poderia abrandar a expansão. O economista calcula que o desempenho observado pode ser resultado, portanto, de três hipóteses – com aumento da renda sendo denominador comum.
As hipóteses listadas por Leal são o “transbordamento” da atividade agrícola que envolve colheita, transporte, logística e aumenta a renda no setor; a elevação de 7% do salário mínimo e benefícios do INSS e BPC que contemplam mais da metade da população brasileira que converte, quase de imediato, dinheiro em consumo; e o consignado privado, em andamento, que libera renda na troca de dívida cara por mais barata e que terá impacto mais efetivo a partir do segundo trimestre. Na real, o BC continuará sem refresco.