O Banco Popular da China (PBoC, o banco central chinês) anunciou um pacote de medidas avaliadas, por baixo, em US$ 250 bilhões para estimular a economia, com redução de taxa de juros, criação de dois fundos para estimular o mercado de ações, diminuição de reservas obrigatórias dos bancos para impulsionar o crédito, além da redução do pagamento de hipotecas para segundas habitações.
As medidas, anunciadas na terça-feira, 24 de fevereiro, eram esperadas há meses e surgiram dias após o Federal Reserve (Fed, o BC dos Estados Unidos) ter iniciado o ciclo de corte de juros os EUA, com grande repercussão no mercado financeiro dentro e fora do país.
O índice CSI 300 de ações listadas em Xangai e Shenzhen subiu 4,3%, o seu melhor dia desde julho de 2020. Na bolsa de Hong Kong, a alta foi de 4%. As ações de luxo europeias e as ações de empresas chinesas cotadas nos EUA, como a Alibaba, além dos preços das commodities, também subiram.
Apesar do peso do pacote, um dos mais abrangentes anunciado pelo governo chinês nos últimos anos, notas emitidas por bancos e avaliações de analistas de mercado advertem que as medidas podem não ser suficientes para reverter a trajetória de baixo crescimento do país, marcada pela queda dos preços, consumo fraco, uma crise imobiliária incontrolável e tensões crescentes no comércio exterior.
“O raro corte simultâneo das taxas de reservas bancárias obrigatórias e da taxa de juros de curto prazo, de magnitude relativamente grande, e a orientação incomum sobre maior flexibilização da política fiscal indicaram preocupações crescentes dos decisores políticos sobre os ventos contrários ao crescimento”, diz nota divulgada pelo Goldman Sachs.
Outros analistas independentes reforçaram o alerta, afirmando que o governo chinês precisa controlar com mais firmeza a crise imobiliária e tomar medidas mais robustas para impulsionar o consumo, se quiser desencadear uma recuperação duradoura na economia que atenda a meta de crescimento do PIB de 5%, estipulada no início do ano.
O tom crítico após o pacote reflete o desafio vivido pelo governo chinês. Na prática, as medidas indicam uma mudança de curso na condução da economia, que vinha sendo focada no estímulo às exportações – em especial de veículos elétricos, baterias e outros bens -, na esperança de compensar o baixo consumo interno devido ao impacto gerada pela crise imobiliária, que atingiu o principal investimento das famílias chinesas.
Com o início do ciclo de queda de juros nos EUA, que fortaleceu o yuan, o pacote anunciado ajudou a inundar a economia interna de liquidez. Além da redução da taxa de juros, de 1,7% para 1,5% ao ano, a decisão de limitar as reservas obrigatórias dos bancos vai injetar o equivalente a US$ 142 bilhões em linhas de crédito.
Outras medidas surpreenderam pela quantidade de dinheiro disponibilizada para impulsionar a economia em várias frentes. No setor financeiro, foram criados dois fundos: um de 500 bilhões de yuans (US$ 70 bilhões) para ajudar corretores, companhias de seguros e fundos a comprar ações. Outro fundo, de 300 bilhões de yuans (US$ 42 bilhões), é destinado a ajudar as empresas a realizar recompras de ações.
Pesadelo imobiliário
A tentativa do BC chinês de estimular o mercado imobiliário foi considerada insuficiente para resolver a grave crise no setor. O BPoC reduziu os pagamentos iniciais de hipotecas para segundas habitações de 25% para 15%. A medida representa uma reversão da política oficial para conter a especulação imobiliária.
A compra de imóveis nas últimas décadas representou o maior investimento das famílias chinesas. Quando a bolha imobiliária estourou, após a pandemia, o governo dificultou o crédito para a compra de um segundo imóvel das famílias para investimento.
O Barclays estima que a crise imobiliária desde 2021 incinerou cerca de US$ 18 trilhões em riqueza familiar, o equivalente a cerca de US$ 60 mil por família.
Esse detalhe é apenas um aspecto da crise imobiliária, longe de uma solução. São cerca de 4 milhões de apartamentos que ninguém quer comprar – por causa do preço elevado de construção, sem demanda depois que a crise estourou – e outras 10 milhões de unidades, segundo estimativa conservadora, que as incorporadoras já venderam, mas ainda não terminaram de construir.
Julian Evans-Pritchard, chefe de economia da China na Capital Economics em Cingapura, disse ao The Wall Street Journal que as medidas anunciadas foram um passo na direção certa, mas não são realmente suficientes para impulsionar uma reviravolta na economia.
O que está faltando é um apoio fiscal mais agressivo, advertiu. O enfraquecimento da atividade está afetando a receita tributária e os governos locais estão lutando para gastar sua cota de empréstimos em projetos de infraestrutura viáveis.
“O governo central precisa tomar empréstimos e gastar mais para impulsionar o crescimento e a inflação e deve dar aos governos locais mais liberdade para usar suas cotas de empréstimos para apoiar o consumo”, sugeriu Evans-Pritchard.