Em fevereiro deste ano, a CVC Corp anunciou a chegada ao Brasil de sua empresa de aluguéis de casas, a Vacation Homes Collection (VHC), que até então atuava apenas em Orlando e Miami, nos Estados Unidos. Mesmo com a chegada da Covid-19 e a paralisação do turismo, a empresa continuou preparando o terreno.
Os executivos da companhia foram mapeando cidades, fazendo contatos com proprietários e estruturando uma rede de fornecedores em cada local definido. Em setembro, a empresa fechou um contrato para alugar 40 apartamentos em Gramado (RS). Mas agora se prepara para invadir o mercado nacional.
Até o fim do ano, a VHC passará a atuar em Canela (RS), Bombinhas (SC), Península de Maraú e Praia do Forte (BA) e o litoral norte de São Paulo a partir da Riviera de São Lourenço. “Este é um mercado crescente, com potencial tanto para clientes como para proprietários de segundas residências. Vamos buscar uma posição de liderança”, diz Leonel Andrade, CEO da CVC Corp, ao NeoFeed.
“Queremos alcançar 1 mil propriedades no País até o fim do ano que vem”, diz Fabio Cardoso, sócio-fundador e diretor-geral da VHC. O plano da empresa é ir ganhando espaço em regiões em que não há estrutura hoteleira ou em lugares em que as casas funcionem como complemento.
“Estamos de olho também nas cidades serranas do Rio de Janeiro e Minas Gerais, no litoral fluminense e em cidades como Trancoso e Itacaré, na Bahia”, diz Sylvio Ferraz, diretor-executivo de Sourcing da CVC Corp.
A expansão para cada cidade depende de uma série de fatores. Em cada local escolhido, a VHC precisa ter, no mínimo, três funcionários para coordenar uma série de fornecedores que atendem as residências. São equipes que vão desde pessoal de limpeza, a chefs de cozinha, passando por empresas de manutenção.
Os executivos explicam que o modelo de negócios da VHC é o de gestão de residências. “Muita gente diz que a gente compete com o Airbnb, mas, na verdade, somos parceiros. Também vedemos por lá, como vendemos na Booking.com”, diz Cardoso. Apesar do discurso, invariavelmente concorre também com o Airbnb.
Cada casa é alugada por diárias que variam de acordo com o lugar e o tamanho. Nos EUA, onde a companhia conta com 450 residências entre Orlando e Miami, as diárias variam de US$ 65 por um apartamento de um dormitório em Miami, US$ 150 por uma casa com quatro suítes e piscina ou US$ 880 por uma mansão com 15 suítes em Orlando.
A VHC faz toda a administração e fica com 20% do total. No ano passado, movimentou cerca de US$ 15 milhões. Mas, no pacote, o cliente pode escolher se vai contratar um chef de cozinha, se vai querer a decoração de Natal, encontrar a geladeira e a despensa cheias de mantimentos, serviço diário de limpeza, entre outros. Cada serviço adicional é cobrado à parte.
“Fazemos um mix de zeladoria, cuidando do imóvel, com hotelaria, proporcionando amenities”, diz Cardoso. Além das 1,2 mil lojas da CVC, as casas da VHC são distribuídas em outras operadoras espalhadas ao redor do mundo. “Sessenta por cento dos nossos clientes são brasileiros e os outros 40% são estrangeiros. Temos, por exemplo, muitos chineses”, diz ele.
No ano passado, a companhia movimentou o equivalente a 46 mil diárias. Por perceber que esse modelo pode ser replicado em várias partes do mundo, a VHC já desenha uma expansão internacional para outros destinos muito procurados. “Na nossa lista estão planos de entrar em Portugal, na Argentina, no Uruguai, no Caribe, na Califórnia e em Nova York”, diz Ferraz.
E, além de contratos com proprietários, muitas incorporadoras têm buscado a empresa. São prédios inteiros alugados e geridos pela companhia. Em Miami, por exemplo, ela administra 12 unidades em uma única torre e negocia para assumir um imóvel com 60 apartamentos que está em construção. Em Santa Catarina, está negociando com uma incorporadora.
Um dos trunfos da empresa, diz Cardoso, é a sua plataforma de precificação. Os valores variam de acordo com a temporada e com média de cada região. “Comparamos com os preços de todas as plataformas”, diz. A tecnologia é, aliás, um dos pontos ressaltados por ele.
