O PIX, sistema de pagamento instantâneo do Banco Central, lançado em novembro de 2020, surgiu como uma ameaça para diversas empresas pelo potencial de substituir algumas formas de pagamentos e o dinheiro físico.
Em seu primeiro ano de operação, o PIX teve mais de 348 milhões de chaves cadastradas e mais de 1,6 bilhão de transações, superando as realizadas por boletos, TEDs, DOCs e cheques somados. As transferências movimentaram quase R$ 4 trilhões.
Com a adoção do PIX, a gaúcha Saque e Pague, dona de uma rede de autoatendimento para saque de dinheiro, pagamento de contas e recarga de celulares com quase 2,5 mil terminais espalhados por 450 cidades no Brasil, foi uma das empresas que estiveram sob ameaça de “morrer”.
“Existia uma grande preocupação com o PIX e o impacto que ele poderia gerar no nosso negócio”, diz Givanildo Luz, CEO da Saque e Pague, ao NeoFeed. “Mas optamos por olhar para o copo meio cheio e, em vez de sofrer com a plataforma, resolvemos tirar proveito dela.”
Em julho do ano passado, a Saque e Pague lançou o QR Saque, uma solução que permite retirar dinheiro nos caixas eletrônicos da empresa através da plataforma do PIX e sem a necessidade de cartão. No ano passado, a companhia fez 200 mil transações em seus caixas eletrônicas com o QR Saque.
Mais do que usar o PIX como um aliado, a Saque e Pague passou, da noite para o dia, a atender os correntistas das mais de 700 instituições financeiras do Brasil, que agora podem usar os terminas da companhia para sacar dinheiro usando apenas o aplicativo de seu internet banking. Antes, eram apenas 34.
“A grande maioria dos saques, agora, é de bancos que não tínhamos parcerias. O Nubank é o principal e na sequência vem os cinco grandes bancos”, diz Luz, referindo-se ao Itaú, Bradesco, Santander, Banco do Brasil e Caixa, que são donos da TecBan, a principal concorrente da Saque e Pague.
Agora, a companhia está colocando no mercado uma solução que permite o depósito nos terminais de autoatendimento através do PIX. E isso não é tudo. A Saque e Pague já se prepara também para usar o sistema de pagamento instantâneo do Banco Central para pagamentos de boletos e para o fornecimento de crédito aos clientes.
Em 2022, a estimativa é que as transações com o PIX via seus caixas eletrônicos, que movimentam atualmente R$ 4 bilhões por mês, cheguem a 4 milhões. A Saque e Pague é remunerada por cada transação que acontece via seus terminais. “O PIX vai ser bem relevante, mas estamos criando a base em 2022”, afirma Luz. “A mudança do ponteiro vai acontecer a partir de 2023.”
Mas usar os caixas eletrônicos via a solução do PIX será suficiente para que a Saque e Pague se adapte as mudanças de hábitos do consumidor? “É uma forma de aproveitar o ativo dos caixas eletrônicos, que é um negócio caro”, diz Fabricio Winter, sócio da consultoria Boanerges & Cia. “Agora, esse não é um diferencial sustentável, pois é facilmente replicável pela TecBan ou por outros varejistas.”
Ao mesmo tempo em que aposta no PIX, a Saque e Pague está testando terminais menores para levar sua solução para cidades com até 30 mil habitantes, que representam aproximadamente 80% dos municípios brasileiros. Hoje, sua rede está concentrada em cidades médias e grandes no Brasil.
No ano passado, a Saque e Pague fez um MVP (minimum viable product) com o uso de maquininhas usadas pelo comércio para receber pagamentos via cartão de débito e crédito em Juquiá, cidade do Vale do Ribeira, no sul do estado de São Paulo. “Vamos dar suporte a todas as transações dos caixas eletrônicos via esses terminais”, afirma Luz.
A maquininha ficará instalada dentro do comércio e será operada pelos funcionários dos estabelecimentos parceiros. O objetivo é começar a implantar esses terminais em outras cidades ao longo de 2022 em parceria com varejistas, que vão ganhar uma receita a cada transação.
Mas há desafios para esse modelo. Um deles é como o lojista vai identificar o dinheiro falso. Outro é se o negócio é de fato atrativo para os comerciantes. “Tem de levar em conta que o dono do estabelecimento quer fila de gente comprando, não para saque de dinheiro ou pagando conta”, afirma Winter, da Boanerges & Cia.
A Saque e Pague prioriza a instalação de seus caixas eletrônicos em postos de combustíveis, supermercados, padarias e farmácias, que pagam para ter o terminal da empresa. Em troca, ganham pelas transações que são realizadas no caixa eletrônico.
Luz diz também que um efeito do equipamento aos lojistas é levar mais gente para o estabelecimento comercial. “Nossos números mostram que de 20% a 30% dos clientes que usam o caixa eletrônico compram alguma coisa na loja”, afirma o CEO da Saque e Pague.
A aposta do PIX não é a única da empresa em 2022. A companhia vai também começar a operar na Colômbia até meados deste ano. De acordo com Luz, os detalhes de uma parceria com um banco parceiro estão quase concluídos e a meta é chegar com 80 terminais de autoatendimento no país. A Saque e Pague está no México desde 2018, onde conta com 600 pontos.
Enquanto a Saque e Pague aposta no PIX, a TecBan, que tem mais de 24 mil caixas eletrônicos espalhados pelo país, está investindo no open banking. A companhia, dona do Banco24horas, fechou, no ano passado, uma parceria de compartilhamento de dados cadastrais e de transações de clientes entre instituições com a fintech Klavi. “É uma forma de a Tecban melhorar seu canal de captação, mirando as fintechs”, diz Winter, da Boanerges & Cia.
Fundada em 2014 como um spin-off da Getnet, a Saque e Pague tem como sócio principal o empresário gaúcho Ernesto Correa da Silva Filho, que também é dono do banco Topázio, de uma rede hoteleira com 40 unidades, entre outros negócios na área de agricultura.
No mesmo ano em que fundou a Saque e Pague, Correa e Silva vendeu a Getnet para o Santander por R$ 1,1 bilhão. Em 2015, a Stefanini, a empresa de serviços de tecnologia do empresário Marco Stefanini, comprou 40% da companhia.
No ano passado, a Saque e Pague faturou R$ 190 milhões, segundo dados ainda não auditados. Neste ano, a estimativa é que a receita chegue a R$ 240 milhões.