Sete meses após dizer que iria investir US$ 300 milhões em startups em estágio inicial na América Latina, o Softbank está fazendo um recuo tático dessa estratégia e anunciando um spin-off do time e do portfólio de 12 startups que foi construído até agora.

Essas 12 empresas (Abstra, Arch, Birdie, BotCity, Digibee, D-Uma, Indaband, Medway, Neivor, Nilo, Salu e Worc) estão migrando para a Upload Ventures, nova gestora que está nascendo sob a responsabilidade de Rodrigo Baer e Marco Camhaji, que tocavam a estratégia early stage do Softbank na América Latina.

Junta-se a dupla Norberto Giangrande, um empreendedor que vendeu a Link ao UBS e a Rico à XP, além de ser investidor-anjo de empresas como Neon, Cora, Buser, Gupy e Nubank.

O Softbank informou que será o maior cotista da Upload Ventures, mantendo o compromisso de investir US$ 100 milhões por ano. A gestora está, neste momento, captando com mais investidores e o objetivo é superar os US$ 300 milhões, criando um dos maiores fundos para startups em estágio inicial da América Latina.

Os cheques da Upload Ventures devem variar entre US$ 1 milhão e US$ 10 milhões e mais 18 startups devem se somar ao portfólio neste ano. Antes do cavalo de pau do Softbank, a meta era investir entre 40 e 50 startups na América Latina no período de três anos.

“O nosso objetivo na Upload Ventures é dar um melhor apoio aos nossos empreendedores. Queremos alavancar o fato de que o time foi montado para investir US$ 300 milhões para conseguir dedicar tempo aos nossos founders, ajudando no que necessitarem”, disse Baer, ao NeoFeed.

Ao se tornar um importante cotista da Upload Ventures, o Softbank está reciclando uma velha estratégia desde que começou a investir na América Latina, ajudando com seus cheques a criar o maior celeiro de unicórnios da região – fazem parte do portfólio Creditas, Gympass, Rappi, QuintoAndar, Loft, Loggi, entre outras.

Quando chegou na região latino-americana com US$ 5 bilhões, em 2019, o fundo de Masayoshi Son, o fundador do Softbank, reservou aproximadamente 10% dos recursos para se tornar um limited partner (LP) de importantes gestoras que apostavam em startups em estágio inicial.

Receberam recursos do Softbank fundos como Kaszek, Valor Capital, Igah Ventures, Atlantico e Volpe Capital – alguns desses investimentos são públicos, outros foram apurados pelo NeoFeed. Com a Upload Ventures, a “nova velha” estratégia para ficar com um pé no early stage está de volta.

O nascimento da Upload Ventures, que foi noticiado em primeira mão pelo Pipeline, site de negócios do jornal Valor Econômico, se insere no contexto que tem como pano de fundo a saída de Marcelo Claure do Softbank.

Claure, um homem de confiança de Masayoshi Son, foi quem trouxe o Softbank para a América Latina. Ele deixou o fundo no começo deste ano em meio a notícias de desentendimento sobre a remuneração que deveria receber por ter ajudado a tirar o WeWork do fundo do buraco.

Sua saída fez surgir rumores de que era questão de tempo para que outros nomes deixassem a operação latino-americana – o que o spin-off do early stage só vai alimentar – e que o Softbank estaria tirando o pé da América Latina.

Fontes do Softbank, no entanto, disseram ao NeoFeed que a saída de Claure não vai significar uma desaceleração dos investimentos na região latino-americana e que o spin-off é um reposicionamento da estratégia de early stage.

“O Softbank nunca investiu em early stage no mundo. Se mantivesse o fundo de early stage, agora que o fundo da América Latina vai para dentro do Vision Fund, ele seria engolido”, diz essa fonte. “O objetivo é maximizar os investimentos em early stage e manter o foco total na estratégia de growth.”

O Vision Fund é o fundo global do Softbank e atuava de forma separada do fundo latino-americano. Sem Claure, que foi substituído pelo indiano Rajeev Misra, essa independência acabou.

Segundo apurou o NeoFeed, o Softbank já fez desembolsos de US$ 250 milhões em novos investimentos e follow ons nas startups da América Latina neste primeiro trimestre de 2022. A meta é investir US$ 1 bilhão na região neste ano.

O segundo fundo para América Latina, anunciado no ano passado, é de US$ 3 bilhões. Na ocasião, o Softbank disse que abriria a captação para outros investidores, o que poderia elevá-lo para US$ 5 bilhões – mas nada indica que isso tenha avançado.

Globalmente, o Softbank está passando também por dificuldades por conta da queda do valor de mercado das empresas tech nos Estados Unidos e Ásia, regiões em que mais têm alocado recursos.

Uma reportagem do jornal britânico Financial Times (FT) relatou que Son disse aos principais executivos do fundo para desacelerarem os investimentos. O FT também informou que o Softbank deve fazer uma baixa contábil de US$ 20 bilhões por conta do colapso do mercado tech ao redor do mundo no quarto trimestre.

Para um investidor com quem o NeoFeed conversou, o spin-off deve causar mal-estar entre os empreendedores do portfólio atual de early stage. Eles acabaram de receber um cheque do Softbank, mas estão migrando para uma nova casa.

“Ele (empreendedor) fez uma reserva em um restaurante, mas acabou jantando em outro. O chef pode ser o mesmo, mas é outro restaurante”, diz esse investidor, referindo-se ao fato de que a grife Softbank era algo desejado pelos empreendedores.

Baer é um investidor pioneiro e respeitado no ecossistema de empreendedorismo brasileiro. Caberá a ele mostrar que o serviço da casa não mudou – e que pode até melhorar.

Assista à entrevista de Rodrigo Baer ao Café com Investidor, do NeoFeed, publicada em dezembro de 2021: