A primeira informação sobre a inflação oficial de 2023, o IPCA-15, será conhecida na terça-feira, 24 de janeiro, e deverá esquentar o debate sobre desancoragem de expectativas e política monetária, além de convidar o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, a um posicionamento sobre as condições financeiras do país.
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva já deu sua opinião. Em entrevista à GloboNews, considerou uma “bobagem” a independência do Banco Central (BC) e exagerada a meta de inflação e a taxa de juro.
Os temas ganham fôlego adicional com a constatação de que os juros seguem em alta no mundo, mas os maiores bancos centrais aproximam-se do fim do ciclo de aperto monetário, ante o arrefecimento da inflação e o enfraquecimento das economias.
Na Europa, os índices de preços ao consumidor encerraram 2022 em desaceleração, afastando-se de dois dígitos, à exceção do Reino Unido. Nos Estados Unidos, a inflação cravou 6,5% no ano passado, após alcançar 9,1% em junho.
No Brasil não foi diferente. A inflação no varejo tombou de 12,13% em abril para 5,79% em dezembro de 2022. A desaceleração dos preços propicia frear a alta dos juros e até cortar no futuro, mas não é esse o sinal emitido pelos bancos centrais, inclusive, o BC do Brasil.
O aperto monetário e seu impacto no setor produtivo também permearam discussões no Fórum Econômico Mundial, em Davos, Suíça, durante a semana, onde o ministro Haddad representou o Brasil ao lado da ministra do Meio Ambiente, Marina Silva.
Nos Alpes Suíços, Haddad informou que pretende realizar reuniões mensais com o presidente do BC, Roberto Campos Neto, para aproximar a política fiscal da monetária. O sinal de Haddad não é novo. Há duas semanas, quando anunciou o Programa de Recuperação Fiscal, o ministro fez essa afirmação.
É fato que a perspectiva de revisão do ciclo monetário nas principais economias favorece essa aproximação. E é fato também que as declarações de Lula impõem urgência a entendimentos entre Fazenda e BC.
Não será surpresa, portanto, se conversas entre Haddad e Campos Neto avançarem nos próximos dias de contagem regressiva para a primeira reunião do Copom de 2023 e do novo governo.
O Copom se reúne em 31 de janeiro e 1º de fevereiro, calendário coincidente com o encontro de política monetária do Federal Reserve, o Fed.
O BC americano deve desacelerar a alta de sua taxa de 0,50 para 0,25 ponto percentual, para a faixa de 4,50% a 4,75%, e tornar mais aguda a discussão sobre juros.
Por aqui, o binômio juro/inflação continua quicando porque as projeções para o IPCA de 2023, 2024 e 2025 seguem em alta.
E, para o mercado, essa trajetória autoriza a expectativa de que a Selic será mantida em 13,75% para além do primeiro semestre e ao custo de um PIB capenga que Lula rejeita.
Neste contexto, o IPCA-15 de janeiro deve ressuscitar questionamentos sobre a reoneração ou não dos combustíveis a partir de março e seu efeito sobre inflação e arrecadação. Duas questões que não sairão de pauta tão cedo.
O IPCA-15 de janeiro, estimado em 5,77% no cálculo em 12 meses pela LCA Consultores, deverá alinhar-se à inflação oficial de 2022, de 5,79%, e poderá fortalecer a ideia de que o BC já fez o seu trabalho e que, em breve, o juro pode cair.
Entretanto, o BC não tem dado indicações nesse sentido. As projeções de inflação são de queda futura, mas ainda ultrapassam as metas definidas pelo Conselho Monetário Nacional (CMN).
A Focus aponta inflação de 5,39% para o IPCA deste ano; 3,7% para 2024; e 3,5% para 2025, ante metas de 3,25% para 2023 e 3% para 2024 e 2025.
O CMN, que tem autoridade para rever as metas, terá a primeira reunião do governo Lula em 26 de janeiro, na semana que antecede o Copom. O colegiado estará representado pelo Ministério da Fazenda, Ministério do Planejamento e Banco Central.
Em consonância com a inflação esperada, as estimativas para a Selic são de queda ano a ano, mas em ritmo lento. Segundo a Focus, a taxa deverá recuar a um dígito apenas em 2024 mantendo-se próxima a 10%.
As projeções para o dólar são consistentes. A moeda deve rondar R$ 5,30 até o final de 2025, mas continuará sendo testada por declarações do governo e pela evolução da agenda fiscal.
O dólar chegou a mirar R$ 5 no início da semana, amparado por declarações de Haddad, em Davos, de que a Reforma Tributária é prioridade, deverá ser votada com foco na tributação do consumo no primeiro semestre e completada no segundo, com a tributação da renda.
Mas o dólar voltou a subir com o recrudescimento de expectativas com riscos fiscais, na quarta-feira, 18 de janeiro, no embalo de declarações de Lula a sindicalistas sobre a valorização do salário mínimo, intenção de elevar a isenção do IRPF a salários de R$ 5.000 e renovadas críticas à Reforma Trabalhista.
A pressão sobre o dólar, em alta de 1,4% a R$ 5,23, na quinta-feira, 19 de janeiro, foi reação adicional às afirmações de Lula à GloboNews na véspera e que acenaram com tempos difíceis para o BC em sua relação com o governo.
As declarações de Lula foram na contramão da passagem de Haddad por Davos que agradou ao mercado, inclusive, por acenar com diretrizes do novo arcabouço fiscal até abril.
O mercado continua tentando encontrar solo firme na área fiscal, aproveitando ventos positivos que sopram a favor da inflação global, apesar de sinais preocupantes sobre a atividade, como revelaram pesquisas com economistas e CEOs divulgadas no Fórum Econômico Mundial.
A percepção global é negativa, mas os sinais são menos perturbadores que meses atrás e corrobora, neste sentido, a revisão do cenário global promovida pelo Itaú Unibanco.
Economistas liderados pelo ex-diretor de Política Econômica do BC, Mario Mesquita, não apostam em recessão generalizada.
O Itaú avalia que, em 2023, a Europa terá contração de 0,6%; os Estados Unidos avançam 0,5%; a China 4,8%; e o PIB global 2,3%.
A expansão seguirá discreta em 2024, mas a recessão estará fora do radar e o juro cairá nas grandes economias, diz a instituição. Neste cenário, a vantagem da Selic não será abalada.
Mesmo em queda de 13,75% para 12,50% até o fim deste ano e a 9,25% em dezembro de 2024, como prevê a Focus, a taxa básica estará valendo mais que o dobro do juro americano estimado pelo Itaú em, respectivamente, 5,1% e 4,4%.