Há pouco mais de um mês, o mineiro João Vitor Menin, CEO e um dos controladores do Banco Inter, esteve na Califórnia, mais precisamente no hotel Langham, em Pasadena, para uma “reunião de família”.

Ali, durante dois dias ininterruptos, encontrou e conversou com gente do mundo inteiro. “O que mais escutei foi a palavra família”, diz Menin ao NeoFeed. “A família Softbank”, diz, referindo-se à poderosa empresa de investimentos japonesa.

Não são familiares de sangue, mas são unidos por um laço bem forte. “Somos irmãos nos negócios”, diz ele. E o “pai” daquela mais de centena de empreendedores é o japonês Masayoshi Son, o homem mais poderoso do Vale do Silício.

Ele é o comandante do Softbank, que lidera o Vision Fund, um fundo de US$ 100 bilhões que aportou dinheiro em companhias como Alibaba, Uber, Didi, Slack e a problemática WeWork.

A essência do encontro foi conectar suas empresas investidas para construir um networking forte ao redor do mundo. Nada mais Natural, incentivar a rede de empresas investidas a gerar negócios entre elas.

“Será que vocês podem usar a Loggi para transportar os cartões do banco? Podem dar uma linha de crédito para a Oyo que está chegando ao Brasil?”, diz Menin, dando exemplos das conversas que geralmente acontecem no encontro do Softbank. Mas nada, diz ele, é obrigatório.

“Somos irmãos nos negócios”, diz Menin sobre as empresas investidas pelo Softbank

O fato é que o Softbank tem uma fatia de 14,98% no Banco Inter e está colocando suas investidas para ajudar o Inter a dar saltos mais altos. André Maciel, o head do Softbank no Brasil, inclusive, acaba de entrar no conselho de administração da instituição financeira.

Menin não admite, mas, segundo noticiou a Reuters, no mercado são fortes os indícios de que a Uber e o Inter estão conversando para que o banco seja o provedor de serviços financeiros para a Uber aqui no Brasil. Além de intermediar as operações financeiras, o app dos motoristas já viria com todos os serviços do banco à sua disposição.

Masayoshi Son, do Softbank, e algumas investidas da "família"

O NeoFeed apurou com pessoas que conhecem a operação que as duas empresas já estão trocando informações para entender como seria uma possível integração.

Essa troca de informações é fundamental para o avanço do Inter. Desde que se transformou em um banco digital e abriu capital, em abril de 2018, a instituição financeira cresceu exponencialmente.

Saltou de 430 mil correntistas em janeiro de 2018, antes de abrir capital, para 3,3 milhões no fim do terceiro trimestre. Seu valor de mercado partiu de R$ 1,9 bilhão para os atuais R$ 11,3 bilhões.

SuperApp

“À medida que vamos crescendo o número de correntistas, vamos lançando outros produtos”, diz Menin. Em dezembro de 2018, o banco lançou a Plataforma Aberta Inter (PAI) e agora se prepara para dois novos lançamentos. “Vamos entrar na área de adquirência e vamos lançar o nosso SuperApp agora nesta semana”, diz Menin.

Indagado se quer transformar o SuperApp em um aplicativo como os chineses Alipay ou Wechat, Menin diz que a ideia é oferecer mais serviço e comodidade aos clientes e, claro, faturar mais com o negócio.

Deixa claro, entretanto, que está de olho no que está acontecendo no mercado chinês e no Alipay, que pertence a Alibaba, uma das investidas do Softbank. “Por conta de nossa relação com o Softbank, nosso pessoal está indo para China para ver como eles trabalham”, diz ele.

O SuperApp será uma aposta do banco para oferecer mais do que serviços financeiros. Pode ser transformar também em um poderoso marketplace com uma movimentação bilionária. Com um investimento estimado em R$ 50 milhões, o SuperApp vai trazer cerca de 70 lojas dentro de seu marketplace.

São varejistas de produtos eletroeletrônicos, agências de viagens, companhias aéreas, drogarias, redes de estacionamento, entre outros parceiros. Quando o correntista do banco abrir o seu app, metade da tela será ocupada com produtos financeiros e a outra metade será direcionada para o marketplace.

“Se der certo, o SuperApp pode mudar a história da companhia, deixaremos de ser apenas um agente financeiro”, diz Menin

Nesse primeiro momento, a versão que estará disponível é uma em que ainda será necessário entrar na loja e digitar o cartão para efetuar a compra. Menin afirma, entretanto, que até o Natal a instituição financeira lançará uma versão em que o cliente poderá comprar com apenas um clique, sem atrito no momento de efetuar o pagamento.

O banco espera ter 4 milhões de correntistas até o fim do ano. O aumento da base significa mais TPV ou volume transacionado. Atualmente, cada cliente do Inter movimenta, em média, R$ 1 mil por trimestre. Ou seja, foram R$ 3,3 bilhões no último trimestre. Mas 99% do montante são gastos fora de sua plataforma. Com o SuperApp isso deve mudar.

“Quando o nosso cliente compra com o cartão dele em uma loja como a Fast Shop ganhamos cerca de 1,4% na taxa de intercâmbio”, diz Menin. Se o banco conseguir fazer com que esse mesmo cliente compre pelo seu app, ganhará a taxa de intercâmbio e o take rate, a porcentagem que o lojista entregará ao banco quando uma compra for relizada no SuperApp.

