Mukesh Ambani, à frente de um império de negócios que inclui energia, telecomunicações e varejo, e Gautam Adani, cuja riqueza foi gerada por negócios de energia, infraestrutura e sistema financeiro, representam uma versão moderna dos marajás da Índia.

Os dois empresários, os mais ricos do país mais populoso e desigual do planeta, abriram a carteira para celebrar o casamento de seus filhos.

A festa da união de Anant Ambani, o filho mais novo do homem mais rico da Ásia (patrimônio de US$ 116 bilhões, segundo a Forbes), com Radhika Merchant, herdeira de uma fortuna avaliada em US$ 84 bilhões, na verdade começou em dezembro, numa cerimônia de noivado para mais de 1 mil convidados.

Prosseguiu em vários eventos, de maio ao começo do mês, na Europa e na Índia, com presença de Mark Zuckerberg e Bill Gates, Ivanka Trump e Jared Kushner, até a cerimônia de casamento em si, em Mumbai, iniciada nesta sexta-feira, 12 de julho, que vai até domingo.

O orçamento de US$ 120 milhões, estimado por especialistas, envolve todas as etapas e os cachês pagos para Rihanna, Backstreet Boys, Pitbull, David Guetta, Justin Bieber, Katy Perry e Andrea Bocelli, que se apresentaram em datas separadas – sem falar dos custos gerais com segurança, comida, bebida, deslocamentos e hospedagem de convidados.

Para os padrões dos bilionários do país, porém, o orçamento da festança é irrisório. As famílias dos noivos têm participação ativa no boom econômico que a Índia vive há uma década, período no qual o país tem crescido em 7% ao ano – o maior índice entre todas as economias do mundo.

Mukesh Ambani, chefe do conglomerado Reliance Industries, representa a face mais empreendedora do crescimento indiano, que ganhou impulso no governo do primeiro-ministro Narendra Modi, que acaba de iniciar o terceiro mandato. A empresa começou a crescer na virada do milênio graças aos seus negócios de petróleo, gás e petroquímica, mas nos últimos anos tem centrado seus investimentos na nova economia, entre eles infraestrutura física e digital, além do varejo.

A forte ligação de Ambani com o líder político indiano abriu portas para contratos da Reliance com o governo em obras de infraestrutura na última década, período o qual o número de aeroportos dobrou e o total de estradas rurais aumentou 85% - o que explica o fato de a fortuna de Ambani ter crescido 50% nos últimos quatro anos.

Tampouco passou despercebida a decisão do governo indiano de atualizar temporariamente, em março, o estatuto do aeroporto, de doméstico para internacional, da cidade de Jamnagar - sede da Reliance, no estado de Gujarat, no oeste do país -, para uma das festividades de pré-casamento, com funcionários, militares e pessoal da Força Aérea destacados a serviço dos Ambanis.

O pai da noiva, Gautam Adani, também tem fortes laços com Modi. Com apoio do governo, expandiu negócios em áreas como aeroportos, portos, usinas de energia e minas de carvão. Na aviação, por exemplo, o grupo controla cerca de 25% do tráfego aéreo do País.

Adani chegou a ter uma fortuna de US$ 137 bilhões. Mas um escândalo financeiro envolvendo a Adani Group, holding fundada pelo empresário, a levou a ser acusada de ter cometido “a maior fraude corporativa da história” no ano passado (em relatório da consultoria Hindemburg Research).

A holding foi acusada de manipular o preço dos seus papéis e de manter companhias de fachada em paraísos fiscais para lavagem de dinheiro. O escândalo levou o bilionário indiano perder mais de US$ 56 bilhões em 2023.

Clube de bilionários

Adani já era um dos empresários mais ricos do país há 20 anos, quando apenas 20 indianos faziam parte do seleto grupo de bilionários – hoje são 200, com uma fortuna somada de US$ 950 bilhões, o que torna a Índia o terceiro país do mundo com mais bilionários, atrás apenas dos Estados Unidos e da China.

Além dos bilionários, a Índia tem ainda cerca de 850 mil milionários, de acordo com a pesquisa do Credit Suisse sobre a riqueza global, um aumento de cinco vezes em comparação com uma década atrás.

Boa parte dessa nova casta de endinheirados é formada por empreendedores de áreas de infraestrutura, serviços digitais e varejo, que estão em expansão.

A vibrante cena de startups da Índia, que agora inclui mais de 100 unicórnios – novos negócios avaliados em mais de US$ 1 bilhão – estimulou a atração de empresas de tecnologia ao país, principalmente depois da retração econômica chinesa pós-pandemia.

Como efeito, esse crescimento recente elevou o valor do mercado de ações da Bolsa de Mumbai para cerca de US$ 5 trilhões, colocando-o lado a lado com o de Hong Kong - o preço médio das ações indianas está inclusive superando as da China.

Apesar dos números superlativos dos bilionários indianos, o país ainda enfrenta grandes problemas sociais, entre eles a desigualdade. Menos de 1.000 empresas representam atualmente cerca de 60% a 70% dos lucros empresariais da Índia.

Hoje, os 1% mais ricos da Índia possuem cerca de 40% da riqueza do país, de acordo com dados do Credit Suisse citados por um relatório da Oxfam de 2023, enquanto mais de 250 milhões de pessoas (21% da população) vivem na pobreza.

Um estudo realizado pelo World Inequality Lab em março concluiu que o fosso entre ricos e pobres da Índia é agora tão grande que, segundo alguns indicadores, havia mais igualdade na Índia sob o domínio colonial britânico do que hoje.

Indústria do luxo

O luxo e gasto perdulário na série de eventos que marcaram o casamento que uniu as famílias Ambani e Adani sequer podem ser considerados uma exceção.

O mercado indiano de casamentos de luxo cresceu tanto nos últimos anos que os indianos ricos gastam agora mais de US$ 75 bilhões anualmente, de acordo com um relatório da WedMeGood, uma organizadora de casamentos indiana.

A festança atual deve bater o recorde de 2018, quando Mukesh Ambani casou a filha mais nova, Isha, a um custo relatado de quase US$ 80 milhões. O casamento foi espalhado por Udaipur, Mumbai e Lago Como, e contou com Beyoncé como atração principal.

O roteiro da reta final da união de Anant e Radhika, este ano, foi desgastante. Em maio, os noivos e convidados partiram em um cruzeiro europeu de quatro dias começando na cidade italiana de Palermo, com shows no convés dos Backstreet Boys, Pitbull e David Guetta.

Um baile de máscaras na mansão Chateau de la Croix des Gardes, na França, naquele mês, contou com a apresentação de Katy Perry, enquanto um evento noturno em Portofino, na Riviera italiana, também em maio, contou com a participação de Andrea Bocelli.

Em julho, uma noite musical tradicionalmente conhecida como sangeet viu Justin Beiber se apresentar no Centro Cultural Nita Mukesh Ambani, um espaço artístico fundado pela mãe do noivo, Nita Ambani.

No início desta semana, houve também uma cerimônia privada de haldi, um ritual de casamento hindu onde amigos e familiares normalmente abençoam um casal aplicando pasta de açafrão nos noivos.

Para as cerimônias deste final de semana em um palácio de vidro feito para a ocasião deverão estar presentes várias autoridades internacionais, políticos, celebridades, bilionários e artistas. Até a arroz de festa Kim Kardashian deve dar o ar da graça, numa festa que tem tudo para servir de roteiro para um musical de Bollywood.