Em meados de 2021, o Banco BS2 decidiu dar uma guinada em seu modelo de negócio. Com o mercado de bancos digitais congestionado em pessoas físicas, a instituição financeira da família Pentagna Guimarães decidiu concentrar sua atuação na parte de pessoas jurídicas.
Apesar de ser uma área menos "congestionada", não faltavam competidores que brigavam pelos clientes pessoas jurídicas. Bancos como Inter, C6 e Original e até o Nubank passaram a explorar esse nicho. Fintechs como Cora, Linker e Conta Simples receberam aportes milionários para escalar nessa área.
Mesmo assim, o banco seguiu adiante. Vendeu uma série de ativos que não conversavam com a nova operação, transferiu a carteira de 700 mil clientes pessoa física para o Next, do Bradesco, e cindiu a operação de adquirência Adiq, que passou a ser uma companhia separada, parte da holding controladora do banco, a BHF.
Passado todo esse processo, os resultados do “novo” BS2 começam a aparecer. Se, em 2020, quando atuava no mercado de PF, o prejuízo foi de R$ 30 milhões, em 2022, a instituição financeira alcançou um lucro líquido de R$ 52,8 milhões, um crescimento de 214% em relação a 2021.
A receita total cresceu 30%, para R$ 920 milhões. A base de clientes cresceu 82%, para 109 mil, enquanto o patrimônio líquido avançou 4,7%, a R$ 653,9 milhões. O total de ativos recuou 3,5%, para R$ 5,3 bilhões.
“Em 2022, comprovamos a tese de que havia bastante espaço no segmento PJ para novos entrantes”, diz Marcos Magalhães, CEO do Banco BS2, ao NeoFeed. “Nosso planejamento era de um resultado menor do que obtivemos, mas conseguimos superar bastante o que estabelecemos como objetivo para o ano”.
Para conseguir esses resultados, o BS2 decidiu focar sua atuação no ano passado em companhias do chamado middle market, cujo faturamento anual varia de R$ 30 milhões até R$ 700 milhões. Estas são, na visão do banco, as empresas mais resilientes, o que permitiu crescer a carteira de crédito de forma segura e controlada.
O plano inicial era que a carteira de crédito do middle market fechasse 2022 em R$ 1 bilhão. Mas o banco conseguiu alcançar R$ 1,2 bilhão. Considerando os outros segmentos de clientes, e sem mais os números da Adiq, a carteira de crédito alcançou R$ 1,4 bilhão, um aumento de 60% em base anual.
Um dos fatores que ajudaram neste crescimento foi a expansão operacional. O banco abriu escritórios em outras praças, como Curitiba, no Paraná, e Caxias do Sul, no Rio Grande do Sul, e reforçou as operações de middle market em São Paulo e Belo Horizonte.
Para este ano, o banco pretende abrir um escritório no Centro-Oeste, em Campo Grande ou Goiânia, para ter uma maior exposição ao agronegócio.
Rumo a novos serviços
Com a tese de investir no mundo PJ consolidada, o BS2 planeja também atrair pequenas e médias companhias com a oferta de serviços para esse público. “Fizemos uma primeira onda de crescimento por este caminho (do middle market) para garantir musculatura e chegar a uma massa crítica de portfólio”, diz Magalhães.
O planejamento estratégico do BS2 prevê avançar em serviços de câmbio, meios de pagamentos e seguros. O objetivo é fazer um esforço na parte comercial, com reforço de equipe e incentivo ao cross selling de produtos.
“A ideia foi sempre ter ofertas complementares, em que o cliente entre pelo crédito, mas utilize a plataforma de pagamentos, utilize o serviço de câmbio”, diz Davi Ponciano, CFO do banco.
O BS2 entende que investir nestas áreas vai garantir uma fonte de receita mais recorrente, menos relacionada a contexto de inflação e recessão. “Nosso objetivo de longo prazo é que, do total de receita, de 55% a 60% sejam oriundos de serviços”, diz Magalhães.
No ano passado, o banco começou a registrar bons resultados nesta frente de serviços. Nas operações de câmbio, o BS2 atingiu um volume de R$ 30,1 bilhões em operações, crescimento superior a 30% em relação a 2021.
A expectativa para este é manter o ritmo de crescimento entre 20% e 30% em termos de volume. Para isso, o banco está expandindo a equipe. Magalhães não informou quantas pessoas pretende contratar, considerando que a área atua com equipe própria e parcerias, essa última parte um legado das origens do banco, que chegou a operar com consignado e correspondentes bancários.
No caso de pagamentos, o crescimento está sendo puxado pelo avanço do Pix no mercado. O banco, que desenvolveu uma plataforma proprietária para o serviço de pagamento instantâneo, quer avançar na oferta de serviços de banking as a service, disponibilizando APIs para se interligarem de empresas clientes.
Em novembro do ano passado, a instituição financeira informou que alcançou a marca de 9,61% das operações de Pix do Brasil transacionadas por pessoa jurídica.
Já a frente de seguros é ainda recente. O BS2 passou a operar nesta área em junho de 2022, após receber as aprovações regulatórias. Fundada em parceria com o grupo sul-africano Traficc, a seguradora vai atuar no mercado B2B2C nos ramos de vida e elementares.
O plano é escalar a área via cross selling. Atualmente, entre 50% e 70% das apólices de crédito para as empresas nascem com o seguro atrelado, como seguros de vida aos proprietários das companhias.
A expectativa é de que essas frentes ajudem o BS2 a fechar 2023 com uma receita na casa de R$ 1 bilhão e elevem a rentabilidade sobre o patrimônio (ROE), que fechou o ano em 9% - um número considerado baixo -, para aproximadamente 15% até 2027.
“A receita de serviços demanda menos ativo e capital, fazendo com que a receita flua para a última linha do balanço sem muita alocação de capital”, diz Ponciano.
Menos crédito
Mas esse otimismo tem suas limitações. A concessão de crédito ainda responde por boa parte da receita do banco. A ideia, no entanto, é ser um pouco mais cauteloso nesta oferta em 2023.
As próprias circunstâncias do mercado já vinham indicando esse conservadorismo. Além dos juros altos, a recuperação judicial da Americanas deixou o cenário nebuloso para operações de crédito.
A quebra do SVB, nos EUA, trouxe um componente adicional a este cenário, com clientes americanos tirando dinheiro de bancos médios e migrando os recursos para os bancões tradicionais.
No balanço, o BS2 informou que o coeficiente de Basileia III fechou 2022 em 11,7%. Apesar de estar abaixo dos 13,08% de 2021, a instituição está dentro das regras do Banco Central, que exige um mínimo de 10,5%. Além disso, de acordo com o BS2, o índice de inadimplência da carteira de crédito no ano passado foi de 0,3%.
Este posicionamento, além do fato de o sistema bancário local não ter praticamente nenhuma exposição ao caso, garante uma relativa tranquilidade, segundo Luis Miguel Santacreu, analista de instituições financeiras da agência de classificação de risco Austin Rating.
“O sistema brasileiro, os bancos, estão super bem, com uma solidez muito boa”, diz. “E os bancos digitais daqui seguem toda a regulamentação do BC, que é muito diligente.”