Quando Localiza e Unidas anunciaram, em setembro de 2020, que chegaram a um acordo para fundir as operações, muita gente demonstrou preocupação com os efeitos que a transação teria nos mercados de aluguel de carros. Afinal, a operação resultaria num player dominante, com cerca de 70% de um segmento em franca expansão no Brasil, se aprovada da forma como foi apresentada.
O caso foi um desafio para o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) e se traduziu em uma das análises mais prolongadas da história do organismo antitruste e que dividiu os conselheiros. Só no fim de 2021, a operação foi aprovada com algumas condições. A principal delas era a venda de boa parte da área de aluguel de carros da Unidas, assim como da marca, de modo que o mercado voltasse a ter um concorrente relevante no segmento.
Opositora dos termos originais da fusão, a Ouro Verde viu na solução dada pelo Cade uma oportunidade de agregar uma nova vertical em seu negócio, composto até então por serviços de locação e terceirização de automóveis, caminhões e equipamentos pesados. Em junho, a gestora de ativos canadense Brookfield, que controla a empresa, fechou um acordo para adquirir os ativos da Unidas por R$ 3,6 bilhões, para repassar à sua locadora no Brasil.
Agora, finalmente com os ativos em mãos, a Ouro Verde anuncia uma nova etapa em sua história, mudando seu nome para Unidas e se posicionando para competir com a nova Localiza e a Movida.
“O Cade promoveu um remédio muito maior do que anteriormente a Superintendência-Geral tinha posicionado”, diz Cláudio Zattar, presidente da companhia, ao NeoFeed. “A partir daí, a gente olhou sobre outra perspectiva, porque nunca tivemos um serviço de aluguel de carro de curto prazo, e isso virou um sonho de consumo por nos transformar em uma plataforma mais completa.”
A nova Unidas, que se apresenta ao mercado nesta segunda-feira, dia 3 de outubro, recebeu 49 mil carros da Unidas, 180 lojas de aluguel de carros pelo País e 20 pontos de venda de seminovos. Com isso, sua frota atingiu 90 mil ativos, considerando também caminhões, máquinas e equipamentos pesados. Seu quadro de funcionários chega a 3,6 mil pessoas.
A receita combinada estimada pela direção da Unidas, com base nos números de 2021, é de R$ 3,3 bilhões. O montante considera os valores fechados da Ouro Verde, acrescentados aos correspondentes aos ativos adquiridos da Unidas.
E pelos cálculos da agência de classificação de riscos Fitch Ratings, os 49 mil veículos podem gerar um Ebitda proveniente de locação entre R$ 450 milhões a R$ 500 milhões, isso sem considerar a contribuição da operação de seminovos. No ano passado, a Ouro Verde registrou um Ebitda de R$ 447,1 milhões
Por determinação do Cade, os ativos adquiridos da parte de locação de veículos da Unidas foram separados da Localiza em julho e colocados dentro de uma nova empresa, que operou de forma autônoma entre agosto e setembro sob os olhares da Ouro Verde.
Zattar explica que a chegada da Unidas não representa uma fusão. A empresa criada para abrigar os ativos atuará em paralelo às operações da então Ouro Verde, com todos sob o mesmo guarda-chuva corporativo e a marca Unidas. No comando dessa estrutura está o próprio Zattar, CEO da Ouro Verde desde 2019.
“Contabilmente, não estamos juntando as empresas e contabilizando uma só empresa”, afirma. “As empresas serão geridas contabilmente e financeiramente em paralelo, e existe uma holding que as abarcarão e uma estrutura de gestão unificada, com as empresas com CNPJs separados.”
Segundo ele, a decisão de ir atrás dos ativos da Unidas partiu da própria empresa, ao entender que se tratava de uma operação sinérgica, capaz de ajudar a companhia a aproveitar o crescimento do mercado de aluguel de carros no País e transformá-la num one stop shop do segmento.
Dados da Associação Brasileira das Locadoras de Automóveis (Abla) mostram que, em 2021, o número de pessoas que alugaram veículos subiu 12,3%, para 50,1 milhões. Em relação a 2017, o crescimento foi de 84,2%. O faturamento bruto do segmento atingiu R$ 23,5 bilhões, aumento de 33,5% ante 2020 e de 51,6% comparado há quatro anos.
“A confiança adquirida no modelo de negócios da Ouro Verde, a forma como colocamos o negócio como oportunidade de captura de sinergias, fora o crescimento do mercado de aluguel de carros, motivou a Brookfield a se empenhar para nos ajudar e investir nessa aquisição”, afirma.
Para Zattar, o tamanho da nova Unidas permitirá ainda obter melhores condições nas negociações com as montadoras, considerando que Unidas e Ouro Verde têm muitos fornecedores em comum. “Com a robustez que a gente ganha, vamos ter melhorias significativas nas condições de compra, tanto de carros quanto de caminhões", afirma.
Escala é essencial para qualquer companhia que queira competir no setor de locação de veículos. A Localiza fechou o segundo trimestre com uma frota de mais de 500 mil veículos, 650 agências de aluguel e 180 lojas de seminovos. Outra grande do setor, a Movida registrou no mesmo período uma frota de 207 mil carros, 223 pontos para aluguel de carros e 86 lojas de seminovos.
Sem abrir números e metas, Zattar diz que o plano é investir para aumentar a frota e os pontos de atendimento pelo País, enquanto coloca em prática medidas para melhorar a operação e capturar sinergias.
Assim como os concorrentes, vai investir em veículos mais caros, como utilitários esportivos (SUV), por conta da demanda dos clientes por carros modernos e de ponta e da oferta das montadoras, que estão reduzindo a produção dos chamados carros populares.
Mais para frente, a ideia é trabalhar em melhorias no atendimento, considerado por Zattar um gargalo no setor, direcionando as iniciativas na redução da burocracia do processo de aluguel.
“No curto prazo, a nossa preocupação é garantir a continuidade operacional dela, estamos focados nessa passagem de bastão”, diz. “Tudo é novo, a gente está conhecendo de fato a operação agora, por isso esse período de aprendizado e controle é importante neste primeiro momento.”