Índices de preços ao consumidor e ao produtor e expectativas de inflação de curto e longo prazo nos EUA estão no centro do calendário econômico nos próximos dias e podem renovar o temor de que o Federal Reserve (Fed) está demorando demais para cortar o juro e ressuscitar a avaliação de que a maior economia do mundo caminha para o “buraco”.
Ante um mercado de trabalho mais fraco que o esperado, o risco de recessão nos EUA foi gatilho que, turbinado pela alta do juro e a pressão de operações carry-trade no Japão, precipitou a desalavancagem de posições no mercado financeiro global e a intensa deterioração de ativos no início de agosto.
Em 24 horas, a calmaria foi restabelecida, inclusive, com a garantia do BC japonês de que, por ora, o juro não subirá. Mas até quando? A reversão do carry-trade foi desencadeada pelo aumento do juro pelo Banco do Japão, de 0,1% para 0,25%. A taxa nominal mais que dobrou, mas segue na lanterna do ranking de 40 nações elaborado pelo economista Jason Vieira, do MoneYou.
Em média, a taxa nominal vigente nesse elenco fechou julho a 7,29%. Discrepância que atiça especuladores que levaram um tranco, mas sabem que o juro no país asiático segue negativo. Logo, um convite para a tomada de recursos para aplicação em mercados com retorno mais alto – a exemplo do Brasil com juro nominal de 10,50% e real de 7,36%, segundo o MoneYou.
Mas é fato que, por ora, a tensão nos mercados amainou. Até por isso, as atenções se voltam para o seguro território de estatísticas compiladas por institutos de pesquisa. É certo, porém, que a cada anúncio de novos dados paire o receio de que a “assombração” do hard landing nos EUA reapareça.
A inflação ao consumidor norte-americano em julho sai na quarta-feira, 14 de agosto, projeções para inflação em 1 ano, 5 e 10 anos serão divulgadas na sexta, 16. Entre esses eventos, uma bateria de indicadores da China será disparada: juros, empréstimos bancários, investimentos e mercado de trabalho.
As informações das maiores economias do planeta não diminuem, contudo, a relevância da agenda local focada na atividade. E que pode reforçar sinais positivos já capturados pela produção industrial e indicadores da indústria e serviços monitorados por Índices de Gerentes de Compra (PMI, na sigla em inglês) da S&P Global.
O IBGE registrou, em junho, alta mensal da produção industrial de 4,1%, bem acima do esperado; a S&P atestou a elevação, em julho, de indicadores do patamar de 54 pontos para 56 em serviços e de 52 para 54 pontos na indústria. Resultados robustos. Acima de 50, esses marcadores refletem expansão.
Nos próximos dias, IBGE, IBRE/FGV e Banco Central divulgarão pesquisas de Serviços, Varejo, Monitor do PIB e Índice de Atividade Econômica (IBC-Br). Todos de junho e, portanto, fim de semestre.
Selic em alta deve ser dimensionada
Somados ao vigor do mercado de trabalho, os novos dados favorecem a revisão de projeções para o PIB do 2º trimestre e para o ano, embora ajustes já estejam ocorrendo. E para cima. Bancos e consultorias estimam expansão entre 0,50% e 1% para o trimestre e de 2,1% a 2,50% para 2024 fechado.
Étore Sanchez, economista-chefe da Ativa Investimentos, que prevê alta de 0,5% do PIB no 2º trimestre e de 2,1% no ano, alerta que, apesar da surpresa na produção industrial de junho, o setor apresentou inconsistências. “O desempenho de maio e abril teve retração e frustrou expectativas. E é necessário considerar que a Indústria, no cômputo do PIB, é inferior a Serviços, o grande protagonista da leitura da atividade pela ótica da oferta”, diz.
Mas ele reconhece que ainda que a indústria em junho não seja um indicativo tão sólido para grande otimismo, não se deve negligenciar o desempenho da atividade, em especial, a ótima dinâmica do mercado de trabalho.
Alimentando otimismo moderado em relação à atividade, o economista-chefe da Ativa pontua que o congelamento de R$ 15 bilhões no Orçamento do governo terá contribuição negativa para o PIB de 2024, dado que haverá uma injeção menor de dinheiro na economia. Entretanto, afirma, o congelamento denota algum grau de responsabilidade do governo, “ainda que estimemos que o esforço seja insuficiente” para assegurar o cumprimento da meta fiscal.
A economia embalada por trabalho e renda, associada à persistente valorização do dólar ante o real sobretudo por razões externas nos últimos dias, chancelou a preocupação do BC com o alcance da meta de inflação.
Não à toa, o Copom afirmou, na ata divulgada na terça-feira 6 de agosto, que “não hesitará” em subir a Selic caso persistam as tendências recentes nas expectativas e na dinâmica do câmbio – variável central em observação.
Embora o mercado futuro precifique alta da Selic, a mensagem do Copom foi compreendida por economistas que, em análises sobre a ata, avaliam ser improvável um aumento da taxa. Inclusive, dada a chance de o Fed cortar o juro em setembro em 0,50 ponto percentual ou, no mínimo, em 0,25.
Confirmado, esse movimento tende a enfraquecer o dólar lá fora e aqui, freando o peso do câmbio na inflação. Alívio não desprezível. Quanto a um eventual aumento de juro pelo Copom, Sanchez não faz tempestade em copo d’água. E alerta:
“Ainda que [ocorra] e afete alguns canais de transmissão mais rapidamente, o verdadeiro impacto da política monetária se dá com defasagem de até 18 meses. Assim, qualquer decisão do BC neste ano terá impacto relevante apenas nos próximos anos. Se a decisão de elevar o juro for tomada em setembro, estimamos impacto aproximado de 75% em 2025 e 25% em 2026.”