No dia em que estava completando quatro anos, a Neon Pagamentos comprou a Magliano, a mais antiga corretora de valores do País, dona do número 001 na B3.
O negócio, que não teve os valores revelados, marca a entrada do banco digital na briga das plataformas de investimentos, após um aporte de R$ 400 milhões, liderado pela General Atlantic e pelo BV, em novembro do ano passado.
A Neon, no entanto, não vai brigar por clientes de Itaú Personnalité, Bradesco Prime ou XP. Ao contrário. O cliente típico da Neon é de pessoas da classe C. A oferta de investimentos deve se concentrar em produtos mais simples e com menor risco.
“Está todo mundo se matando pelos clientes Personnalité e Primes da vida”, afirmou Jean Sigrist, presidente da Neon, em entrevista ao NeoFeed. “Vamos entrar em um mercado pouco explorado que é o da classe C.”
Os funcionários da Magliano, cerca de 15 profissionais, serão incorporados pela Neon, fundada pelo empreendedor Pedro Conrade, que hoje está à frente do conselho de administração da fintech.
A transação envolve apenas as licenças de operação da Magliano. A carteira de clientes da corretora não faz parte do negócio. Ela já havia sido vendida para a Guide em dois momentos diferentes. Em 2018, a Magliano saiu do negócio de pessoas físicas. Um ano depois foi a vez de se desfazer da área de pessoas jurídicas, com a venda de 100% da operação de fundos, tanto a parte de administração, quanto a de custódia.
“Não é fácil para uma empresa com mais de 90 anos virar a chave e se transformar em uma fintech”, afirmou Raymundo Magliano Neto, atual presidente da corretora e filho de Raymundo Magliano Filho, ex-presidente da Bovespa (hoje B3). “Queríamos dar continuidade à corretora e encontramos alguém que pensa parecido com a gente.”
Essa é a segunda aquisição da Neon. No ano passado, a fintech comprou a MEI Fácil para ampliar a sua penetração na área de microempreendedores individuais.
Atualmente, a Neon conta com 9 milhões de contas abertas, com possibilidade de realização de saques, depósitos, pagamentos e transferência. “Faz todo o sentido ter uma oferta para a classe C”, diz uma fonte. “Com os juros baixos, quem não tiver uma plataforma de investimento terá um produto pior.”
A Neon já contava com produtos de crédito e distribuía CDBs do Banco Votorantim. A carteira de CDBs, de acordo com Sigrist, está crescendo em média 20% ao mês. Mas o tíquete médio dos clientes investidores aumentou 50%.
O plano agora é oferecer novos fundos de baixo risco e até mesmo títulos de Tesouro Direto. Mais para frente, diz Sigrist, um dos fundadores da Guide antes de se tornar sócio da Neon, a ideia é também oferecer fundos de ações e ETFs, fundos negociados em bolsa que seguem a variação de um índice de referência, como o Ibovespa.
“O mercado está evoluindo e a classe C precisa de produtos melhores”, afirma Gustavo Araújo, sócio da Distrito, ecossistema independente de startups, que investiu nos estágios iniciais da Neon – hoje, ele não tem mais participação na fintech. “Os vídeos de investimentos são superpopulares no YouTube e em várias plataformas que ensinam as pessoas a poupar dinheiro.”
Depois de atraírem milhões de clientes às suas contas digitais gratuitas, o próximo passo dos bancos digitais é aumentar a oferta de produtos e serviços a essa base de consumidores.
O Banco Inter, por exemplo, que chegou a 6 milhões de clientes, conta como a PAI (plataforma aberta de investimentos), criou um marketplace e lançou até uma operadora de celular para fortalecer seu ecossistema.
O Nubank, que contava com 17 milhões de clientes da NuConta, também estava aumentando a sua oferta de produtos. Sua carteira de empréstimo havia atingido R$ 328 milhões em um ano, segundo reportagem do NeoFeed.
Com a Magliano, a Neon ganho um atalho para entrar nessa briga, pois fica com as licenças da corretora, após as aprovações do Banco Central.
A Neon herda também a tradição da Magliano, a primeira corretora de valores da Bovespa fundada em 1927. Um de seus sócios, Magliano Filho, presidiu a Bovespa de 2001 a 2007.
Durante sua gestão, ele foi responsável pelo programa “Bovespa Vai Até Você”, que durante mais de cinco anos levou equipes da bolsa para cidades de todo o Brasil.
Nessa época, Magliano Filho ampliou o contato da Bovespa com o público, buscando investidores em universidades, shoppings, clubes, portas de fábricas e até mesmo na praia.
A expectativa de Magliano Filho era que o número de investidores pessoa física chegasse a 5 milhões. Mais de uma década depois, a B3 (nome da bolsa depois da fusão entre BM&FBovespa e Cetip), superou a marca dos 2 milhões de investidores. Agora, a meta de ampliar a base de investidores passou para a Neon.