Criado em 2010, a partir da fusão das grifes Farm e Animale, o Grupo Soma fez jus ao seu nome ao incorporar, de lá para cá, outras oito marcas ao seu guarda-chuva. A principal aquisição veio em abril de 2021, quando a empresa superou a Arezzo e arrebatou a Hering, com uma oferta de R$ 5,1 bilhões.
Desde então, no entanto, o saldo da operação não tem sido positivo. Ao menos no mercado de capitais. Depois de um pico, em julho de 2021, as ações da empresa, cotadas a R$ 13,10, acumulam uma desvalorização de mais de 35%. Mas há quem enxergue componentes para destravar o valor do ativo.
É o caso da XP que, em relatório antecipado com exclusividade ao NeoFeed, propõe olhar “a soma das partes” do grupo, avaliado em R$ 10,3 bilhões, ao analisar os múltiplos de três frentes, em diferentes estágios de maturidade. Essa conta inclui as marcas no Brasil, a Hering e a operação global da Farm.
“Desde a compra da Hering, os investidores perderam a referência de avaliação do grupo”, diz Danniela Eiger, analista de varejo da XP, ao NeoFeed. “Na nossa opinião, o preço atual está errado. O mercado não está pagando nada por Hering e muito pouco pela Farm Global, dado o potencial dessa operação.”
Dentro dessa linha, Eiger e os analistas da XP levaram em conta um cenário de curto prazo, com base no preço/lucro para 2023 e na premissa de que o Grupo Soma negocia em linha com a Arezzo&Co, seu par na B3, avaliada em R$ 8,8 bilhões e com ações cotadas em R$ 80,19.
“O que queremos provocar é a visão de que o mercado talvez não esteja sabendo precificar e incorporar esses três ativos no preço de tela do Grupo Soma”, afirma Eiger. “Muito por conta das incertezas e da falta de visibilidade em relação ao roadmap estratégico da empresa.”
Na contramão dessa avaliação, a XP define o preço-alvo da ação do Grupo Soma em R$ 21, um potencial de valorização de mais de 60% sobre a cotação atual. E elege o papel como a sua preferência entre as ações no segmento de consumo discricionário. Ou seja, os ativos que são mais sensíveis aos efeitos do cenário macroeconômico.
“Também gostamos da Arezzo&Co, mas achamos que ela não tem uma assimetria tão grande quanto a que estamos vendo no Soma”, diz Eiger. “Hoje, a ação do grupo só reflete um cenário extremamente conservador para todos os seus ativos. Qualquer melhora já traz um bom potencial de ganho ao papel.”
Para chegar a esse “veredicto”, o relatório da XP inclui a análise de cada frente de negócio em um horizonte mais longo. E que considera um estágio mais avançado dessas operações. No cenário mais otimista, a XP vê espaço, inclusive, para que a ação seja negociada a um patamar acima de R$ 30.
Sob essa perspectiva, Eiger destaca a Hering como a peça mais controversa na coleção de negócios do Grupo Soma. Seja pelos riscos associados à integração da operação ou, principalmente, por fatores que fogem ao controle da companhia.
“Existe, sim, um risco maior de execução e também da maior exposição ao contexto macroeconômico”, pontua a analista. “Especialmente pelo fato de que a Hering é uma marca mais democrática e que, por consequência, também atende classes de menor poder aquisitivo.”
Nessa ótica, a Hering teria menos espaço e margem para reajustar preços, por exemplo. Ao mesmo tempo ela ressalta que, nos últimos anos, a marca se consolidou como um ativo estável, conhecido por não queimar caixa. Mas também por não registrar níveis substanciais de crescimento.
“O Soma está trazendo um viés de crescimento da receita e fala em sinergias de até R$ 300 milhões em 2025”, diz Eiger. “Porém, mesmo se essa cifra for de R$ 100 milhões, o valor já estará sendo destravado e isso é algo que não está sendo precificado. Há espaço para surpresas positivas.”
A busca por essas sinergias deve concentrar muitos dos esforços do grupo no médio prazo. Mas o foco da empresa não está restrito aos seus próprios limites. Fruto de um trabalho de aproximadamente seis anos, a operação internacional da Farm é, na visão da XP, um dos ativos de maior potencial na operação.
O embarque da Farm para fora do País teve início em 2016, quando a marca começou a vender suas coleções para os Estados Unidos. Depois de amadurecer, entre erros e acertos, sua incursão no mercado americano, a partir de duas lojas, a grife prepara agora sua entrada no mercado europeu.
Os planos incluem a abertura de até cinco lojas, começando por Paris e Londres, e negociações em outras fronteiras, que envolvem uma varejista de “fast-fashion japonesa” e um e-commerce de luxo, conforme afirmou Marcello Bastos, sócio-fundador da Farm, em entrevista recente ao NeoFeed.
“Temos sido procurados por empresas de outros segmentos, inclusive por uma das maiores redes de cafeterias do mundo, de origem norte-americana”, revelou o empresário. “Hoje, somos o maior vetor de crescimento do Grupo Soma.”
Segundo Bastos, a Farm Global reportou uma receita de R$ 80,3 milhões no terceiro trimestre de 2021, o que representou um crescimento de 229% na comparação com igual período, em 2020, e de 552,9%, sobre 2019.
“Nós vemos bastante potencial para a Farm Global atingir, no longo prazo, um faturamento acima de US$ 300 milhões”, observa Eiger, da XP. “Há espaço para um crescimento robusto e para uma melhora de rentabilidade à medida que a operação vai sendo maturada.”
A analista estima que a margem Ebtida da operação gire em torno de 18% e pode chegar a 25% nos próximos anos, especialmente sob o impulso do mercado europeu. “O risco de não dar certo na Europa é muito baixo”, diz. “A consumidora europeia tem muito mais fit com a brasileira do que a americana.”
Completando o tripé de negócios do grupo, a analista da XP destaca que as marcas e operações da empresa no mercado brasileiro, apesar de mais maduras, também podem contribuir para a valorização da companhia.
“Marcas como Farm e NV ainda conseguem entregar um crescimento high single digit”, observa Eiger. “E nossa análise nem está considerando as possibilidades de outras marcas menores, como a Foxton, de moda masculina, e a Fábula, a marca infantil do grupo.”