Em cada residência, há uma fechadura eletrônica e para abrir é preciso receber via SMS um código gerado pela VHC. A empresa, inclusive, sabe o momento em que a pessoa entrou na casa. Ao pisar na residência, o hóspede recebe outra mensagem de boas-vindas.
O fechamento dos aeroportos americanos para brasileiros foi um baque para a companhia, que se viu obrigada a fortalecer as vendas para latinos, a partir de sua operação no México. Por outro lado, isso estimulou o turismo local.
Com medo de aglomerações e com hotéis fechados, as casas se tornaram opções para quem nunca tinha pensado nisso. “Muitos hotéis estão seguindo os protocolos, mas o turista ainda fica inseguro”, diz Marta Poggi, sócia da consultoria Strategia Turismo.
Ela ressalta que a pandemia mudou o perfil dos viajantes, o que está favorecendo o modelo de locação. “As pessoas querem viajar, mas com segurança. Há uma tendência grande de se isolar”, afirma. “E esse turista sabe que, em uma casa, não terão que lidar com outras pessoas fora do seu núcleo familiar ou de amigos.”
A expansão para várias cidades brasileiras visa pegar carona nesse fenômeno. Mas a VHC não é a única empresa a explorar esse tipo de negócio.
Mercado disputado
Nos Estados Unidos, a Vacasa, que tem investidores como Silver Lake e Riverwood Capital, já levantou US$ 634,5 milhões em aportes. O mais recente foi em junho, quando recebeu US$ 108 milhões. O capital tem sido usado para comprar concorrentes e aumentar a operação hoje com mais de 25 mil residências administradas.
Outra companhia que atua nesse segmento é a Sonder, fundada em 2012 na Califórnia. Desde então, a empresa recebeu investimentos de US$ 529,6 milhões de fundos como Inovia Capital, Spark Capital, Valor Equity Partners, entre outros.
Gigantes da hotelaria também têm os seus braços de aluguel de residências. O grupo Accor, por exemplo, conta com esse serviço sob a marca Onefinestay. “Compramos três empresas: Travel Keys, nos Estados Unidos; Squarebreak, na França; e Onefinestay, na Inglaterra. Elas atuam em aluguel de casas e apartamentos, mas no segmento de luxo”, disse Patrick Mendes, Chief Commercial Officer (CCO) global da Accor, em entrevista ao NeoFeed no ano passado.
“Hoje, você pode ir na plataforma da Accor e achar apartamentos e casas nos Estados Unidos e na Europa. A ideia é levar isso para a América do Sul, África e Oriente Médio, Ásia e Pacífico. A nossa plataforma faz a intermediação entre o proprietário que tem uma casa de luxo e o cliente de um segmento bem alto”, disse Mendes.
Ou seja, é uma tendência mundial que ganhou mais espaço com a popularização do Airbnb, plataforma criada em 2008. Fabio Cardoso, um engenheiro formado na Mauá, montou a VHC em 2015, depois de ter trabalhado com um amigo em uma imobiliária em Orlando. O amigo vendia as casas para brasileiros e precisava de alguém que ajudasse os proprietários a administrar as residências.
Cardoso percebeu que aí existia um negócio a ser explorado e criou sua própria empresa. Em 2016, Luis Paulo Luppa, presidente da operadora Trend, conheceu Cardoso e comprou uma participação no negócio. No ano seguinte, a Trend foi vendida para a CVC Corp por R$ 258 milhões e o grupo acabou incorporando a VHC. Hoje, 70% está nas mãos da CVC e o restante com Cardoso.
Para a CVC, num momento em que os países europeus anunciam novos lockdowns, que as viagens internacionais ficam cada vez mais distantes, ter outra opção de turismo local é um fator estratégico. Ainda mais diante das perspectivas.
Dados da Phocuswright, empresa de pesquisas sobre a indústria do turismo, mostram que a categoria de aluguel de casas é a segunda maior no mercado de hospitalidade. No ano passado, movimentou US$ 170 bilhões. E a CVC quer um naco desse bolo com a sua VHC.
No segundo trimestre deste ano, a CVC apresentou um prejuízo de R$ 252,1 milhões. Seu caixa, antes de R$ 1,5 bilhão, está em R$ 1,1 bilhão. A empresa espera fechar o ano com um volume de vendas de 60% do apresentado em 2019.
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