Inflação em alta, atingindo em julho o teto da meta estipulada pelo Banco Central para 2024, com possibilidade da volta de aumento da taxa Selic, além de uma disputa entre governo, Supremo Tribunal Federal (STF) e o Congresso Nacional sobre as emendas parlamentares que ameaçam inviabilizar o Orçamento do governo e, por tabela, o arcabouço fiscal.
Todos esses temas espinhosos foram atenuados ou olimpicamente deixados de lado pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad, ao participar na manhã de terça-feira, 20 de agosto, do Macro Day, evento anual do BTG Pactual.
Apresentado como “herói da economia brasileira” por André Esteves, fundador e chairman do BTG Pactual, e elogiado por Mansueto Almeida, o economista-chefe do banco, que foi o responsável por conduzir o debate com o ministro da Fazenda, Haddad gastou boa parte de sua apresentação citando dados positivos da economia brasileira e esbanjando otimismo quanto à política fiscal do governo - e ao futuro.
Ao citar o crescimento do PIB no primeiro semestre, acima do previsto, por exemplo, o ministro da Fazenda deu um recado indireto ao Banco Central, lembrando que é preciso cuidar dos indicadores nessa situação para evitar “distorções”.
"Numa política monetária mais apertada, errar na calibragem, num momento de turbulência momentânea, pode abortar o processo virtuoso do controle da inflação no lado da oferta, que pode gerar pressão inflacionária na economia”, disse Haddad.
O alerta, segundo ele, é importante porque já é possível detectar a formação bruta de capital no País. “Se a política monetária errar na dose, aborta esse processo de ampliação da capacidade instalada, vai ter problema inflacionário também”, acrescentou.
Haddad assegurou que, em contato com empresários de vários setores da economia, ouviu deles que já estão se preparando para “decolar”. Nesse sentido, disse que não há solução para os problemas da economia brasileira que não passe pelo crescimento econômico.
Ele reclamou da falta de confiança com a condução da política econômica. "Estão subestimando os ganhos de governança e a capacidade do Brasil de crescer de forma sustentável." Nos últimos dez anos, o País cresceu, em média, de 1% do PIB. "Daqui para frente será muito maior, estamos entrando em um novo ciclo. Não há razão para o Brasil não crescer igual ou acima da média mundial, com todo o potencial que a economia brasileira tem.”
Equilíbrio entre Poderes
Parte do otimismo de Haddad se baseia em sua certeza de que o período de turbulência do início do governo Lula está ficando para trás. Ele fez referência à decisão do STF sobre a abrangência de Lei Responsabilidade Fiscal, de que a lei vale para o Executivo e também para o Legislativo – o que significa que qualquer benefício não previsto em orçamento tem de ser compensado -, o que está trazendo maior equilíbrio na relação entre os Poderes.
Haddad usou o exemplo para citar o relatório do senador Jacques Wagner (PT-BA), que por decisão do STF está apresentando uma proposta de fechar as contas de 2024 referente à desoneração da folha de pagamento.
“Vingando essa medida, vamos ter R$ 26 bilhões de compensação pela desoneração para o fechamento das contas desse ano e também para os anos seguintes, pela razão de que a desoneração vai ser gradual”, disse. “O Congresso não se insurgiu contra essa medida, entendeu que o momento é de foco nas contas públicas.”
A polêmica das emendas Pix não foi abordada nem por Mansueto nem por Haddad. O ministro fez questão de elogiar a “maturidade” do Congresso em tomar medidas que facilitam o cumprimento das metas do arcabouço fiscal.
O otimismo de Haddad também foi manifestado em outros temas. Ele citou a aprovação da primeira parte da reforma tributária, sobre consumo (“A mais difícil, em termos operacionais”), afirmando que já apresentou ao presidente Lula cenários de reforma do imposto sobre a renda.
A previsão é de que, com a reforma tributária inteiramente aprovada, o impacto na economia será de 10% a 20% do PIB. "Vamos sair da lista dos dez piores sistemas tributários do planeta para um dos melhores, com tudo digitalizado.”
Haddad citou ainda a recuperação do Rio Grande do Sul, que segundo ele saiu de um discurso derrotista e, em 60 dias, já apresentou aumento de arrecadação real no primeiro semestre de 5%, estancou demissões e ainda teve aumento da produção industrial.
Ajudado por Mansueto, que fez uma provocação com o fato de que a questão fiscal é mais discutida no Brasil do que nos Estados Unidos – que tem uma dívida pública de US$ 34 trilhões, com proporção do PIB de 99% - Haddad não perdeu a chance.
O ministro da Fazenda disse que “há exagero aqui e até desleixo lá” sobre a discussão. “Aqui é o caso contrário: estamos tirando o pé do gasto fiscal, este ano não tem como ser pior do que no ano passado”, assegurou. “Não tem diagnóstico que aponte erro na condução fiscal por parte do governo.”