Desde que o Fórum Econômico Mundial de Davos trouxe o assunto à tona e gestores do porte de Larry Fink, da BlackRock, começaram a impor condições para investir em empresas que não fossem sustentáveis, o tema do ESG (Environmental, Social and Governance) ganhou o mundo corporativo. Mas nas mesas de bar, pelo menos nos que servem vinhos do Alentejo, essa questão já era uma constante.
As vinícolas da região de Portugal começaram a se preocupar com a questão, em 2015, quando criaram um programa de sustentabilidade para conscientizar os produtores. Em julho, em plena quarentena, o negócio foi oficializado com o lançamento de um selo que atesta práticas sustentáveis.
A iniciativa se deu por dois motivos. O primeiro é o de atuar com responsabilidade social. O segundo – e não menos importante – é que o mundo passou a exigir esse tipo de postura e isso está mexendo no bolso das vinícolas.
Países nórdicos e o Canadá, por exemplo, passaram a, cada vez mais, impor barreiras para rótulos elaborados sem preocupações com o meio ambiente. De olho em problemas como esse, as vinícolas, sob a batuta da Comissão Vitivinícola Regional Alentejana, começaram a se preparar. E, desde o início do segundo semestre, a se candidatar para colar o tão almejado selo em seus rótulos.
As primeiras vinícolas sustentáveis dessa região deverão ser anunciadas até o fim do ano. “Terão direito ao certificado aquelas vinícolas que obtiverem a nota máxima em pelo menos 86% dos 171 critérios listados”, diz João Barroso, coordenador do Programa de Sustentabilidade dos Vinhos do Alentejo (PSVA), ao NeoFeed.
O impacto desse negócio é enorme para as vinícolas. “O selo deve aumentar entre 5% e 10% a venda de vinhos do Alentejo”, afirma Francisco Mateus, presidente da comissão vitivinícola da região. A porcentagem se baseia no fato de ser crescente o número de consumidores mundiais que preferem produtos com o selo de sustentabilidade.
A Noruega, a Suécia e a Dinamarca, por exemplo, criaram uma taxa para o peso da garrafa, preocupados com o gasto de combustível excessivo para transitar produtos que não precisam ser tão pesados. Atualmente, vinhos em garrafas que pesam mais que 780 gramas pagam uma taxa por grama a mais. “É uma maneira de desencorajar garrafas pesadas”, conta Barroso.
Muitos consumidores acreditam que uma garrafa mais pesada traz vinhos de maior qualidade, o que não é verdade. A Herdade do Esporão, vinícola que começou a se preparar para a sustentabilidade ainda antes do programa oficial do Alentejo, utilizava garrafas que pesavam, em média, 700 gramas em 2008. Agora, cada vasilhame pesa 420 gramas.
A preocupação em perder competitividade frente a vinhos de países como Chile, Austrália, Nova Zelândia, e da Califórnia, nos Estados Unidos, também contribuiu para a comissão alentejana investir neste programa. Mas o projeto de sustentabilidade não visa apenas os consumidores e os mercados. Mateus destaca que a economia com os gastos de água e de energia chegue entre 20% e 30% dos custos das vinícolas.
Um exemplo é a quantidade de água utilizada para elaborar um litro de vinho. Adriano Relvas, da vinícola Casa Relvas, conta que, quando entrou no programa, quatro anos atrás, gastava 3 litros de água para produzir 1 litro de vinho. Hoje, sua vinícola gasta 1,5 litro de água para 1 litro de vinho.
Na Herdade do Esporão, a enóloga Sandra Alves afirma que atualmente a vinícola gasta 1,1 litro de água para produzir 1 litro de vinho e a meta é chegar ao 1 litro de água. Vencido este patamar, a meta passará para 750 ml.
“Só com a conscientização das pessoas economizamos 60% do uso de água”, diz Sandra, responsável por um vinhedo de 450 hectares certificados com produção orgânica. “É impossível precisar o retorno de cada investimento, mas é claro que a sustentabilidade pressupõe um retorno econômico”, conta Sandra.
A água é, particularmente, um tema caro à região. O Alentejo registra as temperaturas mais altas de toda a Europa e os recursos hídricos são escassos. Mas há outros pontos na pauta da sustentabilidade. Entre as ações das vinícolas estão painéis solares para economizar energia elétrica, a criação de corredores ecológicos, que trazem insetos aos vinhedos e reduzem o uso (e o gasto) com pesticidas, e a atração de animais, como morcegos, que comem os insetos predadores.
Barroso conta que a Casa Relva investiu na construção de corredores ecológicos, com o plantio de espécies nativas em zonas estratégicas da vinha. “Mas como medir o retorno deste investimento? Sabemos que vai melhorar a retenção de água da chuva, que vai aumentar a resistência das vinhas às pragas e doenças. É um retorno difícil de calcular em números”, afirma ele.
O programa também levou as empresas a se preocuparem com o acompanhamento destes parâmetros. Em 2015, apenas 4% das vinícolas monitoravam o uso de energia. Em 2019, esta porcentagem chegou a 30%.
Sobre o uso de água, quatro anos atrás, apenas 8% destas empresas controlavam o seu uso e, no final do ano passado, 45% delas já estavam na lista. Do monitoramento da irrigação, a porcentagem de vinícolas passou de 27%, para 62% e nas caixas-ninhos para aves e morcegos, de 5% para 27% neste mesmo período.
O programa de sustentabilidade começou com 94 membros. Atualmente, são 426 empresas participantes, entre vinícolas e viticultores, de um total de mais de 1.800 viticultores.
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