Os governos dos Estados Unidos e da China precisam tomar medidas urgentes para reduzir a escalada do seu déficit fiscal, uma vez que o aumento no desequilíbrio de suas contas ameaça causar efeitos “profundos” na economia global.

A advertência foi feita pelo Fundo Monetário Internacional (FMI) na quarta-feira, 17 de abril, durante a divulgação do Monitor Fiscal, relatório semestral da instituição sobre finanças públicas dos países. O documento inclui também as projeções fiscais revisadas do Brasil após a mudança das metas anunciada pelo governo na segunda-feira, 15.

O alerta sobre EUA e China ocorre num momento em que a economia global ainda se recupera dos efeitos causados pela pandemia, entre eles o aumento nos custos de financiamentos dos governos para auxiliar a população, agravados com as medidas dos bancos centrais para controlar o pior surto de inflação em décadas.

A instituição reconheceu que muitos países ricos adotaram recentemente medidas que levarão a uma redução das suas dívidas em relação ao tamanho das suas economias, embora não aos níveis observados antes da pandemia da Covid-19.

No entanto, isso não se aplica aos EUA e à China, que continuarão a assistir a um aumento no endividamento se suas atuais políticas permanecerem em vigor.

O FMI espera que a dívida do governo dos EUA seja de 133,9% do Produto Interno Bruto (PIB) em 2029, acima dos 122,1% do PIB registrados em 2023. A previsão para a China é que sua dívida aumente de 83,6% para 110,1% do PIB em 2029.

A título de comparação, o FMI projeta que a dívida pública do Brasil atinja 86,7% do PIB este ano e suba para 90,9% do PIB em 2026, último ano do governo Lula.

Os dados referentes aos EUA ocupam boa parte do relatório e chamam a atenção para o desequilíbrio fiscal da maior economia do planeta, que vem crescendo de forma rápida.

O Fundo criticou as “derrapagens orçamentárias notavelmente elevadas” dos EUA, com o déficit fiscal do país atingindo 8,8% do PIB em 2023, mais do dobro do déficit de 4,1% do PIB registrado no ano anterior. O déficit médio de outras economias avançadas é de 2%.

De acordo com o FMI, o déficit fiscal dos EUA contribui com 0,5 ponto percentual para o núcleo da inflação – uma medida das pressões subjacentes sobre os preços que exclui energia e alimentos.

Isso significa que as taxas de juros dos EUA teriam de permanecer mais elevadas durante mais tempo para trazer a inflação de volta à meta de 2% ao ano estabelecida pelo Federal Reserve, o banco central dos EUA. A inflação de março no país foi de 3,5%.

Neste sentido, o FMI observou que “aumentos grandes e repentinos” nos custos de financiamento dos EUA repercutem em toda a economia global. A estimativa é que o aumento de 1 ponto percentual nas taxas de juros dos EUA leva a uma subida de 90 pontos-base em outras economias avançadas e a um aumento de 1 ponto percentual nos mercados emergentes.

Efeito global

“A política fiscal frouxa dos EUA poderia tornar mais difícil alcançar a última milha da desinflação, ao mesmo tempo que exacerbaria o peso da dívida”, afirmou o Fundo no comunicado, referindo à dívida federal dos EUA, que chegou a US$ 26,2 trilhões no final do ano passado, o equivalente a 97% do PIB.

“Além disso, as repercussões das taxas de juro globais poderão contribuir para condições financeiras mais restritivas, aumentando os riscos noutros lugares”, acrescentou o FMI.

Diferentemente dos EUA, o FMI acredita que a dívida pública do governo chinês tende a ser detida internamente, o que tornaria improvável o mesmo impacto nos mercados globais. A previsão é que o país registre um déficit fiscal de 7,6% em 2025 – mais do dobro da média de 3,7% de outros mercados emergentes.

Mesmo assim, o Fundo argumentou que a dinâmica da dívida chinesa ainda poderia pesar sobre os seus parceiros comerciais.

“Uma desaceleração do crescimento maior do que o esperado na China poderia gerar repercussões negativas para o resto do mundo através de níveis mais baixos de comércio internacional, financiamento externo e investimentos”, analisou o FMI no comunicado.

Cenário brasileiro pior

Com a mudança das metas do déficit fiscal anunciada pela equipe econômica do governo brasileiro no início da semana, o FMI traçou projeção mais negativa do País em relação ao último relatório do Monitor Fiscal, em outubro.

O FMI estima que o Brasil tenha déficit primário de 0,6% do PIB neste ano e de 0,3% em 2025. O relatório anterior apontava déficit primário de 0,2% do PIB em 2024 e superávit de 0,2% no ano seguinte.

Pela nova estimativa do FMI, o Brasil vai atingir o déficit zero apenas em 2026, último ano da gestão Lula. Originalmente, o arcabouço fiscal do governo previa déficit zero já em 2024.

Em relação à dívida pública do Brasil, o Monitor Fiscal prevê aumentos para patamares em relação ao PIB (86,7% do PIB este ano e 90,9% em 2026) que só perdem para nações como Egito e Ucrânia. Até mesmo a Argentina estaria em uma posição um pouco melhor, com uma dívida de 86,2% do PIB neste ano.

“O ajuste foi feito para, à luz do aprendizado de mais de um ano, nós estabelecermos uma trajetória que está completamente em linha com o que se espera no médio prazo de estabilidade da dívida”, disse o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, em Washington, na terça-feira, 16.