Carlos Ferreirinha estava em Nova York, em 2020, no auge da pandemia de Covid-19. Passando pela rua 44, se deparou com uma Times Square irreconhecível. Aquelas calçadas com suas fortes luzes inspiradoras, como cantam Jay-Z e Alicia Keys na música que é cartão-postal da cidade, estavam tristes, mais escuras e silenciosas.
O consultor para o mercado de luxo estava na cidade à trabalho, e na hora pegou o celular, gravou um vídeo e mandou para sua equipe de jovens geração Z. "Temos que pensar num antídoto para isso. Nem que seja só para a minha empresa, precisamos ditar um novo ritmo para mudar esse jogo", disse por mensagem de texto.
O gosto amargo de assistir um epítome do poder das marcas deserto impulsionou a criação do "PulseImpulse", tema que é inspiração do manifesto da MCF Consultoria, de Ferreirinha, para 2022.
No relatório, apresentado a imprensa e convidados na quinta-feira (27), a consultoria usa uma imagem tecnológica para ilustrar a necessidade de as empresas imprimirem seus próprios ritmos ao negócio, abandonando verdades absolutas: reiniciar nossos sistemas operacionais periodicamente para que não deixem de funcionar.
Mas quando o sistema em questão é a mente humana, o jeito de fazer e pensar de quem está dentro das empresas, não basta comprar gadget novo ou o software do momento.
"Desde 2020, ficou sedimentado que a mudança é uma constante. Estamos na era da não-previsibilidade, e isso demanda outro jeito de pensar, diferente da forma dominante na educação para o mercado, que ainda é pautada na previsibilidade, no desenho de estratégias de 10 anos. Isso não deveria existir mais", diz Ferreirinha.
Tempos de mudanças demandam novas competências profissionais, por exemplo. A própria ideia de fazer reuniões de "planejamento estratégico" cai por terra, na visão do consultor. Se temos mudanças a cada seis meses, qual o sentido de planejar o longo prazo? As estratégias devem ser encurtadas e, mais importante, reconstituídas a todo tempo.
"Claro que o saber acadêmico, técnico, continua importante. Mas precisamos contratar profissionais que saibam quebrar seus modelos mentais e pensar rápido", diz Ferreirinha. São tempos em que saber reagir rápido ao que vier pela frente é mais importante do que saber fazer um plano de longo prazo.
Aposta nas emoções
Para subverter tempos difíceis em que a pandemia nos deixa, uma das apostas da consultoria é o que chama de "enjoyment everywhere". Trazer à tona a alegria e os prazeres, o "savoir vivre" que o mercado de luxo tem tanto a ensinar - setor que é há mais de 20 anos a aposta da consultoria de Ferreirinha como catalisador de novidades para clientes de todas as áreas.
Entre os exemplos do movimento estão marcas que apostam no lúdico e na diversão. Para falar com a criança que existe dentro de garotos e garotas, a Balmain lançou neste mês uma coleção de roupas e acessórios sem gênero em parceria com a Barbie. Movimento parecido foi feito pela fabricante de panelas e utensílios para cozinha Le Creuset, que apresentou no ano passado uma linha de produtos inspirados em Harry Potter.
No território da diversão chegando antes de colocar sacolas nas mãos, está o novo shopping American Dream, em New Jersey, onde o consumo (de luxo) é coadjuvante e as estrelas são o parque temático da Nickelodeon, a pista de ski, a pista de patinação de gelo e o parque aquático da DreamWorks.
Outra aposta da consultoria é a chamada "at home economy", o mercado de produtos e serviços para casa que foi muito impulsionado pela pandemia. Basta uma ida à Leroy Merlin para ver essa tendência in loco. Ferreirinha lembra que hoje famílias inteiras vão passear em lojas de decoração e construção, virou programa de fim de semana e, para ele, trata-se de um movimento irreversível.
"Seja qual for a atividade de uma empresa, é fundamental entrar na casa das pessoas. Qualquer companhia pode criar algum produto ou serviço e surfar nessa onda. Pode ser até peso de papel", brinca Ferreirinha, remetendo à Gucci, que tem de cadeira de jacquard a, de fato, peso de papel. Para as casas que se tornaram ainda mais multifuncionais durante a pandemia, a Dior lançou aparelhos de academia em parceria com a Techno Gym.
Para o consultor, os temas "da moda" não devem ser o foco das empresas em 2022. Empoderamento, diversidade, sustentabilidade, digitalização, todos esses temas, na visão dele, são importantes, mas já deveriam estar no radar das empresas desde antes da pandemia. "Executivos que não conseguirem criar ambientes de trabalho que cuidem das pessoas serão limados. Diversidade e inclusão têm que fazer parte de todas as ações."