Os governadores Romeu Zema (Minas Gerais) e Tarcísio de Freitas (São Paulo), ambos de perfil liberal e apontados como pré-candidatos em potencial à Presidência da República, acabaram se envolvendo numa disputa particular para saber quem privatiza primeiro e em maior número estatais de setores-chaves de seus estados.

O processo de privatização é longo nos dois estados, mas, por enquanto, Zema deu um passo além. No fim da tarde desta segunda-feira, 21 de agosto, Zema protocolou uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) estadual na Assembleia Legislativa mineira mudando as regras para permitir, numa tacada, a privatização de duas estatais:  a Copasa, de saneamento, e a Cemig, de energia. A estatal de gás (Gasmig) também foi incluída no pacote.

Com isso, Zema dobrou a aposta nas privatizações e, se fosse uma corrida essa disputa, abriu uma vantagem do governador de São Paulo, que havia saído na frente ao anunciar que pretendia privatizar a Sabesp, empresa mista de saneamento de São Paulo, a maior com controle estatal do País.

Tarcísio já revelou o modelo de privatização da Sabesp – o chamado follow on, por meio de oferta adicional de ações, na qual o estado diminui sua participação (hoje em 50,1% das ações), sem no entanto vendê-la totalmente. Mas atrasou o envio do projeto ao Legislativo.

Zema, por sua vez, já protocolou uma PEC na Assembleia Legislativa de Minas Gerais.  A PEC do governador mineiro remove todos os obstáculos que dificultam a privatização de estatais mineiras: desobriga o governo a fazer referendo referente a desestatizações e reduz de 60% para maioria simples (50% dos votos mais 1) dos deputados o mínimo necessário para aprovação em plenário.

Em comunicado, o governo mineiro informou que enviará as propostas com modelo de privatização para a aprovação da Assembleia “assim que os estudos de viabilidade forem concluídos”. O objetivo é concluir as privatizações antes de 2026, quando termina o mandato do atual governador mineiro.

“Acreditamos que o governo de Minas Gerais só enviaria tal proposta se acreditasse que a chance de aprovação é alta”, afirmou a XP, em relatório assinado por Vladimir Pinto, head de saneamento, e Maíra Maldonado, analista de energia e saneamento.

Repercussão na Bolsa

Os mercados de energia e de saneamento estão acompanhando os movimentos com mais interesse no formato de privatização a ser adotado no processo do que na disputa entre os dois governadores.

Zema, por exemplo, não definiu o modelo de privatização a ser escolhido nas três estatais– se vai vender todas as ações, passando o controle para uma empresa privada; se segue um formato misto, com capitalização seguida de venda secundária; ou se adota o modelo da Sabesp, capitalizando sem deixar de ter uma participação, mesmo que minoritária.

“Dependendo do modelo, diferentes tipos de capital se interessam”, adverte um especialista do setor de energia, que não quis se identificar.

Segundo ele, no caso da Cemig, se o modelo for o de corporação - semelhante ao da privatização da Eletrobras ou o previsto para a Sabesp -, a privatização pode atrair fundos de investimento.

“Mas se o modelo for de controle, com aquisição total do comprador, não vejo apetite das empresas globais de energia por grandes novos investimentos no Brasil”, afirma o especialista.

Um investidor do setor energético, que também preferiu manter anonimato, reforça essa opinião. “No caso da Cemig, a visão do setor elétrico é que a privatização é mera troca de mãos dos donos, sem ter impacto significativo no mercado de energia.”

Curiosamente, a tendência é inversa no setor de saneamento. Em entrevista recente ao NeoFeed, o presidente da Aegea - a maior empresa privada de saneamento do país -, Radamés Casseb, disse que o modelo de privatização anunciado pela Sabesp não interessa, pois “não queremos ser sócios”.

Ou seja, nos processos de privatizações, as empresas de saneamento tendem a brigar para assumir o controle total das estatais em leilão, por conta dos grandes investimentos a longo prazo.

No caso das estatais mineiras, o mercado financeiro reagiu positivamente antes mesmo de os modelos de privatização serem definidos.

Depois do anúncio, as ações da Copasa avançaram 3,58%, enquanto as da Cemig tiveram alta média de 1,45%. Nesta terça-feira, 22 de agosto, o movimento foi semelhante: as ações da Copasa subiram 2,10% e as da Cemig, 1,95%.

Para a XP e também para o Bradesco BBI, a privatização da Copasa e da Gasmig, por exemplo, têm menos objeções do que a da Cemig – a estatal de saneamento tem prazo previsto para privatização para meados de 2024, antes das eleições municipais. Assim, a venda da Copasa  teria menos risco de judicialização.

No caso da Sabesp, só com a tramitação do projeto de lei na Assembleia paulista será possível avaliar o grau de rejeição ou aprovação à privatização.