Um ano depois de vender o controle da GetNet para o Santander, um negócio de R$ 1,1 bilhão em 2014 (teve outra fatia de R$ 1,5 bilhão em 2018), o empresário José Renato Hopf resolveu voltar a empreender fundando a 4All, uma venture builder que criou nove negócios, como Quiq, Wine Locals e Uhuu!.

Agora, Hopf está ajudando a transformar Porto Alegre na capital do venture capital (VC) da América Latina com o South Summit Brazil, que terá sua segunda edição a partir de 29 de março na capital gaúcha, atraindo startups e investidores de todas as partes do mundo nos três dias do evento.

A fórmula para criar o South Summit Brazil, correalizado com o governo do RS, segue um playbook que Hopf adotou em todos os seus negócios. A receita inclui sempre uma boa dose de inovação, algo que o empresário faz desde quando era um funcionário do Banrisul, em conjunto com um parceiro que o ajuda a desenvolver o projeto.

“Não faço nada sozinho”, afirma Hopf, em entrevista ao NeoFeed. “Quando construo um negócio, as pessoas são sócias. Gosto de duplas e trios e sempre tenho braços direitos.”

No caso do South Summit Brazil, trata-se de uma associação com a espanhola María Benjumea, a idealizadora do evento em Madrid. Na edição brasileira deste ano, a estimativa é de mais de 20 mil pessoas nos três dias do evento, espalhadas por 22 mil metros quadrados de área, oito palcos e oito tracks de conteúdo.

O que chama a atenção é a quantidade de fundos – e investidores – que vão circular pelos galpões do Cais Mauá, em Porto Alegre. Até agora, são mais de 100 gestoras de venture capital confirmadas. A lista inclui nomes conhecidos dos empreendedores brasileiros, como Mandi Ventures, Monashees, Riverwood Capital, Headline, GP, G2D, General Atlantic, Bossanova, Upload e Endeavor Catalyst.

Mas há também fundos de venture capital de todas as partes do mundo. São os casos de All Iron Ventures (Espanha), Conexo Ventures (EUA), Imagine Ventures (Chile), Uncork Capital (EUA), TXV Capital (EUA) e Intema fUND (Emirados Árabes). Até agora, 34 VCs internacionais confirmaram a presença e devem frequentar os galpões em Porto Alegre.

Mas não são apenas investidores que circularão por lá. André Esteves, do BTG Pactual; Luiza Helena Trajano, do Magazine Luiza; Jorge Gerdau, da Gerdau; Marciano Testa, do Agi; e Luciano Huck, investidor e apresentador da TV Globo; são nomes que vão palestrar no evento. “São empresários que investem em inovação”, diz Hopf.

Esse grupo deve se reunir com empreendedores de diversas partes do mundo. O Startup Competition 2023, por exemplo, teve 2.020 startups inscritas de 86 países. Entre as 50 selecionadas, que vão fazer pitches para investidores do evento, estão 23 empresas internacionais. “A ideia do evento não é só gerar conexões, mas também investimentos e negócios.”

Será um desafio, diante de um cenário de desaceleração dos investimentos em venture capital no Brasil e no mundo. Em 2022, os investimentos em startups brasileiras caíram pela metade, totalizando US$ 4,46 bilhões, segundo o Distrito. Neste ano, a situação não mudou. Em fevereiro, os aportes somaram US$ 84,1 milhões, queda de 87,8%. É o segundo menor volume de investimentos para o mês desde 2014.

Hopf enxerga essa crise como positiva para o mercado e para os empreendedores. “Sempre fui muito crítico em relação a forma perdulária que estava se lidando com o dinheiro”, diz o empresário. “Não entendia alguns valuations e como se gastava o dinheiro sem responsabilidade nenhuma”. Ele acredita que o setor comece a se recuperar a partir do segundo semestre deste ano.

Antes de fechar acordo com o South Summit, Hopf fez um périplo pelos principais festivais do mundo. Três deles foram analisados com mais atenção: o South by Southwest (SXSW) e o Web Summit, além do evento fundado por María. A decisão de fechar com o South Summit foi o fato de, na visão de Hopf, o evento espanhol gerar mais impacto na economia e no ecossistema.

“São eventos fantásticos. O Web Summit é um grande congresso e o SXSW, um grande festival”, afirma Hopf. “Mas o South Summit é uma plataforma para conectar startups, investidores e empresas.” O SXSW segue em Austin, no Texas. Mas o Web Summit terá sua primeira edição no Rio de Janeiro, em maio deste ano.

O Cais Mauá, em Porto Alegre, onde acontece o South Summit Brasil
O Cais Mauá, em Porto Alegre, onde acontece o South Summit Brazil

Inovação no DNA

O South Summit Brazil se conecta, de certa forma, com a trajetória empreendedora de Hopf, que começou a carreira no Banrisul no departamento de tecnologia. Com pouco mais de 20 anos, liderava toda a área de automação do banco estatal. Lá, chegou a lançar o Banricompras, a primeira rede independente de cartões do Brasil.

A vontade de Hopf, no entanto, era empreender. No começo dos anos 2000, ele deixou o Banrisul para fundar a GetNet. Diz que nessa época teve sorte de conseguir investidores de duas famílias do Rio Grande do Sul para apoiar sua ideia: a Corrêa e a Stumpf. “Não existia fundos de venture capital no Brasil”, relembra ele.

No começo da GetNet, o ganha-pão foi a venda de cartões pré-pagos para operadoras de celulares. Depois, Hopf fez uma parceria com o Santander e o negócio decolou. Principalmente, a partir de 2010, quando foi quebrado o monopólio das maquininhas com Visanet (exclusiva dos cartões Visa) e Redecard (Mastercard).

Quando vendeu o controle da GetNet para o banco espanhol, Hopf atuou no processo de transição. Mas, já em 2015, resolveu empreender. Em vez de criar um fundo de venture capital, resolveu fundar a 4All e desenvolver empresas do zero. A receita era a mesma da GetNet. Só que, neste caso, ele seria o investidor e precisaria buscar parceiros para ajudar no desenvolvimento dos negócios.

Um exemplo é a Uhuu!, uma plataforma entretenimento que opera com empresas do show business vendendo ingressos. O parceiro neste caso é a Opus Entretenimento, uma das principais produtoras de eventos culturais do país. Outro é a Wine Locals, que tem a Víssimo Group, dono das marcas Evino e Grand Cru, de sócia minoritária.

Com a Quiq, uma plataforma que integra aplicativos de delivery, sistemas de PDVs e operadores logísticos para que restaurantes e bares pudessem gerenciar melhor os pedidos online, Hopf atraiu pesos pesados do setor.

São sócios do negócio nove grupos econômicos do setor de fast food, dono de marcas como McDonald´s, Giraffas, Outback, Domino´s Rei do Mate e Spoleto, entre outras.

A 4All atua em diversos outros negócios, mas sem esses parceiros. Um deles é a Phi, uma plataforma que cria e acelera fintechs. Outros são a Ground, que conecta clubes de futebol aos seus torcedores; a DX.CO, que atua com grandes empresas em projetos de transformação digital; a Iris, que pretende ganhar uma fatia do mercado data driven; e a martech AIO.

“A minha esposa brinca: como você está sem fazer nada, vai empreendendo”, diz Hopf, dando risadas. Em tempo: ele diz que tem dois negócios no forno que em breve vão ser anunciados. O “ócio” de Hopf, como se vê, é bastante produtivo.