Essas porcentagens variam entre 5% e 15% e Menin estima que conseguirá uma média de 8%. “Nosso sonho é que 25% das transações dos nossos correntistas passem pelo SuperApp”, diz ele. “Vamos supor que tenhamos 8 milhões de clientes no último trimestre do ano que vem. Serão R$ 8 bilhões de TPV.” Ou seja, desse total, R$ 2 bilhões seriam movimentados por trimestre no SuperApp e cerca de R$ 200 milhões entrariam no caixa do Inter.

O CEO de uma famosa fintech diz ao NeoFeed que não acredita na estratégia do Inter nesse segmento. “O brasileiro é totalmente diferente do chinês. Essa história de SuperApp funciona lá, aqui acho muito difícil isso pegar”, diz ele.

Menin está tranquilo em relação a essa questão e acha que o investimento vale o risco. “Se der certo, o SuperApp pode mudar a história da companhia, deixaremos de ser apenas um agente financeiro”, diz ele. “Se não der, ok.” O mercado, ao que parece, tem comprado a estratégia da empresa.

De acordo com um relatório da Eleven, “para 2020, o resultado líquido projetado cresce 37%, impulsionado pelo aumento do volume de crédito nas linhas voltadas para pessoas físicas (cartão de crédito, consignado e imobiliário), expansão das receitas com serviços, refletindo o aumento de clientes e a penetração de produtos, incluindo o SuperApp.”

Os analistas projetam ainda a expansão de 54% das contas digitais, encerrando o ano com 5,4 milhões de correntistas. Já um relatório do BTG Pactual aponta o crescimento para 2020 e a recomendação de compra das ações com um preço-alvo de R$ 70 nos próximos 12 meses.

Adquirência e novos mercados

Paralelo ao SuperApp, o banco também se prepara para entrar no concorrido mercado de adquirência, tomado pela famosa “guerra das maquininhas”. Mas a ideia é brigar por um espaço sem fazer uso de maquininhas. A pessoa vai encostar o cartão NFC no celular e o celular vai servir de maquininha.

Menin explica que está em conversas com uma adquirente para criar uma joint-venture nessa área. O Inter seria então um subadquirente e ofereceria os serviços para seus correntistas PJ e MEI. “Vamos concorrer com o público do PagSeguro”, afirma Menin.

Tudo o que o banco tem feito é baseado no conceito de cross selling. Ir agregando serviços e oferecer para os correntistas. O mundo digital, o big data, também é um aliado nesse sentido.

Ao saber que um cliente do Inter está enviando uma TED para a XP Investimentos, por exemplo, o banco aborda o correntista e mostra que tem a plataforma de investimentos PAI

Ao saber que um cliente do Inter está enviando uma TED para a XP Investimentos, por exemplo, o banco aborda o correntista e mostra que tem a PAI, com mais de 70 fundos, CRIs, CRAs, entre outros produtos. Atualmente, 350 mil clientes do banco investem na plataforma e a ideia é usar muito a base de dados para incrementar esse número.

Menin enxerga esse cruzamento de dados como uma vantagem competitiva também na área de crédito imobiliário, onde tem uma carteira de R$ 3 bilhões, e de crédito consignado, com R$ 1 bilhão em carteira. “Vamos crescer muito nessas áreas dentro de quatro anos”, afirma.

O executivo, filho de Rubens Menin, fundador da MRV e do Banco Inter, acredita que, sem uma conta corrente, a capacidade de serviços fica muito restrita. “Todas as fintechs querem virar banco. Mas para fazer isso, diante da quantidade de processos, é muito complexo. Ter um cartão de crédito é mais simples, mas a empresa fica manca.”

Por isso, ele não vê as fintechs como competidoras diretas. “Tem pouquíssimo banco digital no Brasil. O pessoal fala, mas tem só o Inter, o Original e o C6. O Neon não é, o Nubank não é, o Mercado Pago não é. O Next não é, ele é uma parte do Bradesco”, afirma, sem mencionar players como Banco Pan e BS2. E, mesmo os concorrentes, são vistos como aliados.

“Aqui na Faria Lima todos sabem o que são bancos digitais. Vai falar para o cara lá no interior do Nordeste sobre banco digital, é difícil. Os outros bancos digitais são aliados para mostrar aos brasileiros que tem um jeito mais inteligente de fazer o seu banking.”

Expansão internacional

O intuito, entretanto, não é ficar restrito ao Brasil. Menin confirma ao NeoFeed que está estudando a expansão internacional. “Temos planos de ir para outros países, mas não para ser um arranjo de pagamentos”, diz ele. Ainda em estágio inicial, a ideia seria expandir pelos países da América Latina, a exemplo de fintechs como Nubank e Creditas que iniciaram esse movimento.

O plano do Inter é começar uma expansão pelos países da América Latina

Por aqui, a expansão continua acelerada. No início do ano, o Inter contava com 769 funcionários e, atualmente, está com 1,5 mil. O crescimento fez com que o banco buscasse uma nova sede em Belo Horizonte. Se antes ocupava um conjunto de sete pequenos prédios que foram sendo agregados ao longo do tempo, agora a empresa vai para um edifício de 24 andares onde ficava a Cemig.

Em janeiro de 2020, o banco ocupará 12 andares do prédio e terá os outros 12 à sua disposição para serem ocupados à medida que for crescendo. “Temos pulmão para isso”, diz Menin. E acrescenta. “Brinco que vivemos uma constante crise de identidade, que é boa, entre a economia nova e a economia velha”, diz ele.

Diante da dúvida do repórter, ele explica. “‘O que é a economia nova? É o crescimento, a disrupção. O que é a economia velha? É a rentabilidade, o resultado, ter certeza de que esse crescimento faz sentido e não chegar lá na frente e pensar no que vai fazer’”, afirma. “É bom termos um pé no velho e no novo.”

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