Antes imune, agora, nem o Ártico escapa. Em um processo de agravamento mútuo, por causa das mudanças climáticas, os incêndios florestais estão mais comuns e mais intensos. Até 2030, os focos de fogo extremo devem aumentar 14%, nas estatísticas da Organização das Nações Unidas (ONU). Vinte anos depois, em 30% e, até o final do século, em 50%.
A chave para o controle do fogaréu está no planejamento, prevenção e resposta precoce, ao primeiro sinal de uma fagulha. Mas os sistemas disponíveis atualmente detectam um incêndio quando, em geral, o fogo já fugiu ao controle – e os prejuízos humanos, ambientais e econômicos já estão postos.
A climatech americana Pano AI desenvolveu uma tecnologia de combinação de hardware avançado, inteligência artificial (IA) e software em nuvem para dar às equipes de contenção de incêndios mais tempo e precisão geográfica.
Fundada em 2020, em São Francisco, na Califórnia, pela física Sonia Kastner, a empresa criou as plataformas Pano Stations. Colocadas em pontos elevados de observação, câmeras 360 graus, de altíssima definição, equipadas com IA de aprendizado profundo e visão computacional, detectam, verificam e classificam, em tempo real, a ocorrência.
Os equipamentos da Pano são capazes de vigiar áreas em um raio de 25 quilômetros. E, uma vez detectada a ocorrência, a partir de alertas integrados e notificações móveis, os bombeiros e socorristas dispõem de informações atualizadas sobre a localização e movimento do incêndio.
“Com nosso algoritmo, triangulamos e calculamos a latitude e a longitude, o que é realmente crítico no combate ao fogo”, diz a fundadora e CEO da startup à TechCrunch.
Ao custo de US$ 50 mil, as estações podem ser operadas por técnicos ou entrar em modo varredura, com uma rotação completa, a cada minuto. Os alarmes da Pano acontecem, em média, 15 minutos antes dos que são emitidos pelos sistemas tradicionais de alerta. Pode parecer pouco, mas esse tempo é decisivo para evitar a disseminação do incêndio.
A tecnologia de confirmação da emergência evita os falsos sinais de fogo – e com isso a mobilização desnecessária de equipes, equipamentos, carros e caminhões. Nos Estados Unidos, afirma Sonia, apenas 5% dos chamados são incêndios de fato.
Até agora, a Pano já instalou 100 unidades de suas estações de monitoramento, o que cobre uma área de quase 25 mil quilômetros quadrados de terras americanas e australianas. Sonia está em negociações para levar as Pano Stations para a Europa. Em 2022, detectou cerca de 1 mil focos de incêndio, evitando que o fogo se transformasse em catástrofe.
Um aporte contra o fogo
A empresa anunciou na terça-feira, 11 de julho, o aporte de US$ 17 milhões. A rodada foi liderada pela Valor Equity Partners, com participação dos investidores existentes Initialized Capital, Congruent Ventures, Convective Capital, January Ventures e os capitalistas de risco Kevin Mahaffey, da Lookout, e Jade Van Doren, da AllTrails.
Entre os novos financiadores estão a Salesforce Ventures, T-Mobile Ventures e o 5G Open Innovation Lab. Com este cheque, o total de recebido pela Pano sobre para US$ 37 milhões.
Tecnologias como a desenvolvida por Sonia tornam-se prementes em tempos de aquecimento global. Em 2022, a temperatura aumentou 1,15º centígrados em comparação à era pré-industrial. No relatório “Spreading like Wildfire: The Rising Threat of Extraordinary Landscape”, elaborado pelo Programa da ONU para o Meio Ambiente (Pnuma), em parceria com a plataforma de dados ambientais Grid Arendal, os especialistas propõem uma “nova fórmula de prontidão para o fogo”.
Eles pedem que os governos destinem dois terços dos gastos no combate a incêndios para o planejamento, prevenção, preparação e recuperação. “Comumente, mais da metade dos orçamentos são para resposta, enquanto o planejamento normalmente recebe apenas 0,2%”, lê-se no documento.
O ônus econômico com o fogo florestal só nos Estados Unidos é da ordem de US$ 71,1 bilhões a US$ 347,8 bilhões, por ano, calculam os analistas da ONU. Isso sem contar o impacto humanos e a perda de biodiversidade.
A saúde das pessoas é diretamente afetada pela inalação da fumaça, os gastos com a reconstrução de áreas atingidas podem ultrapassar os recursos financeiros dos países de baixa renda, bacias hidrográficas são degradadas, a erosão do solo aumenta e os resíduos deixados para trás estão, muitas vezes, contaminados.
Em 2022, os incêndios florestais destruíram no Brasil – o equivalente em tamanho ao estado do Acre. A área representa um aumento de 14%, em relação ao ano anterior, informa o MapBiomas. O fogo se concentrou nos biomas da Amazônia e do Cerrado.
“Precisamos minimizar os riscos de incêndios extremos estando mais bem preparados: investir mais na redução de riscos, trabalhar com comunidades locais e fortalecer o compromisso global pelo enfrentamento da mudança climática”, afirma Inger Andersen, diretora executiva do Pnuma, na apresentação do trabalho. Nessa luta de redução de danos, a tecnologia pode ser uma grande aliada.