Em um momento onde todos propõem diferentes soluções para enfrentar a crise da Covid-19, encontrar uma vacina para o vírus é, de fato o único ponto de convergência, mesmo que, a princípio, mais distante.
Essa espera, no entanto, pode ser abreviada. Com sede em Cambridge, Massachussets, o laboratório de biotecnologia Moderna revelou nesta segunda-feira, 18 de maio, que obteve resultados positivos nos testes iniciais para o desenvolvimento de uma vacina para o coronavírus.
Os estudos contaram com a participação de 45 voluntários, na faixa etária de 18 a 55 anos, e envolvem a administração de três doses, equivalentes a duas aplicações da vacina, com 25 microgramas, 100 microgramas e 250 microgramas.
Segundo a empresa, os estudos da fase 1 da vacina em questão, realizados em seres humanos, produziram respostas imunes para prevenir a infecção. No processo, pessoas que receberam diferentes níveis de dose da vacina foram soroconvertidas em um prazo de 15 dias após receberem uma dose única, o que significa que produziram anticorpos.
A companhia também trouxe dados sobre os efeitos da segunda dose aplicada em dois grupos, duas semanas depois da primeira administração. Entre aqueles que receberam a menor quantidade da vacina, os níveis de anticorpos criados foram equivalentes ao observados em pacientes que se recuperaram da Covid-19.
Já entre aqueles que tiveram acesso a uma dose média, a produção de anticorpos foi bem superior aos níveis observados em pacientes recuperados. “Nossa equipe segue se concentrando em avançar o mais rápido possível para iniciar, em julho, a fase 3 do estudo”, disse Stephane Bancel, CEO da Moderna, em comunicado.
Segundo o executivo, se os testes nessa etapa forem bem-sucedidos, a empresa irá apresentar um pedido de licença da vacina. “Estamos investindo na ampliação da fabricação, a fim de maximizar o número de doses que podemos produzir para ajudar a proteger o maior número possível de pessoas.”
Parte das pesquisas conduzidas pela Moderna está sendo financiada pela Coalizão de Inovações em Preparação para Epidemias (CEPI), entidade criada pela Bill & Melinda Gates Foundation para apoiar o desenvolvimento de vacinas e tratamentos contra surtos desse porte. O trabalho também conta com uma estreita colaboração, desde janeiro, com o Instituto Nacional de Saúde dos Estados Unidos (NIH, na sigla em inglês).
Com o anúncio, as ações da Moderna subiram 26% no pre-market da Nasdaq
A partir do anúncio, as ações da Moderna subiram 26% no pre-market da Nasdaq. Com a abertura do mercado, os papéis do laboratório americano operavam em alta superior a 23% por volta das 11h30 (horário de Brasília). A companhia tem um valor de mercado de US$ 30,5 bilhões.
A divulgação da empresa também ajudou a dar sinais de recuperação no mercado de capitais dos Estados Unidos nesta segunda-feira. O Nasdaq Composite Index avançou 2%, enquanto o S&P 500 subiu 2,7% e o Dow Jones Industrial Average subiu 753 pontos, ou 3,2%, no início das negociações em Nova York.
Na semana passada as ações no mercado americano registraram a pior queda percentual semanal em quase dois meses, de 2,3%, diante de diversos indicadores de retração econômica no país.
Corrida
O desenvolvimento de uma vacina contra a Covid-19 está movimentando o trabalho e os investimentos de dezenas de empresas, universidades e países. As americanas Johnson & Johnson e Gilead Sciences, a chinesa CanSino Biologics e a japonesa Fujifilm Toyama Chemical são alguns dos nomes que estão nessa corrida.
Um desses projetos, a parceria firmada entre a Universidade de Oxford e a farmacêutica britânica AstraZeneca, também anunciou, na semana passada, que começa a avançar nos testes realizados com seres humanos.
Em artigo publicado na plataforma bioRxiv, ainda não revisado por outros colegas, os cientistas envolvidos na parceria informaram que, após testes realizados em macacos, foram realizadas administrações da droga em desenvolvimento em mais de mil voluntários, entre 23 de abril e 13 de maio.
Normalmente, uma vacina leva de dois a cinco anos para chegar ao mercado. Esse processo tradicional passa, geralmente, pela produção e a aplicação de uma proteína do microrganismo, baseada em uma versão atenuada ou inativa do vírus em questão.
Diante do desafio de correr contra o tempo, algumas dessas companhias estão apostando em outros métodos. É o caso da Moderna, adepta da tecnologia mRNA, de validade ainda não comprovada, que consiste na injeção de proteínas artificiais e sintéticas, com as características do vírus, para estimular a produção de anticorpos.
A busca por métodos mais rápidos e que permitam agilizar a produção em escala tem sido a prioridade entre países como os Estados Unidos. Na contramão, a China é uma das nações que têm apostado nos processos mais tradicionais.
O governo de Donald Trump investiu em uma operação batizada de “Warp Speed”, cuja meta é dar o acesso a 100 milhões de doses até o fim do ano à população americana
Nesse contexto, o governo de Donald Trump investiu em uma operação batizada de “Warp Speed”, cuja meta é dar o acesso a 100 milhões de doses até o fim do ano à população americana, segundo reportagem da agência Bloomberg, que trouxe à tona o plano. A estratégia passa pelo financiamento de testes e pesquisas para projetos mais promissores em todo o mundo.
Essa abordagem traduz a perspectiva de uma verdadeira guerra entre os países pelo direito de ter acesso às vacinas em primeira mão. E já está causando alguns atritos. Na semana passada, Paul Hudson, CEO da farmacêutica francesa Sanofi, afirmou à Bloomberg que os Estados Unidos seriam os primeiros na fila a partir do momento em que a companhia desenvolvesse sua vacina contra o coronavírus.
“O governo dos Estados Unidos tem direito à maior pré-encomenda, porque investiu e assumiu o risco”, disse o executivo. “É assim que será, pois eles investiram para tentar proteger sua população e reiniciar sua economia”, acrescentou Hudson, na reportagem publicada na quarta-feira 13 de maio.
Em fevereiro, os Estados Unidos ampliaram a parceria que mantinha com a Sanofi para a produção de vacinas. O apoio veio por meio de um aporte de US$ 30 milhões, realizado pelo Biomedical Advanced Research and Development Authority (Barda), órgão do Ministério da Saúde do país, que também destinou recursos para companhias como a Johnson & Johnson e a própria Moderna.
A declaração de Hudson, publicada no dia 13 maio, gerou polêmica e foi recebida com irritação pelo governo francês. No dia seguinte, Serge Weinberg, presidente do Conselho de Administração da Sanofi procurou esfriar os ânimos e destacou que os Estados Unidos não terão prioridade nesse processo. "Estamos organizando várias unidades de fabricação. Algumas delas estão nos Estados Unidos, mas ainda mais na Europa e na França", disse o executivo.
Atualmente, a Sanofi tem duas vacinas contra a Covid-19 em andamento. Além daquela que está sendo financiada, em parte, pelos Estados Unidos, o segundo projeto é uma parceria com a britânica GlaxoSmithKline (GSK). Nessa última frente, o plano é iniciar os testes em seres humanos no segundo semestre e apresentar uma vacina ao mercado até o segundo semestre de 2021.
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