A francesa Catherine Petit, atual diretora-geral da Moët Henessy no Brasil, viveu a “fase de ouro” em sua primeira temporada no país, “aquela quando o Cristo estava decolando”, lembra ela ao NeoFeed, em referência a famosa capa da revista Economist de 2009.
Por isso, quando anos depois estava à frente da companhia no mercado africano e Oriente Médio, de 2016 a 2020, e visitava a matriz em Paris “ficava triste” de ver como seus pares olhavam o Brasil com descrédito “porque sempre vi muito potencial no país”.
No ano passado, depois de dois anos de seu “comemorado” retorno a São Paulo para assumir a atual função, ela bateu “o recorde histórico de resultado que havia sido alcançado pela companhia em 2014” e recolocou o Brasil no mapa da Moët Henessy, numa estratégia que fortaleceu a operação de champanhe e espumante.
Esta semana foi para a sede do conglomerado de bebidas de luxo, em Paris, mostrando um crescimento de 33,1% em receita e 14,1% em volume em relação a 2021, para brigar por mais investimentos para o país.
Seu próximo desafio, contudo, é tornar a companhia menos “borbulha-dependente”, uma vez que champanhe e espumantes representam 70% do negócio por aqui. Assim, está reativando marcas adormecidas como a vodca Belvedere e o single malte escocês Glenmorangie.
Ao mesmo tempo, fortalecendo a divisão de vinhos, em especial, com seus rosés Whispering Angels, do Château d'Esclans, e os cru-classé do Chatêau Minuty (que o grupo adquiriu em fevereiro deste ano) “campeões de venda” nos Estados Unidos e Europa.
“Aqui vamos trabalhar para mostrar o rosé como vinho de qualidade porque mesmo o brasileiro consumindo mais e entendendo mais de vinhos, ainda acha que o rosé é vinho menor e barato”, diz Petit.
O Whispering Angel custa hoje R$ 239,90 (wine.com.br) e M Minuty sai por R$ 298 (divinho.com.br). A meta é vender 12 mil garrafas de Whispering, o dobro do ano passado, e começar uma estratégia de expansão com Minuty, que ainda está, por contrato, com a importadora Castas.
“Ao mesmo tempo, queremos fortalecer a importância da procedência de Provence em relação a grandes áreas produtoras e reconhecidas como Bordeaux e Borgonha”, afirma a diretora-geral da Moët Henessy no Brasil. Hoje, vinhos representam 8% do negócio no país. “Se chegarmos a 15% já será um feito.”
Catherine também está encorpando o portfólio com novos rótulos do argentino Terrazas de Los Andes, a volta do neozelandês Claude Bay (que estava ausente por causa de um embargo do governo da Nova Zelândia” ao Brasil) e do espanhol Numanthia.
A estratégia para a retomada
Por causa da crise econômica e instabilidade política, o mercado brasileiro “que tinha uma alocação muito boa de produtos da matriz foi sofrendo uma redução de cota que estava em 50% quando voltei em 2020.”
Para bater em 2022 a meta histórica de 2014 (ano de Copa do Mundo, quando as vendas de champanhe e espumantes “explodiram”) com menos produtos, Catherine teve de fazer o “milagre” das garrafas. Ainda mais num ano em que o próprio CEO da companhia, Philippe Schaus, declarou que “faltaria champanhe”, no contexto celebrativo pós-pandemia.
“Investimos em inteligência de dados, mapeamos os distribuidores que estavam super estocados e liquidando, impactando na imagem das marcas. A distribuição se tornou mais seletiva e reposicionamos os produtos tanto em preço, quando em conceito. Com isso, aumentamos nossas margens”, conta ela.
A retomada contou também com ativações de marketing como os 250 anos de Veuve Clicquot e a vinda de sua plataforma de empreendedorismo feminino, a Bold. Outra estratégia decisiva foi reposicionamento de Chandon, com destaque para sua brasilidade e a criação de uma experiência imersiva, a Casa Chandon, que envolveu cultura e degustação.
A Casa, com venda de ingressos, foi montada em São Paulo, Rio e Recife. “Crescemos 30% no Nordeste ativando a categoria espumantes. Conquistamos novos consumidores, mas também crescemos sobre destilados.”
Mas o bom desempenho e sua experiência com os altos e baixos do país, diz, trouxe uma lição valiosa. “Existe uma correlação direta entre PIB e borbulhas. Se o PIB cresce, as borbulhas crescem. E o inverso também acontece.” Dos 70 % centrados em champanhes e espumantes, “50% vêm da Chandon em Garibaldi e os outros 20% das marcas como Veuve Clicquot, Moët Chandon, Krug, Ruinart, Dom Pérignon”.
O mais recente integrante deste portfólio de borbulhas, por sinal, é o Armand de Brignac, que chegou no fim do ano no Brasil, uma joint venture do grupo com rapper Jay-Z, cuja versão Gold é vendida a R$ 3,3 mil.
No período que ficou fora do país, diz ela, a Moët Henessy “não perdeu a liderança em champanhe com as marcas Veuve Clicquot e Moët Chandon, mas a concorrência ganhou share. Por sermos líderes, ficamos na zona de conforto por muitos anos.”
Mesmo assim, ganhar mercado com vinhos, em especial os refrescantes rosés, é menos difícil que com os destilados do grupo. “Para os rosés, por exemplo, usamos o mesmo caminho dos champanhes e espumantes, que têm portas abertas por serem marcas consagradas”, explica a executiva.
“Com Belvedere e Glenmorangie temos de disputar os bares que já são fechados com grupos como Pernod Ricard e Diageo.” Com Glenmorangie (R$ 635, Santa Luzia), que também passou por uma reformulação de rótulo, a estratégia é posicioná-lo com valor "10% a menos que o Macallan". Já com Belvedere, o plano é ampliar sua presença em casas noturnas.
Entre idas e vindas ao Brasil, dos 17 anos que Catherine passou aqui, doze foram na companhia. Hoje ela, com uma equipe “enxutíssima, mas animada”, acumula a direção operacional e de marketing, além de cuidar da Chandon, em Garibaldi, com especial atenção a questão da sustentabilidade nos vinhedos e a implantação de um novo projeto de enoturismo.
Mas está “cheia de gás” e feliz de estar no Brasil (seu filho é brasileiro). Mesmo sabendo que o Cristo ora decola, ora não.